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Decisão monocrática
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 - E-mail: 18CC@tjpr.jus.br Recurso: 0007182-84.2021.8.16.0194 Classe Processual: Apelação Cível Assunto Principal: Alienação Fiduciária Apelante(s): ELIAS CARDOSO ROCHA Apelado(s): ADEMICON ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS S/A DECISÃO MONOCRÁTICA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. AFASTADA. VALIDADE DA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL, APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL E VALIDADE DO DOCUMENTO APRESENTADO NOS AUTOS. MATÉRIA JÁ DECIDIDA EM RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRECLUSÃO E OFENSA A COISA JULGADA. DISCUSSÃO SOBRE O SISTEMA DE CÁLCULO UTILIZADO NO CONTRATO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO NÃO CONHECIDO COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 932, INCISO III DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Em que pese a alegação em sede de contrarrazões de mov. 78.1, destaca-se que não há que se falar em violação ao princípio da dialeticidade, porquanto seja possível vislumbrar correlação entre os fundamentos trazidos pela sentença e os argumentos construídos pelo apelante. Na hipótese, tem-se que a decisão de Agravo de Instrumento transitou em julgado em 30/08/2022, restando precluso o direito do apelante de discutir a validade da notificação extrajudicial, a possibilidade de aplicação da teoria do adimplemento substancial e a validade do contrato acostado nos autos, posto que a decisão proferida no Agravo de Instrumento já decidiu acerca da matéria, sendo necessário o seu cumprimento. Ocorrência de preclusão consumativa quanto a validade da notificação extrajudicial, pois a matéria já transitou em julgado, impedindo sua reanálise em recurso de Apelação Cível. Por fim, alega a parte apelante que o contrato é omisso no que tange ao sistema de cálculo utilizado, pois não demonstra como as prestações foram calculadas, também não há projeção teórica de como o plano de financiamento irá abater o saldo devedor para quitação. Todavia, tal argumento não foi utilizado na sentença impugnada, bem como não foi objeto de discussão nos autos, pelo que ausente interesse recursal neste ponto. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº. 0007182-84.2021.8.16.0194, da 12ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que é apelante ELIAS CARDOSO ROCHA e apelado ADEMICON ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS S/A. I – RELATÓRIO Trata-se de ação de busca e apreensão ajuizada por ADEMICON ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS S/A em face de ELIAS CARDOSO ROCHA, pela qual a parte autora pretende a apreensão do veículo objeto do contrato de financiamento, com base na inadimplência da parte ré (mov. 1.1). Deferida a liminar (mov. 13.1), o bem foi apreendido (mov. 28.2). A parte ré interpôs agravo de instrumento, o qual foi julgado improvido (mov. 60.1). Após os trâmites processuais, o magistrado proferiu sentença (mov. 63.1), nos seguintes termos: Em face ao exposto e mais o que dos autos constam, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para CONSOLIDAR EM MÃOS DO PROPRIETÁRIO FIDUCIÁRIO a posse e a propriedade plena e exclusiva do bem alienado fiduciariamente, a saber: Volkswagen Ibrava, ano/modelo 2013/13, cor branca, placas FSZ0590, chassi 9532M62P3DR33971. Outrossim, CONDENO a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 15% sobre o valor atualiza do atribuído à causa com fulcro no artigo 85, §2º, c/c 8º, do CPC. Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação (mov. 71.1) alegando, em síntese, que: a) a apelante encontra-se debilitada financeiramente, não podendo arcar com as custas iniciais de ingresso sem prejuízo de seu sustento e de sua família; b) não existe nos autos notificação extrajudicial válida, mas apenas aviso de recebimento entregue na residência do requerido sem indicar o conteúdo da carta, não se podendo comprovar que dentro dela existia notificação de débito a pagar (notificação de mora); c) tendo o autor pagou mais de 95% (noventa e cinco por cento) do bem, inviável o processamento da presente ação de busca e apreensão. Por esta razão, pugna pela aplicação da teoria do adimplemento substancial ao caso; d) ante a ausência do contrato originário, ou seja, do contrato de adesão é meta jurídica impossível o processamento da presente ação de busca e apreensão, pois, sem ele não há como verificar a regularidade do financiamento; e) o contrato é omisso no que tange ao sistema de cálculo utilizado, pois não demonstra como as prestações foram calculadas, também não há projeção teórica de como o plano de financiamento irá abater o saldo devedor para quitação. Pugnou, ao final, pelo conhecimento e provimento do recurso. A parte apelada apresentou contrarrazões no mov. 78.1. É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: O artigo 932, inciso III do Código de Processo Civil, permite que o relator monocraticamente não conheça de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida. Com base nesse permissivo legal, passo a julgar monocraticamente o recurso, tendo em vista ser manifestamente inadmissível. Preliminarmente, nota-se que o benefício da gratuidade da Justiça tem por objetivo precípuo garantir o acesso ao Judiciário. Neste sentido, quando uma pessoa física ou jurídica tem receio de ingressar com uma demanda judicial e, assim, buscar a concretização de seus direitos, em razão das custas iniciais ou do risco de eventual condenação sucumbencial, cabe ao Estado garantir a elas o benefício da gratuidade da Justiça, permitindo, então, que seus direitos venham a ser efetivamente tutelados. Assim sendo, este benefício acaba se vinculando muito mais à parte autora de uma demanda judicial do que com a parte ré, uma vez que é a primeira quem busca a concretização de seus direitos materiais através do Judiciário. Em verdade, nota-se que a concessão do benefício da gratuidade da Justiça à parte ré ocorre de forma atípica, admissível apenas em casos muito específicos que envolvam custas para a produção de provas ou para recolhimento de custas. Afinal, se assim não fosse, parcela substancial dos réus em ações de cobrança, execuções fiscais ou ações de despejo, seria beneficiária da gratuidade da Justiça, uma vez que muitas vezes estas demandas são motivadas pura e simplesmente pela incapacidade financeira dos réus, que não conseguiram adimplir com seus débitos tempestivamente, o que implicaria, por exemplo, na criação de obstáculos injustificáveis para que os advogados dos exequentes pudessem cobrar as verbas sucumbenciais. Portanto, a concessão do benefício da Justiça Gratuita à parte ré de uma demanda judicial, tal como requer a parte apelante no presente caso, deve estar vinculada estritamente ao exercício da ampla defesa, viés do acesso à Justiça garantido à parte que se defende. Desta forma, ainda que não se possa admitir, por força de sua posição como ré na ação originária, a concessão irrestrita da gratuidade da Justiça à parte apelante, inclusive para abranger o ônus sucumbencial, revela-se cabível, por outro lado, seu deferimento para as custas recursais, uma vez que vinculadas ao próprio exercício da ampla defesa. Deste modo, desde logo se assevera que resta dispensado o preparo do presente recurso. Outrossim, em que pese a alegação do apelado em sede de contrarrazões de recurso (mov. 78.1), destaca-se que não há que se falar em violação ao princípio da dialeticidade, porquanto seja possível vislumbrar correlação entre os fundamentos trazidos pela sentença e os argumentos construídos pelo apelante. No mais, aduz o apelante que a sentença deve ser modificada, uma vez que existe comprovação da entrega de um AR, contudo não de seu conteúdo. Afirma que tendo o autor realizado o pagamento de mais de 95% (noventa e cinco por cento) do bem, inviável o processamento da presente ação de busca e apreensão. Por esta razão, pugna pela aplicação da teoria do adimplemento substancial ao caso. Sustenta, ainda, que a demanda deve ser extinta, pois ausente documento indispensável a propositura da ação. Da análise dos autos, observa-se que proposta a demanda de busca e apreensão, a liminar foi deferida (mov. 13.1), sendo o bem apreendido (mov. 28.2). Desta decisão, a parte autora interpôs recurso de agravo de instrumento, oportunidade em que aduziu os temas mencionados acima pleiteando: (i) ausência de constituição da mora, (ii) aplicação da teoria do adimplemento substancial e (iii) extinção do feito, ante a ausência documento indispensável a propositura da ação. O citado recurso (Agravo de Instrumento nº 0074964- 11.2021.8.16.0000) foi julgado improvido, sob a fundamentação de que: (i) a notificação extrajudicial é válida, (ii) não é possível a aplicação da teoria do adimplemento substancial ao caso em espécie, cuja transcrição segue abaixo: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO EM INADIMPLÊNCIA - VEÍCULO ALIENADO FIDUCIARIAMENTE - DECISÃO QUE DEFERIU LIMINARMENTE A BUSCA E APREENSÃO DO VEÍCULO - AGRAVANTE QUE SUSTENTOU A AUSÊNCIA DA DEVIDA CONSTITUIÇÃO EM MORA - NOTIFICAÇÃO QUE FOI ENCAMINHADA AO ENDEREÇO CONSTANTE NA FICHA CADASTRAL – DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO DO CONTEÚDO NO AR DA NOTIFICAÇÃO – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL NESSE SENTIDO – MORA DEVIDAMENTE COMPROVADA – PEDIDO REJEITADO – INSURGÊNCIA DO AGRAVANTE PARA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL – INAPLICABILIDADE EM CONTRATOS DE GARANTIA POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA PRECEDENTES DO STJ – DESCABIMENTO DA TEORIA EM PROCEDIMENTO DITADO PELO DECRETO LEI N°911/69 DIANTE DA INCOMPATIBILIDADE – ENTENDIMENTO CONSOLIDADO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E NO MÉRITO DESPROVIDO. Além disso, no que tange a alegação de que a demanda deve ser extinta, ante a ausência de documento indispensável, no agravo de instrumento restou decidido que: “Ademais, pugna o agravante pela extinção do feito, pois ausente documento indispensável a propositura da ação, qual seja, o contrato de adesão, contudo, novamente sem razão, basta uma breve análise do caso em tela que se verifica a inocorrência de inépcia por ausência de documentos indispensáveis a propositura da ação, sendo que a peça exordial cumpriu todos os requisitos elencados no CPC.” Na hipótese, tem-se que a decisão de Agravo de Instrumento transitou em julgado em 30/08/2022, restando precluso o direito do apelante de discutir a validade da notificação extrajudicial, a possibilidade de aplicação da teoria do adimplemento substancial e a validade do contrato acostado nos autos, posto que a decisão proferida no Agravo de Instrumento já decidiu acerca da matéria, sendo necessário o seu cumprimento. Evidente que o direito de alegar tal matéria resta precluso, uma vez que nesse ponto o acórdão já transitou em julgado, não havendo que se falar em reforma, pois estaríamos diante de grave ofensa à coisa julgada, direito esse que encontra respaldo no art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal. Nesse sentido, Fredie Didier Junior preleciona que: “A coisa julgada é instituto jurídico que integra o conteúdo do direito fundamental à segurança jurídica, assegurado em todo Estado Democrático de Direito, encontrando consagração expressa, em nosso ordenamento, no art. 5º, XXXVI, CF. Garante ao jurisdicionado que a decisão final dada à sua demanda será definitiva, não podendo ser rediscutida, alterada ou desrespeitada – seja pelas partes, seja pelo próprio Poder Judiciário.” (DIDIER, Fredie – Curso de Direito Processual Civil – Volume 2 – 7ª edição – 2012. p.417/418.) Neste sentido, é de se reconhecer que no presente caso operou-se a preclusão consumativa, devendo ser reconhecida a impossibilidade de rediscussão sobre referido tópicos neste momento processual, eis que resta absolutamente superado. Este é o entendimento deste Egrégio Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. 1. TESE DE APLICABILIDADE DO CDC. PEDIDO JÁ CONCEDIDO NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. 2. TESE DE PRESCRIÇÃO. MATÉRIA JÁ ANALISADA POR INTERMÉDIO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. 3. TESE DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE EM RAZÃO DA INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO ENTRE AS PARTES. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. PARÁGRAFOS E VOCÁBULOS IDÊNTICOS ÀQUELES PRESENTES NA CONTESTAÇÃO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. 4. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROVA PERICIAL NÃO SOLICITADA NO MOMENTO OPORTUNO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE BASEADO NO CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JUIZ. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS DIREITOS DO APELANTE. 5. ALEGAÇÃO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ EM SEDE DE CONTRARRAZÕES. INOCORRÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, DESPROVIDO. (TJPR - 18ª Câmara Cível - 0017430-78.2009.8.16.0017 - Maringá - Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ANA PAULA KALED ACCIOLY RODRIGUES DA COSTA - J. 03.10.2022) Portanto, não conheço do recurso neste ponto. Por fim, alega a parte apelante que o contrato é omisso no que tange ao sistema de cálculo utilizado, pois não demonstra como as prestações foram calculadas, também não há projeção teórica de como o plano de financiamento irá abater o saldo devedor para quitação Todavia, tal argumento não foi utilizado na sentença impugnada, bem como não foi objeto de discussão nos autos, pelo que ausente interesse recursal neste ponto. Portanto, não conheço do recurso, pois ausente um dos pressupostos de admissibilidade recursal. Em atendimento ao art. 85, § 11 do CPC, majoro os honorários anteriormente arbitrados na sentença para 17% sobre o valor atualiza do atribuído à causa. III - DECISÃO: Face ao exposto, monocraticamente e com fundamento no artigo 932, inciso III do Código de Processo Civil/15, não conheço do recurso, nos termos acima expostos. Transitado em julgado e promovidas as anotações, retornem os autos à origem. Publique-se. Intimem-se. Curitiba, 24 de fevereiro de 2023. Des. MARCELO GOBBO DALLA DEA Relator
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