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Acórdão
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1. Trata-se de Apelação Cível interposta por Luciano Alves Bittencourt, da sentença[1] (mov. 447.1) que, nos autos da ação de indenização por danos morais, materiais e estéticos c/c pensão decorrentes de acidente de trânsito promovida em face de José da Silva Arceno e Sandra Regina Froelich, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar os Réus ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 20.000,00, e extinta a reconvenção, sem resolução do mérito, ante o reconhecimento da ilegitimidade passiva do denunciado/reconvindo Júlio Cesar Costa.Ao final, ante a sucumbência recíproca na ação principal, condenou o Autor ao pagamento de 60% das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 13% sobre o valor atualizado da condenação, ficando o restante de responsabilidade dos réus José da Silva Arceno e Sandra Regina Froelich.Ainda, condenou os Réus/reconvintes ao pagamento das despesas da reconvenção e dos honorários advocatícios em favor do patrono do reconvindo Júlio Cesar Costa, estabelecidos em 12% sobre o valor atualizado da reconvenção.Em suas razões recursais (mov. 452.1), o Autor alega que os danos materiais devem ser julgados procedentes, “tendo em vista que o recorrente apresenta grande dificuldade física até a presente data para realizar atividades, devendo ser observado que fazia entregas de motocicleta, e hoje não pode mais exercer esta função, restando para este lesões que não lhe permitem trabalhar e prover sua renda devida as sequelas decorrentes do acidente de trânsito”.Defende que o dano estético é evidente “pelas fotos trazidas aos autos nos eventos 1.09, 1.10 e 288.1 (abaixo colacionados), é possível verificar a gravidade e extensão da lesão provocada pela imprudência do recorrido, bem como as alterações morfológicas sofridas”, ressaltando “a irreparabilidade do prejuízo causado e a permanência da lesão, os quais restam comprovados pelo Laudo médico acostado ao evento 152.2 - o qual declara que apelante apresenta lesão permanente no joelho esquerdo, com encurtamento do membro – e pelo Laudo de exame de sanidade física, de evento 248.2 - em que foi constatada a perda funcional de 70% do membro inferior esquerdo. Tal prejuízo ainda poderá ser comprovado com a realização da perícia para quantificação de redução de capacidade laborativa indeferida em ev. 125.1” e “apenas para reforçar o pedido de condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos estéticos, não se tratando de documento novo, e sim para que Vossas Excelências vejam a atual condição física do autor, pede-se vênia para acostar foto recente, datada de 13/09/2022, que revela a situação da perna do recorrente”.Sustenta que “sofreu fratura exposta grave em virtude do acidente de trânsito causado pelo apelado, passou aproximadamente 90 dias internado, precisou passar por intervenções médico-cirúrgicas, enxertis, contraiu bactérias multirresistentes e precisou utilizar fixadores externos”, além disso “dada a gravidade do quadro clinico, os médicos chegaram a considerar a amputação do membro inferior esquerdo, o que inclusive foi discutido com a família, conforme prontuário médico anexado junto à exordial”, pedindo a majoração do quantum indenizatório a título de danos morais.Assevera que à época do acidente trabalhava “como autônomo fazendo entregas com a motocicleta envolvida no acidente, e com isso auferia a média de R$ 2.000,00 por mês. Ocorre que obviamente não há documentos que comprovem tal renda, eis que se trata de prestação de serviços” e a dificuldade de comprovar a renda mensal não afasta o seu direito aos lucros cessantes, argumentando que “fazia entregas para várias pessoas diferentes diariamente e recebia os valores nestas entregas não havendo qualquer documento que comprove a renda exatamente pela própria atividade que desempenhava”, e nem seria possível a prova oral para tal comprovação, pois “não poderia chamar uma ou outra pessoa que tenha eventualmente feito entrega porque com certeza tal pessoa sequer lembraria quem foi que efetuou a entrega”. Quanto à pensão vitalícia, reitera que o laudo de mov. 152.1 demonstra a lesão permanente no joelho esquerdo, com perda funcional de 70% do membro inferior esquerdo, sendo “latente a redução/diminuição da capacidade laborativa do recorrente, albergado na condição social do mesmo, bem como na atividade desenvolvida anteriormente ao acidente por este, sendo devido o pensionamento, motivo pelo qual pugna-se a realização da prova pericial indeferida em ev. 125.1, a qual comprovará a redução da capacidade laborativa e o direito ao pensionamento, a qual nos termos da decisão mencionada, será determinada em fase de liquidação de sentença”.Apresentadas as contrarrazões pelos Réus (mov. 459.1), os autos foram remetidos a este Tribunal.
2. Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso comporta conhecimento, conforme exame a seguir. Responsabilidade pelo acidenteInicialmente, verifica-se que restam incontroversas as questões acerca da reconvenção e da responsabilidade dos Réus pelo acidente de trânsito, uma vez que as irresignações recursais pela parte autora versam exclusivamente sobre os pedidos iniciais de danos materiais, estéticos e morais, além da pensão vitalícia e dos lucros cessantes, daí a análise desses temas, após a seguinte retrospectiva fática-processual. Síntese fática-processualExtrai-se da petição inicial da presente ação indenizatória (mov. 1.1), proposta em 24/09/2015, e das posteriores emendas à inicial (mov. 5.1 e 11.1) a narrativa de que o Autor no dia 12/02/2015, aproximadamente às 11h10, estava conduzindo sua motocicleta Yamaha/factor 2008, placa AQM-2445, quando foi abalroado na lateral, entre os cruzamentos das avenidas Gramado e Theodoro Risden, na cidade de Foz do Iguaçu, pelo veículo GVW/Gol 1000l, 1996, placas AEB-0096, conduzido pelo Réu José e de propriedade da Ré Sandra, causando-lhe fraturas e diversas lesões afora os prejuízos materiais, ficando internado por aproximadamente três meses. Em relação aos danos materiais, o Autor enunciou que “laborava como trabalhador autônomo, fazendo de entrega de mercadorias, auferindo a média de R$ 2.000,00 (dois mil reais) mensais” e “devido ao acidente, o Autor foi obrigado a interromper o trabalho, não conseguindo mais retornar à sua atividade laborativa, visto que ainda utiliza muletas, e as utilizará por muito tempo ainda, devido à limitação física causada pela colisão, devendo ser indenizado por lucros cessantes também no período posterior, o que deverá ser apurado em liquidação”, bem como “o acidente provocado pelo Réu causou uma série de despesas com remédios, curativos, transporte e alimentação dos familiares para ficarem com este durante o período de internação, visto que se revezam diariamente nos cuidados com o autor”. Ainda, além dos “danos materiais com medicamentos, curativos, equipamentos médicos para mobilidade, como as muletas que utiliza, houve o prejuízo com a motocicleta envolvida no acidente, cujo prejuízo para o autor, pelo fato de ter que devolvê-la foi de R$ 2.000,00 (dois mil) reais”. Ademais, “durante o tempo de internação, o tempo todo o autor deveria estar acompanhado de algum familiar, pois foram diversas as vezes em que a equipe medica esteve para amputar a perna do autor. Assim, a família foi obrigada a mobilizar-se, e ficar com o autor no hospital, e para que isso fosse possível, houve despesa média diária de R$ 100,00 (cem reais) com combustível e alimentação, pelo período de 12/02/2015 até 05/05/2015, totalizando 82 dias de internação”.Quanto aos danos morais, alegou que “atualmente o autor se vê sem perspectivas, embora tenha tido alta hospitalar, sua situação é precária, passando por necessidades, tudo em função da atitude do réu”, além disso “durante o internamento hospitalar realizou cirurgia de emergência em face da gravíssima fratura exposta que teve com a colisão, o que lhe infligiu imensa dor até a fase de pré-cura, além de posteriormente à outra cirurgia precisou colocar fixador transarticular externo em sua perna. ... sem mencionar, por fim, as inúmeras noites que permaneceu acordado em razão da dor que sentia e do mal estar físico, além da preocupação com sua família que passaria necessidades sem que este pudesse trabalhar e sem que os seus próprios familiares pudessem manter suas vidas rotineira com normalidade. E de se frisar que a perna do autor esteve por várias vezes para ser amputada, apenas não sendo porque os médicos insistiam na recuperação, que ainda não aconteceu”.No tocante aos danos estéticos, afirmou que “é patente no caso do Autor, tendo em vista as cicatrizes decorrentes das fraturas expostas, platinas expostas, os problemas ortopédicos originados com o acidente, além do comprometimento do caminhar latente, ante a necessidade de cirurgia para colocação de ferros e pinos, que inclusive perfuram a pele e saem para fora da perna”, tendo “abdicado de todo e qualquer lazer, a uma, pois sua mobilidade está dificultosa, e a duas, pois as cicatrizes e marcas deixadas constrangem de forma significativa o Autor, privando-se de jogar futebol, tomar banho de piscina, enfim qualquer coisa que diga respeito as atividades antes efetuadas. O Autor não possui mais o estado natural de liberdade nato às pessoas, enclausurando-se em si mesmo, a deformidade que resultou o ato ilícito praticado pelo Réu, modificou sensivelmente sua maneira de convivência social, passando a usufruí-la de forma restrita”.Por fim, sustentou ser “incontestável que o autor teve sua capacidade laborativa afetada, que implicou na redução dos proventos mensais. A vítima deixou, portanto, de auferir a renda mensal que antes recebia”, de modo que “os lucros cessantes devem ser indenizados até que o ofendido obtenha capacidade de retornar normalmente ao trabalho” e, ainda, “indubitavelmente o autor merece ter deferida uma pensão mensal, provisória ou vitalícia, que dependerá de como será sua recuperação do autor, o que não se pode precisar por hora”.Então, pugnou pela procedência da ação para que os Réus sejam condenados, solidariamente ou subsidiariamente, ao pagamento de indenização por: (i) danos morais no valor de R$ 85.000,00; (ii) danos estéticos no valor de R$ 15.000,00; (iii) danos materiais respeitantes à devolução da motocicleta, bem como despesas com combustível e alimentação à família no montante total de R$ 10.200,00; (iv) lucros cessantes na quantia de R$ 18.000,00; (v) pensão mensal vitalícia “correspondente a 100% da renda auferida pelo autor na data do acidente, ou em outra porcentagem de redução da capacidade laborativa, que deverá ser apurada em perícia e resposta aos quesitos”.A petição inicial foi instruída com boletim de ocorrência, certidão de ocorrência, fotos, tomografia, prontuário, documentos da solicitação de amputação, documentos de nova internação, alta hospitalar, histórico de propriedade do veículo.A decisão de mov. 13.1 concedeu a assistência judiciária gratuita ao Autor e, no mov. 24.2, foi juntada nova declaração de internação.Ao contestar (mov. 26.1, 35.1 e 38.1), os Réus, preliminarmente, arguiram a ilegitimidade passiva da Sandra Regina Froelich e a inépcia da petição inicial, bem como impugnaram o valor da causa. No mérito, defenderam que: a) “o autor além de genérico se confunde em seus argumentos, ora afirma que as despesas de R$ 100,00 são para remédios, curativos, transporte e alimentação dos familiares, ora afirma que o valor de R$ 100,00 fora gasto com combustível e alimentação” e “o autor não trouxe qualquer documento que ateste comprovação destas despesas”, na medida em que “apenas se observa que o autor teve todo o tratamento médico através do SISTEMA – SUS, não há receitas, declarações ou notas fiscais médicas ou de estabelecimento médico hospitalar que demonstram que enquanto o autor esteve internado ou após alta médica esteja se obrigando a comprar os medicamentos”; b) também não há qualquer prova sobre o valor que alega ter despendido com a devolução da moto para antigo proprietário; c) quanto aos danos estéticos, “o autor não fala se a perna amputada teria sido a perna das cicatrizes, pois se a mesma foi amputada, não há mais cicatrizes” e “acaso a amputação seja confirmada e realizada, tal pedido perderá seu objeto”, não havendo “nos autos qualquer documento apto a demonstrar as lesões de ordem estética, pelo que o autor não comprovou o alegado na inicial, devendo ser o pedido julgado totalmente improcedente” ou, caso não seja esse o entendimento, deve ser realizada perícia técnica a fim de apurar a extensão do dano; d) a inocorrência de danos morais, pois “por óbvio que um sujeito que passa por dias numa cama de hospital não tenha os melhores dias de sua vida, no entanto, não poderá buscar benefícios de sua própria torpeza”, uma vez que não restou comprovada a culpa da parte ré pelo acidente; e) a pretensão de pensão mensal também deve ser rejeitada, porque “o autor não trouxe qualquer documento ou outro instrumento apto a demonstrar que ... estivesse trabalhando, fosse arrimo de família ou o valor de sua renda, o que se reitera os argumentos já mencionados nos tópicos anteriores, tendo em vista tendo em vista não constatada a presença dos requisitos mínimos (culpa/dolo, ato ilícito, nexo causal) para imputar a responsabilidade ao requerido”.Ao final, os Réus ofereceram reconvenção, alegando que foi despendido “o importe de R$ 2.036,00 (dois mil e trinta seis reais) para efetuar o conserto do veículo GOL”, razão pela qual requereram “a condenação solidária do autor e do proprietário da motocicleta JULIO CESAR COSTA para que indenizem os danos materiais sofridos”. Juntaram recibos e fotos (movs. 26.7 a 26.18).Apresentada pelo Autor impugnação à contestação e defesa à reconvenção (movs. 41.1), com a juntada de certidão do Detran e foto do local, foi deferida a reconvenção com inclusão do reconvindo Júlio Cesar Costa.A decisão de mov. 59.1 concedeu o benefício da assistência judiciária gratuita aos Réus.Oferecida contestação pelo reconvindo Júlio Cesar (mov. 101.2), as partes foram intimadas para especificação das provas a serem produzidas, oportunidade em que o Autor requereu as provas oral, pericial e documental (mov. 123.1), enquanto os Réus pugnaram pelas provas oral e documental (movs. 121.1) e o Reconvindo pelo julgamento antecipado da lide (mov. 122.1).A decisão de saneamento (mov. 125.1) (i) fixou como pontos controvertidos: “a. a culpa do réu/reconvinte José da Silva Alceno pela ocorrência do evento descrito nos autos (ônus da prova do autor/reconvindo); b. os danos sofridos pelo autor (ônus da prova do autor/reconvindo); c. culpa exclusiva ou concorrente do autor/reconvindo ((ônus da prova do dos réus/reconvintes); d. a ilegitimidade passiva da ré Sandra Regina Froelich em razão ser mais proprietária do veículo envolvido no acidente (ônus da prova da ré Sandra Froelich); e. a ilegitimidade passiva da reconvindo Julio Cesar Costa em razão ser mais proprietária da motocicleta envolvida no acidente ((ônus da prova da reconvindo Julio Cesar Costa”; (ii) deferiu a prova oral e indeferiu “o pedido de prova pericial, para quantificação de eventual redução da capacidade laborativa do autor/reconvindo, pois, além desta fase processual ater-se, principalmente na apuração do an debeatur, sua realização, se necessária, será postergada com maior objetividade e economia, para fase de liquidação de sentença”.Ao apresentar o rol de testemunhas, o Autor aduziu que embora “tenha indeferido realização de perícia nesta fase processual, ressalte-se que haverá necessidade de realização desta, tendo em vista que o autor deverá passar por avaliação sobre amputação supracandiliana em joelho em anexo laudo médico” (mov. 152.1 e 152.2).Ao mov. 188.1, o reconvindo Júlio Cesar Costa juntou sentença que reconheceu não ser ele o proprietário da motocicleta envolvida no acidente e de ofício de comunicação ao Detran-PR.Na audiência de instrução realizada em 04/10/2018, foram colhidos os depoimentos pessoais do Autor e do réu José da Silva Alceno, e inquiridas cinco testemunhas, sendo deferida a redesignação para oitiva da testemunha Luciano Tessara, arrolada pela parte ré, e indeferido o pedido de “prova pericial requerida pela parte autora, pois além do presente feito estar em fase de audiência de instrução, a eventual prova pericial no local dos fatos em nada serviria para apuração do ocorrido, pois o evento ocorreu há mais de 03 (três) anos, sendo que seguramente inexistem elementos ou vestígios da época do ocorrido que sirvam para instrução probatória do presente feito” (mov. 234.1 a 234.8).O Autor juntou “laudo de exame de sanidade física” (mov. 248.2), seguido de manifestação pelas partes sobre o documento (movs. 258.1 e 259.1).Após a oitiva da testemunha faltante (mov. 261.1) e o oferecimento das alegações finais (movs. 263.1, 270.1 e 272.1), foi proferida sentença de improcedência da ação principal e da reconvenção, que restou anulada em julgamento realizado por esta Câmara Cível, ante o reconhecimento de cerceamento defesa, com o retorno dos autos à origem para produção da prova pericial (mov. 319.2).Juntado o laudo pericial (mov. 407.1), a parte autora manifestou concordância (mov. 416.1) e a parte ré apresentou impugnação (mov. 418.1), seguida de manifestações de desinteresse em nova prova oral (movs. 429.1, 430.1 e 432.1).Oferecidas alegações finais somente pela parte autora (mov. 437.1), sobreveio a sentença ora apelada, que julgou parcialmente procedente a ação principal e extinta a reconvenção, sem resolução do mérito (mov. 447.1); daí a interposição da presente apelação pelo Autor. Danos materiais emergentesNa petição inicial, foi deduzido pedido de condenação dos Réus ao pagamento de indenização por danos emergentes, consistentes em despesas com transporte e alimentação da família do Autor nos oitenta e dois dias de internação e prejuízo com a devolução da moto no montante de R$.10.200,00.Sabe-se que a indenização por dano material deve corresponder ao exato valor do dano e estar fundada em provas concretas, sendo inadmissível a sua fixação com base em suposições, em consideração ao princípio da reparação integral previsto no art. 944 do Código Civil que dispõe que “a indenização mede-se pela extensão do dano”.No caso, da análise do conjunto probatório depreende-se que o Autor não se desincumbiu do seu ônus probatório, de acordo com o art. 373, I, do CPC, uma vez que não foram juntados comprovantes de pagamento ou notas fiscais, a fim de demonstrar o valor efetivamente despendido, não podendo ocorrer ressarcimento de despesas hipotéticas.Logo, impõe-se a manutenção da sentença que julgou improcedente a ação neste ponto. Danos estéticosO Apelante defende que o dano estético é evidente, porque “pelas fotos trazidas aos autos nos eventos 1.09, 1.10 e 288.1 (abaixo colacionados), é possível verificar a gravidade e extensão da lesão provocada pela imprudência do recorrido, bem como as alterações morfológicas sofridas”, ressaltando “a irreparabilidade do prejuízo causado e a permanência da lesão, os quais restam comprovados pelo Laudo médico acostado ao evento 152.2 - o qual declara que apelante apresenta lesão permanente no joelho esquerdo, com encurtamento do membro – e pelo Laudo de exame de sanidade física, de evento 248.2 - em que foi constatada a perda funcional de 70% do membro inferior esquerdo” e “apenas para reforçar o pedido de condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos estéticos, não se tratando de documento novo, e sim para que Vossas Excelências vejam a atual condição física do autor, pede-se vênia para acostar foto recente, datada de 13/09/2022, que revela a situação da perna do recorrente”.Sobre o dano estético, precisas são as lições de Sérgio Cavalieri Filho: “Inicialmente ligado às deformidades físicas que provocam aleijão e repugnância, aos poucos passou-se a admitir o dano estético também nos casos de marcas e outros defeitos físicos que causem à vítima desgosto ou complexo de inferioridade” (CAVALIERI, Sérgio Filho. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 101). Nesse sentido, pode-se conceituar o dano estético como toda e qualquer modificação física, permanente ou duradoura, na aparência física externa de uma pessoa, implicando em redução ou eliminação dos padrões de beleza ou estética estabelecidos.Em outras palavras, é a lesão à harmonia das formas externas de um sujeito. Na prática, tais danos, em regra, estão presentes quando a pessoa sofre feridas, cicatrizes, cortes superficiais ou profundos em sua pele, queimaduras, deformações, lesão ou perda de órgãos internos ou externos do corpo, aleijões, amputações, entre outras anomalias.Na espécie, inobstante a não realização de perícia, as fotos juntadas com a petição inicial (movs. 1.7 a 1.11) são suficientes à constatação dos danos estéticos sofridos pelo Autor, pois retratam a existência de extensas cicatrizes decorrentes do evento danoso.Com efeito, as fotos juntadas no mov. 1.10 demonstram cicatrizes profundas, de grande extensão e visíveis, e deformidade na perna esquerda do Autor, corroboradas pelas fotos apresentadas com o recurso de apelação (mov. 452.2 e 452.3), as quais sequer foram impugnadas nas contrarrazões apresentadas pela parte ré. Veja-se: Ademais, o laudo médico juntado no mov. 152.2, com data de 15/12/2017, atestou que o Autor apresenta lesão permanente no joelho esquerdo.À vista do exposto, como o Autor sofreu modificação permanente de seu físico com as diversas cicatrizes, deve ser indenizado pelos danos estéticos sofridos.Em relação ao montante a ser indenizado, tal como ocorre com o dano moral, o dano estético também deve ser arbitrado de acordo com a repercussão do fato danoso, a condição econômica das partes, a gravidade e a intensidade da ofensa e, consequentemente, a extensão do dano (CC, art. 944).Assim, impõe-se o provimento do recurso neste ponto, com a reforma a sentença para acolher o pedido de indenização por danos estéticos, com a respectiva fixação em R$.10.000,00, valor adequado a compensar o dano sofrido, cabendo o acréscimo de correção monetária pela média INPC/IGP-DI, desde a data deste julgamento (Súm. 362/STJ), e juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso - 12/02/2015 - (Súm. 54/STJ). Quantum indenizatório a título de danos moraisO Apelante pretende, ainda, a majoração do quantum indenizatório fixado a título de danos morais.Embora não se tenha parâmetros rígidos para encontrar o valor real da indenização, existe orientação no sentido de que não deve a importância ser ínfima, que não valorize o dano moral, nem tão elevada, que cause enriquecimento indevido ao ofendido, de maneira que o julgador, ao arbitrar o valor da indenização, deve se orientar pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente a situação econômica atual e às peculiaridades de cada caso.Sobre o tema, leciona Sério Cavalieri Filho: “Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras mais que se fizerem presentes.” (Programa de Responsabilidade Civil. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 155). No caso, como enfatizou a sentença, “levando em consideração que o acidente foi grave, assim como as suas consequências e os danos suportados pelo autor, bem como o caráter punitivo e as condições econômicas do autor, que a época do acidente trabalhava como autônomo /pedreiro, e dos réus, tenho que a indenização por danos morais deve ser fixada em R$ 20.000,00 (vinte mil reais)”.Dessa maneira, sopesando as particularidades do caso, o valor arbitrado na sentença (R$ 20.000,00) mostra-se adequado e não ofende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, estando dentro dos parâmetros adotados por esta Câmara; daí o desprovimento da apelação neste tópico. Lucros cessantesO Autor também se insurge contra a parte da sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por lucros cessantes, sob a seguinte fundamentação: “O autor postula, a título de lucros cessantes, o valor correspondente àquilo que deixou de ganhar, em razão da impossibilidade de trabalhar após o acidente.No caso em análise, o autor declinou na inicial que possuía uma renda mensal de R$ 2.000,00 (dois mil reais), todavia, para que lhe seja reconhecido o direito de indenização por lucros cessantes era necessário que o autor demonstrasse, por meio de provas, o que deixou de auferir em razão do acidente. A simples alegação do autor acerca dos prejuízos advindos do acidente, destituída de qualquer prova, não basta para o acolhimento do pedido formulado na inicial, pois, o autor tenha declinado em seu depoimento pessoal que trabalhava como autônomo/pedreiro, não indicou, por exemplo, a sua jornada de trabalho (dias/carga horária), tampouco especificou o valor auferido por dia de trabalho, não apresentou documento relativo à remuneração. Não se sabe, ainda, quanto tempo (dias/meses) o autor permaneceu sem trabalhar, portanto, não há como se presumir o lucro cessante, havendo necessidade de comprovação do dano efetivo para acolhimento do pedido. Desta forma, o pedido de condenação em lucros cessantes não comporta acolhimento”. Não prospera a irresignação recursal.Sabe-se que os lucros cessantes somente serão indenizáveis quando fundados em bases seguras, não compreendendo os lucros meramente hipotéticos.Dispõe o artigo 402 do Código Civil que: “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.Igualmente, o artigo 403 do mesmo diploma legal prevê que: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”.Sobre o tema, leciona Sergio Cavalieri Filho:“O nosso Código Civil, já no citado art. 402, valeu-se do princípio da razoabilidade para caracterizar o lucro cessante, dizendo ser aquilo que razoavelmente se deixou de lucrar. Razoável é tudo aquilo que seja, ao mesmo tempo, adequado, necessário e proporcional; é aquilo que é o bom-senso diz que o credor lucraria apurado segundo um juízo de probabilidade, de acordo com o normal desenrolar dos fatos. Não pode ser algo meramente hipotético, imaginário, porque tem que ter por base uma situação fática concreta”. (Programa de Responsabilidade Civil. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 92) No caso, o Autor não comprovou a renda mensal que efetivamente auferia à época dos fatos, sequer demonstrando qual profissão que exercia, na medida em que na petição inicial enunciou que “laborava como trabalhador autônomo, fazendo de entrega de mercadorias, auferindo a média de R$ 2.000,00 (dois mil reais) mensais”, porém na audiência de instrução e julgamento afirmou em seu depoimento pessoal que era pedreiro/pizzaiolo antes do acidente e tinha renda mensal de aproximadamente R$ 1.500,00/R$1.600,00 (mov. 234.3 – mov. 1min24seg).Por outro lado, o Autor assevera nas razões recursais que trabalhava “como autônomo fazendo entregas com a motocicleta envolvida no acidente, e com isso auferia a média de R$ 2.000,00 por mês. Ocorre que obviamente não há documentos que comprovem tal renda, eis que se trata de prestação de serviços”, argumentando que “fazia entregas para várias pessoas diferentes diariamente e recebia os valores nestas entregas não havendo qualquer documento que comprove a renda exatamente pela própria atividade que desempenhava” e nem prova oral seria possível, pois “não poderia chamar uma ou outra pessoa que tenha eventualmente feito entrega porque com certeza tal pessoa sequer lembraria quem foi que efetuou a entrega”. Contudo, conforme consignado no boletim de ocorrência (mov. 1.5, p. 2) e confirmado em seu depoimento pessoal, o Autor não possuía carteira de habilitação para motocicleta quando do acidente, “porque fazia pouco tempo que tinha comprado a moto e não a usava todo dia” (mov. 243.3, 1min35seg), de modo que não é plausível que trabalhasse como entregador na época, utilizando a motocicleta envolvida no acidente, como afirmado no apelo.Desse modo, considerando que o Autor não comprovou que exercia profissão remunerada à época do acidente de trânsito e tampouco que ficou impedido de trabalhar em razão do evento, devida a manutenção da sentença de improcedência quanto ao pedido de indenização por lucros cessantes. Assim, impõe-se o desprovimento do apelo também neste tópico. Pensão mensalO Autor ainda insiste na condenação dos Réus ao pagamento de pensão mensal, por redução de capacidade ou incapacidade laborativa decorrente do acidente.Contudo, sem razão.De acordo com o artigo 950 do Código Civil, “Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu”.Ocorre que, no caso, não há mínimos indícios probatórios da incapacidade laborativa alegada pelo Autor, uma vez que o “laudo médico” juntado no mov. 152.2, com data de 15/12/2017, apenas comprova que ele “apresenta sequela de lesão em joelho esquerdo. Paciente com lesão permanente. Paciente em tratamento com preservação do membro e encurtamento deste”, não havendo qualquer menção à impossibilidade de trabalhar ou redução da capacidade laborativa.Por sua vez, o “laudo de sanidade física” juntado no mov. 248.2, datado de 16/09/2016, demonstra que o Autor possui “incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias, mais debilidade permanente do membro inferior esquerdo (perda funcional de 70%)”, restando consignado expressamente que ficou “prejudicado para avaliação de incapacidade permanente para o trabalho, esta avaliação não se destina a esta finalidade”.Desse modo, não há dúvida que é indevida a indenização na forma de pensão mensal, nos termos do art. 950 do Código Civil, uma vez que inexiste prova de que o Autor ficou incapacitado de exercer suas atividades laborais ou teve a sua capacidade laboral reduzida em decorrência do acidente experimentado.Anote-se que não há que se falar em deferimento do pedido recursal de “realização da prova pericial indeferida em ev. 125.1, a qual comprovará a redução da capacidade laborativa e o direito ao pensionamento, a qual nos termos da decisão mencionada, será determinada em fase de liquidação de sentença”.Isso porque na petição inicial o Autor pugnou pela perícia “com objetivo de verificar o grau de comprometimento e perda da capacidade habitual e laboral do autor com o acidente”, o que foi indeferido pela decisão saneadora, sob o fundamento de que “além desta fase processual ater-se, principalmente na apuração do an debeatur, sua realização, se necessária, será postergada com maior objetividade e economia, para fase de liquidação de sentença” (mov. 125.1).Com efeito, caso restasse evidenciado minimamente que o Autor ficou com incapacidade laboral após o acidente, a prova pericial para aferir o respectivo grau poderia ser realizada na fase de liquidação de sentença. Contudo, a prova não pode recair sobre ilações, cabendo à parte que a requereu indicar fato concreto que respalde sua pretensão, a fim de ser possível a dilação probatória requerida, o que não ocorreu no presente caso.Como enfatizou a sentença, “as condições de saúde do autor, após o acidente, não restaram claramente demonstradas no presente feito, não sendo possível verificar que o autor não ficou com sequelas do acidente de trânsito que o impossibilitem de exercer trabalho. Tendo isto em vista e não se constatando nenhuma redução e diminuição da sua potencialidade produtiva, assim como a existência de lesões irreversíveis que afetem diretamente a sua colocação no mercado de trabalho e também para o exercício de duas tarefas habituais do cotidiano, não há como se acolher o pedido de pensionamento”.A propósito, neste sentido já decidiu esta Câmara Cível: RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. DESLOCAMENTO LATERAL DE UM DOS VEÍCULOS DA FAIXA DA DIREITA PARA A DA ESQUERDA DE MODO A CORTAR A FRENTE DA MOTOCICLETA CONDUZIDA PELO AUTOR. CULPA DO CONDUTOR DO AUTOMÓVEL DE PASSEIO. LUCROS CESSANTES. REDUÇÃO DA CAPACIDADE DE TRABALHO DO AUTOR NÃO PROVADA. DANO NEGATIVO E EXTENSÃO DELE. DANO ESTÉTICO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA COMPANHIA SEGURADORA PELA REPARAÇÃO DO DANO ESTÉTICO. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. APELAÇÕES PROVIDAS EM PARTE (TJPR - 10ª C.Cível - 0000831-15.2019.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR ALBINO JACOMEL GUERIOS - J. 18.11.2021) APELAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO ENTRE AUTOMÓVEL E MOTOCICLETA. LUCROS CESSANTES. COMPROVADA A ATIVIDADE LABORAL EXERCIDA PELA AUTORA À ÉPOCA DO ACIDENTE E AFASTAMENTO DO TRABALHO EM RAZÃO DO SINISTRO. DEVER DE INDENIZAR, INDEPENDENTEMENTE DO RECEBIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. NATUREZAS DISTINTAS. PENSÃO MENSAL. INVIABILIDADE. NÃO CONSTATADA A REDUÇÃO DA INCAPACIDADE LABORATIVA POR LAUDO E DOCUMENTAÇÃO TRAZIDA PELA AUTORA. DANO ESTÉTICO. QUANTUM. MANUTENÇÃO. DANO MORAL. MAJORAÇÃO. TAXA SELIC. AFASTADA. ADEQUAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS. JUROS DE MORA A PARTIR DO EVENTO DANOSO E CORREÇÃO MONETÁRIA, PELA MÉDIA DO INPC E IGP-DI, A PARTIR DO ARBITRAMENTO. ABATIMENTO DO MONTANTE RECEBIDO A TÍTULO DE SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(TJPR - 10ª C.Cível - 0007563-82.2012.8.16.0170 - Toledo - Rel.: DESEMBARGADORA ANGELA KHURY - J. 12.07.2021) Sendo assim, não tendo sido demonstrada minimamente a redução da capacidade laborativa do Autor de forma permanente, não comporta reparo a sentença em relação a este tema. 3. Conclusão e ônus da sucumbênciaPelo exposto, conclui-se pelo parcial provimento da apelação para condenar os Réus ao pagamento de indenização por danos estéticos, no valor de R$.10.000,00, acrescido de correção monetária pela média INPC/IGP-DI desde a data deste julgamento e juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso (12/02/2015).Com o resultado deste julgamento, desnecessária a redistribuição do ônus de sucumbência, cabendo a manutenção da forma fixada na sentença, na proporção de 60% para o Autor e 40% para os Réus, na medida em que condiz com o decaimento de cada uma das partes litigantes, pois o Autor foi vencedor em relação aos pedidos de danos morais e danos estéticos, restando vencido nos demais pedidos de danos materiais emergentes, lucros cessantes e pensão.Assim, devida a condenação das partes na referida proporção ao pagamento das custas/despesas processuais e dos honorários advocatícios ora fixados em 15% sobre o valor da condenação, já computada a fase recursal, conforme disposto no art. 85, §§ 2º e 11, do CPC, Por fim, faz-se a ressalva da condição de ambas as partes de beneficiários da assistência judiciária. 4. Por conseguinte, voto pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, nos termos da fundamentação.
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