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Acórdão
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Vistos, relatados e discutidos esses autos de agravo de instrumento nº 0075257-44.2022.8.16.0000 em que é agravante JANAINA RODRIGUES DE MELO e agravado FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NÃO PADRONIZADOS NPL II. I. RELATÓRIO Agravo de Instrumento interposto por JANAINA RODRIGUES DE MELO, em face da decisão do mov. 719.1, proferida pela Ex.ma Juíza de Direito Substituta CAROLINA FONTES VIEIRA, nos autos de “Execução de Título Extrajudicial”, autuada sob o nº 0023434-43.2013.8.16.0001 em trâmite perante a 4ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba/PR, em que a juíza da causa rejeitou a impugnação à penhora, ao fundamento de não ter sido comprovado o caráter alimentar dos montantes recebidos pela executada, além da constatação de desvirtuamento da conta poupança. No mais, deferiu a penhora de 15% dos rendimentos da executada, nos seguintes termos: “(...) 2.Não obstante a alegação da executada quanto ao recebimento de valores a título de prestação de serviços, e em que pese a juntada de holerites e demonstração de vínculo empregatício (mov. 706.4/706.8), não se denota nos autos qualquer comprovante de transferência bancária em nome da empresa empregadora, que possa corroborar com a arguição da origem dos montantes recebidos pela devedora em sua conta bancária. Assim, cumpre salientar que a simples impugnação à penhora não se presta a vincular a presunção de cabimento do disposto no art. 833, inc. IV, do Código de Processo Civil, diante da imprescindibilidade da demonstração efetiva do caráter alimentar dos valores recebidos pela executada, o que, no caso em comento, não ocorreu, diante da ausência da demonstração inequívoca de que os valores recebidos eram de fato provenientes do vínculo empregatício demonstrado. Ademais, embora a constrição dos ativos financeiros tenha recaído sobre conta poupança, destaca-se que a hipótese do art. 833, inc. X, do Código de Processo Civil, que dispõe sobre a impenhorabilidade de quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos, tem sido mitigada quando demonstrado o desvirtuamento da conta, utilizada como verdadeira conta corrente. Isso porque, a impenhorabilidade prevista no aludido dispositivo objetiva preservar a reserva de recursos financeiros depositados em conta poupança, o que não ocorre quando esta é utilizada como se conta corrente fosse, uma vez constatadas transferências bancárias e demais transações financeiras, que fogem ao objetivo da conta poupança, como é o caso da devedora em questão, eis que embora demonstrado o recebimento de três transferências, que somadas dariam R$1.200,00 (um mil e duzentos reais), houve a localização e constrição de tão somente R$400,00 (quatrocentos reais), conforme se vê dos extratos colacionados ao mov. 706.3/706.7, o que indica a utilização da referida poupança como conta corrente. (...)Isto posto, considerando que não restou devidamente comprovado o caráter alimentar dos montantes recebidos pela executada, bem como diante do desvirtuamento da conta poupança mantida por esta, a medida que se impõe é a rejeição da impugnação retro. 3.Ademais, em relação ao pleito da credora para a penhora sobre percentual de salário (mov. 715), cumpre ressaltar que as hipóteses de impenhorabilidade previstas no art. 833, inc. IV, do CPC, vêm sofrendo relativizações pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nos casos em que a quantia a ser penhorada não afronte a dignidade e a subsistência do devedor e de sua família, conforme destaco: “A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73; art. 833, IV, do CPC/2015), pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família.” (EREsp 1582475/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/10/2018, DJe 16/10/2018). Sendo assim, diante dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo possível o bloqueio de parte da remuneração, em especial quando não houver comprometimento da subsistência da devedora, diante da sua manifesta inadimplência, assim como da ausência de outros bens passíveis de penhora. (...)”. Da decisão, insurge-se a ora agravante, pugnando por sua reforma, uma vez que: a) são impenhoráveis as remunerações e os valores depositados em conta poupança até o limite de 40 salários mínimos; b) a penhora recaiu sobre a única fonte de renda da executada, ofendendo seu direito de viver uma vida digna; e c) a penhora sobre percentual de salário, no importe de 15% da remuneração, deve ser revogada, pois não se trata de dívida alimentar que autorize tal constrição.Por fim, pugnou pela concessão de efeito ativo ao recurso, a fim de que seja imediatamente suspensa a decisão. No mérito, pediu pela confirmação da liminar, com a reforma da decisão e indeferimento da penhora de percentual da remuneração. O pedido de efeito suspensivo foi parcialmente provido (mov.11.1-TJPR)Na sequência, a parte agravada não apresentou contrarrazões.É o relatório.
II. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, foi deferido o processamento do recurso. A agravante pugna pela reforma da decisão judicial que rejeitou a impugnação à penhora, ao fundamento de não ter sido comprovado o caráter alimentar dos montantes recebidos pela executada, além da constatação de desvirtuamento da conta poupança, de resto deferiu a penhora de 15% dos rendimentos da executada.Pois bem.Quanto à mitigação da impenhorabilidade da conta poupança, entendo que a matéria deva ser apreciada com a cautela que o caso requer.Isso porque a controvérsia recursal reside no fato de que o juízo “a quo” rejeitou a impugnação à penhora apresentada em seq. 706 sob o argumento de que não ficou comprovado que os montantes bloqueados têm origem em verba salarial, bem como deferiu o requerimento de penhora de percentual da remuneração da agravante ao argumento de que a impenhorabilidade do salário vem sofrendo relativização pela jurisprudência do STJ. Com efeito, o art. 833, inciso X, do Código de Processo Civil prevê, expressamente, que os valores depositados em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos são impenhoráveis: Art. 833. São impenhoráveis:[...]X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos; É sabido, que tal dispositivo objetiva preservar uma reserva mínima utilizada para a sobrevivência do devedor, isto é, protege a dignidade da pessoa humana a fim de garantir um mínimo existencial.E, este dispositivo supra deve ser aplicado, in casu, através de uma interpretação extensiva, balizada pelo próprio Eg. Superior Tribunal de Justiça.Duplica-se: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. VALORES DEPOSITADOS EM CONTAS BANCÁRIAS. MONTANTE INFERIOR A QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE. 1. Cuida-se, na origem, de execução de título extrajudicial. 2. São impenhoráveis os valores poupados pelo devedor, seja em caderneta de poupança, conta-corrente, fundo de investimentos ou em papel-moeda, até o limite de 40 salários mínimos. Precedente da 2ª Seção. 3. A simples movimentação atípica apurada pelas instâncias ordinárias, por si só, não constitui má-fé ou fraude a ensejar a mitigação da impenhorabilidade do art. 833, X, do NCPC. 4. Agravo interno no recurso especial não provido. (AgInt no REsp 1795956/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2019, REPDJe 29/05/2019, DJe 15/05/2019). (grifei). CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. POUPANÇA VINCULADA À CONTA-CORRENTE. LEVANTAMENTO DA PENHORA DE 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA N. 182 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.1. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "reveste-se de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em caderneta de poupança propriamente dita, CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que a única reserva monetária em nome do recorrente, e ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias do caso concreto (inciso X)" (REsp n. 1.230.060/PR, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/8/2014, DJe 29/8/2014). 2. Além disso, a interpretação do STJ do § 2º do art. 833 do CPC/2015 é de que "deve ser preservada a subsistência digna do devedor e de sua família. A percepção de qual é efetiva e concretamente este mínimo patrimonial a ser resguardado já foi adotada em critério fornecido pelo legislador: 50 salários-mínimos mensais" (REsp n. 1.747.645/DF, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 7/8/2018, DJe 10/8/2018). 3. (...) (AgInt no AREsp 1412741/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 19/08/2019, DJe 22/08/2019). (grifei). No caso sub judice, o valor bloqueado trata-se de investimentos de renda fixa e muito abaixo de 40 (quarenta) salários-mínimos, eis que a renda da agravante bruta é de R$ 1.250,80 (mil duzentos e cinquenta reais e oitenta centavos) e liquida é de R$ 903,05 (novecentos e três reais e cinco centavos), conforme mostra o holerite anexado nos autos (mov. 706.8- dos autos originários).Ademais, tal como afirmado no recurso, o bloqueio judicial deferido nos autos ocorreu na conta poupança da executada, (R$ 523,83) em quantia também inferior aos 40 salários mínimos adotados pela legislação em vigor como parâmetro de impenhorabilidade. Se não bastasse isso, merece credibilidade a alegação de que a pensão alimentícia depositada na conta da agravante refere-se a filha de 8 (oito) anos que a recorrente apresenta, no qual o gestor deposita mensalmente o valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais) na conta da Caixa Econômica para sustento dela e de sua filha, conforme consta nos autos (mov.16.1-TJPR). CONCLUSÃO Posto isso, voto para conhecer e dar provimento ao agravo de instrumento
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