Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DECISÃO QUE AFASTA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE VALORES BLOQUEADOS EM CONTAS CORRENTES. INCONFORMISMO DO EXECUTADO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ART. 833, X, DO
CPC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ. CONHECIMENTO DO RECURSO E PROVIMENTO. 1. O STJ possui o entendimento de que o art. 833, X, do CPC, pode ser interpretado extensivamente, de modo que as economias do devedor, depositadas em conta corrente, conta poupança ou em qualquer fundo de investimento até o limite de 40 salários mínimos, são consideradas impenhoráveis, ressalvada eventual prova de má-fé, abuso ou fraude relativa à
alegação. 2. Recurso conhecido e, no mérito, provido para reconhecer a impenhorabilidade das verbas.
(TJPR - 20ª Câmara Cível - 0075946-88.2022.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR FABIO MARCONDES LEITE - J. 17.04.2023)
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Acórdão
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1. Relatório Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de reconhecimento de impenhorabilidade de valores, em ação monitória em fase de cumprimento de sentença, autuada sob o n. 0009026-69.2021.8.16.0194.O executado agravante sustenta em suas razões recursais que: a jurisprudência do STJ é pacífica quanto à impenhorabilidade de valores de até quarenta salários mínimos poupados, independentemente de onde eles estejam aplicados e que o ônus da prova de má-fé, abuso de direito ou fraude pelo executado ao sustentar referida alegação é da parte exequente.Requereu a concessão de efeito suspensivo, o conhecimento do recurso e a reforma da decisão agravada.O efeito suspensivo pleiteado foi concedido (mov. 8.1).Intimada, a parte agravada apresentou contrarrazões aduzindo, preliminarmente, a ausência de dialeticidade. No mérito, defendeu: a penhorabilidade dos valores, pois não se tratariam de valores poupados com a característica de reserva financeira e que o agravante não fez prova de sua alegação (mov. 14.1).É o relatório.
2. Voto e fundamentaçãoDe início, cumpre analisar a preliminar suscitada nas contrarrazões de ofensa ao princípio da dialeticidade.Sobre o tema, Araken de Assis instrui:“O fundamento do princípio da dialeticidade é curial. Sem cotejar as alegações do recurso e a motivação do ato impugnado, mostrar-se-á impossível ao órgão ad quem avaliar o desacerto do ato, a existência de vício de juízo (error in iudicando), o vício de procedimento (error in procedendo) ou o defeito típico que enseja a declaração do provimento. A motivação do recurso delimita a matéria impugnada (art. 1.013, caput). É essencial, portanto, à predeterminação da extensão e profundidade do efeito devolutivo. Por outro lado, a falta da motivação prejudica o contraditório: desconhecendo as razões do recorrente, o recorrido não pode se opor eficazmente à pretensão recursal.” (Assis, Araken de. Manual dos recursos [livro eletrônico]. 4. ed. - São Paulo: Thomson Reuters)Com efeito, nas razões recursais o agravante trouxe fundamentos suficientes ao conhecimento do recurso, defendendo que independentemente de onde os valores bloqueados estejam aplicados, por não ultrapassarem quarenta salários mínimos, são impenhoráveis.Além disso, expôs os fatos, o direito e as razões do pedido de reforma, bem como o próprio pedido. Assim, cumpriu o disposto no art. 1.016, I e II, do CPC, não havendo que falar em ofensa ao princípio da dialeticidade.Portanto, presentes os requisitos de admissibilidade intrínsecos (cabimento, legitimidade, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade, preparo e regularidade formal), o recurso deve ser conhecido.No mérito, assiste razão ao agravante.Conforme já destacado na decisão que atribuiu efeito suspensivo ao presente recurso, o STJ possui o entendimento de que a hipótese de impenhorabilidade prevista no art. 833, X, do CPC, interpreta-se extensivamente:ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 833, X, DO CPC. IMPENHORABILIDADE DE VALORES DEPOSITADOS EM CADERNETA DE POUPANÇA OU CONTA-CORRENTE. LIMITE DE ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça trilha o entendimento de que a quantia inferior a quarenta salários mínimos depositada em conta-corrente, conta poupança ou em qualquer fundo de investimento decorrente de verbas salariais deve ser acobertada pela proteção legal da impenhorabilidade absoluta, nos termos do art. 833, IV e X , do Código de Processo Civil. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp n. 2.128.627/RS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 10/10/2022, DJe de 14/10/2022.).A impenhorabilidade se estende, portanto, aos valores de até 40 (quarenta) salários mínimos depositados em caderneta poupança, conta corrente ou fundos de investimento. Na demanda principal, denota-se que mesmo utilizada a modalidade repetição programada de ordem (“teimosinha”) por 30 dias no Sisbajud, foram bloqueados valores que somam R$ 1.024,56, menos de um salário mínimo, o que comprova que o executado tem poucos rendimentos e necessita da quantia para sua sobrevivência. Tal presunção é corroborada pelo fato de que ele compareceu aos autos representado pela Defensoria Pública, o que somente é possível caso o atendido possua renda de até 3 salários mínimos (por família) ou que não possam bancar custos honorários advocatícios sem prejuízo do sustento familiar. Importante destacar, por fim, que não ficou demonstrado, ao menos em um juízo de cognição sumária, má-fé, abuso ou fraude relativa à alegação do executado agravante.Portanto, está configurada a impenhorabilidade dos valores bloqueados.Nesse mesmo sentido, cita-se as seguintes ementas:AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DISCUSSÃO SOBRE A PENHORABILIDADE DE VALORES ENCONTRADOS EM CONTA CORRENTE. VALOR BLOQUEADO QUE NÃO ULTRAPASSA QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE VERIFICADA, INDEPENDENTEMENTE DO TIPO DE OPERAÇÃO BANCÁRIA CONTRATADA OU DA OCORRÊNCIA DO DESVIRTUAMENTO DA UTILIZAÇÃO DA CONTA. AMPLIAÇÃO DO ALCANCE DA REGRA DO ARTIGO 833, INCISO X, DO CPC. INCIDÊNCIA SOBRE TODOS OS ATIVOS FINANCEIROS DO DEVEDOR, DESDE QUE RESPEITADO O TETO DE QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. A impenhorabilidade estabelecida pelo artigo 833, X, do novo Código de Processo Civil incide sobre todas as economias do devedor, até o limite de 40 salários mínimos, independentemente do tipo de operação bancária contratada para a guarda delas ou da ocorrência do desvirtuamento da utilização da conta, devendo, por isso, ser acolhida a pretensão recursal. (TJPR - 18ª Câmara Cível - 0034015-08.2022.8.16.0000 - São José dos Pinhais - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ HENRIQUE MIRANDA - J. 19.09.2022). AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. BLOQUEIO DE VALORES. ARGUIÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DAS VERBAS ATÉ 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS (ART. 833, X, DO CPC). DECISÃO QUE DETERMINA O LEVANTAMENTO DE PARTE DO NUMERÁRIO BLOQUEADO, MANTENDO A CONSTRIÇÃO SOBRE O VALOR DE R$ 130,58. PRETENSÃO DE DESBLOQUEIO INTEGRAL. ACOLHIMENTO. PRESUNÇÃO DE RISCO À GARANTIA DO PATRIMÔNIO MÍNIMO DO DEVEDOR. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ PARA MANUTENÇÃO DA PENHORA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. Recurso conhecido e provido. (TJPR - 14ª Câmara Cível - 0062467-28.2022.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADORA THEMIS DE ALMEIDA FURQUIM - J. 30.01.2023).Diante do exposto, vota-se por conhecer do recurso e, no mérito, dar a ele provimento nos termos da fundamentação.
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