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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
1. O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia contra Gean Ramos Nogueira Krewei da Silva, imputando-lhe a prática dos crimes dispostos no artigo 180, caput, do Código Penal, nos seguintes termos (mov. 17.1): No dia 29 de maio de 2019, por volta das 22h50min, em via pública, na Rodovia BR 376, s/nº, Bairro Centro, em Tijucas do Sul, Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, PR, o denunciado Gean Ramos Nogueira Krewei da Silva, com vontade livre e ciente da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, conduzia em proveito próprio, 1 (um) veículo GM Spin, cor cinza, placas aplicadas IUD-6795, placas originais AXP-9414, avaliado em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), coisa que sabia ser produto de crime, anteriormente subtraído, de propriedade da vítima Gislaine Komarcheuski, conforme auto de exibição e apreensão de mov. 1.11, boletim do roubo do veículo de mov. 1.14, tudo nos termos do boletim de ocorrência de mov. 1.16”.A denúncia foi recebida em 06 de junho de 2019. Na mesma oportunidade foi determinada a citação e intimação do acusado para que comparecer perante ao Juízo deprecado para a realização da audiência de proposta de suspensão condicional do processo (mov. 20.1).Porém, antes da audiência, o acusado foi preso preventivamente nos autos nº 0009885-78.2019.8.16.0025, obstando seu direito ao benefício[1].Após regular instrução processual, sobreveio a respeitável sentença que julgou improcedente a denúncia e absolveu Gean Ramos Nogueira Krewei da Silva, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (mov. 197.1).Intimada, a representante do Ministério Público interpôs recurso de apelação, requerendo a condenação do apelado nas sanções impostas na denúncia, ao argumento de que a materialidade e a autoria delitiva restaram devidamente comprovadas no feito. Requereu, também, a intimação da proprietária do veículo “a respeito da possível formulação do pedido de restituição do respectivo veículo e, para tanto, que junte a documentação comprobatória necessária, bem como seja informada que a ausência de interesse poderá acarretar no perdimento do bem” (mov. 210.1).Contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do apelo (mov. 224.1). Nesta instância, a d. representante da Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (mov. 13.1 – Projudi 2º grau). É o relatório.
2. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo interposto.Conforme relatado, busca a representante ministerial a condenação do apelado nas sanções contidas na denúncia.Em que pese o entendimento da MM. Juíza sentenciante, a análise das provas coligidas aos autos demonstra que o apelado praticou o delito de receptação.A materialidade delitiva restou evidenciada através do Prisão em Flagrante Delito (mov. 1.3), Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.11), Boletim de Ocorrência (movs. 1.15 e 1.16), auto de avaliação (mov. 1.13), boletim de ocorrência do delito anterior (mov. 1.14), além dos depoimentos colhidos durante a instrução processual. No que diz respeito à autoria, esta é certa e recai sobre o apelado.Segundo se infere dos autos, a Polícia Rodoviária Federal em trabalho de rotina determinou a parada do veículo Chevrolet/Spin de cor cinza, portando placas IUD6795/PR, conduzida pelo apelado e tendo mais duas pessoas como passageiros. Ao verificar os documentos do veículo foi constatado que as placas eram de outro veículo, bem como se tratava de carro produto de furto/roubo em 18.05.2019.Ao ser interrogado na fase extrajudicial, o recorrido relatou (mov. 1.8):Em juízo disse que comprou o veículo dois dias antes dos fatos em um grupo de veículos “piseira”, sendo que acreditou que estava com atraso nas parcelas de financiamento. Negou que sabia se tratar de carro furtado, pois não verificou a documentação ou fez qualquer consulta. Ainda, que o vendedor disse que lhe entregaria o documento no dia seguinte, esclarecendo que o conheceu em um grupo de WhatsApp.Por sua vez, a policial rodoviária federal Mariana Milani Prolik, ao ser ouvida em juízo, relatou como os fatos ocorreram, contando que “ao realizar a consulta, verificaram que a placa não condizia com o carro, e o original estava com alerta de furto ou de roubo. Mencionou que havia três pessoas no carro, sendo o condutor e outros dois passageiros. Esclareceu que o condutor disse que entregaria o automóvel em alguma cidade de Santa Catarina. Negou que o acusado tenha dito de quem adquiriu o veículo. Acrescentou que as demais pessoas falaram que estavam de carona, sendo que havia mandado de prisão contra um deles, não se recorda o motivo. Respondeu que apenas as placas estavam adulteradas. Indicou que o acusado conduzia o carro e possuía a chave. Negou que se recorda o tempo da subtração. Reiterou que o denunciado disse que levaria o carro para Santa Catarina, mas não revelou para quem. Ressaltou que o denunciado não demonstrou surpresa, mas estava bem nervoso na abordagem. Por fim, citou que não se recorda se o denunciado afirmou algo sobre a placa adulterada”.Já o policial rodoviário federal Leandro Marcos Scolari, em juízo, não se recordou exatamente dos fatos, mas ratificou o conteúdo do boletim de ocorrência, oportunidade em que declarou (mov. 1.4):Prevê o artigo 180, caput, do Código Penal:Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: A questão sempre de difícil averiguação nos delitos de receptação é a existência do elemento subjetivo acerca do dolo – sabe ser produto de crime, considerando que para tanto seria necessário entrar na mente do autor do fato.Diante de tal obstáculo, a doutrina e a jurisprudência entendem que para determinar se o agente sabia que o objeto era produto de crime, a reconstrução dos fatos associada às regras de experiência, permitem verificar a existência do dolo.Neste sentido, clara e elucidativa a lição de Miguel Reale Junior[2]:“Em suma, os dados objetivos externos, as circunstâncias que contornam o fato, a natureza das pessoas envolvidas, a forma ―come sono realmente andate le cose -, na expressão de GALLO, permitem o reconstruir histórico do acontecimento, em todas suas minúcias que somadas às regras de experiência levam a inferir ou não a ocorrência do dolo e dos elementos subjetivos. De todos estes dados externos pode-se verificar a falta do conhecer e do querer os elementos constitutivos do tipo. A jurisprudência indica também o caminho para se deduzir a existência deste dado subjetivo essencial do delito de receptação: verificar se as circunstâncias que envolvem o fato podem ser condizentes ou não, segundo regras normais de comportamento, com o conhecimento de ser a coisa adquirida produto de crime”.E prossegue:“Mas com maior rigor no crime de receptação deve-se submeter os indícios a crivo lógico. Serão, portanto, elementos de prova do aspecto subjetivo os dados de fato, certos quanto à sua existência, coordenados logicamente, segundo as categorias da inteligência humana, que dada sua qualidade e quantidade, apontam, de forma unívoca, uma realidade não desmentida por qualquer outra prova. HÉLIO TORNAGHI conceitua o indício como ―o fato provado que por sua ligação com o fato probando autoriza a concluir algo sobre este. É o que se dá quando circunstâncias de forma coerente, harmônica e unívoca apontam, logicamente e segundo o senso comum, a conclusão não contrastada do conhecimento da origem ilícita da coisa”.No mesmo sentido destaco as seguintes decisões deste Tribunal:DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO. FURTO QUALIFICADO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DAS DEFESAS. A) APELAÇÃO 1. DELITO DE RECEPTAÇÃO. 1. PEDIDOS ABSOLUTÓRIO E DESCLASSIFICATÓRIO. MATERIALIDADE E AUTORIA QUE FORAM ROBUSTAMENTE COMPROVADAS. APREENSÃO DE BENS RECEPTADOS EM POSSE DO ACUSADO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO E DAS PROVAS COLETADAS DURANTE A INSTRUÇÃO PARA AFERIR A EXISTÊNCIA DE DOLO NA CONDUTA DO AGENTE. COMPRA DE CORRENTES DE FERRO COM PESO DE APROXIMADAMENTE 200 KG. PAGAMENTO DE VALOR IRRISÓRIO. PRÁTICA DELITIVA CONFIGURADA. IMPOSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA FORMA CULPOSA. DELITO PRATICADO EM MODALIDADE DOLOSA. 2. PLEITO DE ISENÇÃO DO PAGAMENTO DA PENA DE MULTA. NÃO ACOLHIMENTO. PRECEITO SECUNDÁRIO DO TIPO PENAL EM APREÇO DE INCIDÊNCIA OBRIGATÓRIA. B) APELAÇÃO 2. FURTO QUALIFICADO. 3. PEDIDO PARA AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. POR MAIORIA FOI AFASTADA A QUALIFICADORA DE ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. READEQUAÇÃO DA PENA. 4. PRETENSÃO DE ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. RÉU REINCIDENTE E QUE POSSUI CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS (ARTIGO 33, §§ 2º E 3º DO CP). RECURSO CONHECIDOS E NÃO PROVIDO DO RÉU CLAUDEMIR, COM FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE, POR MAIORIA DE VOTOS, O RECURSO DE PATRICK. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0001324-66.2021.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU HUMBERTO GONCALVES BRITO - J. 24.02.2023)APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO DO RÉU. CRIME DE RECEPTAÇÃO (ARTIGO 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). PRETENSA ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE CULPOSA. AVENTADO DESCONHECIMENTO DA ORIGEM ILÍCITA. INVIABILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS DO FATO CRIMINOSO QUE ATESTAM A PRESENÇA DO DOLO. RÉU QUE ADQUIRIU A MOTOCICLETA SABENDO SER PRODUTO DE ORIGEM CRIMINOSA. CONDENAÇÃO MANTIDA. CRIME DE ROUBO (ARTIGO 157, CAPUT, C/C ARTIGO 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS ACERCA DA AUTORIA DO CRIME. NÃO ACOLHIMENTO. RÉU DETIDO POR POPULARES EM RAZÃO DA FUGA INEXITOSA. VÍTIMA CONVICTA QUANTO À AUTORIA DELITIVA. PALAVRAS UNÍSSONAS, COERENTES E FIRMES CORROBORADAS PELOS DEPOIMENTOS DA AUTORIDADE POLICIAL RESPONSÁVEL PELA PRISÃO EM FLAGRANTE. ALEGADA AUSÊNCIA DE LIAME SUBJETIVO. VÍNCULO SUBJETIVO EVIDENCIADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. READEQUAÇÃO DA PENA-BASE. IMPOSSIBILIDADE. AVALIAÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS DO RÉU. CONDENAÇÃO POR FATO ANTERIOR, MAS COM TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR À DATA DO DELITO EM EXAME QUE PODE CARACTERIZAR MAUS ANTECEDENTES. PRECEDENTES. DOSIMETRIA ESCORREITA. CONCURSO MATERIAL DE DELITOS. SENTENÇA MANTIDA. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS EX OFFICIO EM SEDE RECURSAL. DEFENSOR DATIVO. CONSONÂNCIA COM TABELA PREVISTA NA RESOLUÇÃO CONJUNTA N. 015/2019-PGE/SEFA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM FIXAÇÃO EX OFFICIO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO DEFENSOR DATIVO PELA ATUAÇÃO RECURSAL. (TJPR - 4ª C.Criminal - 0067850-52.2016.8.16.0014 - Londrina - Rel.: Pedro Luis Sanson Corat - J. 23.07.2020) grifeiNo caso em comento, em que pese o argumento de que se trata de veículo “piseira”, é certo que foi adquirido por valor muito abaixo do preço de mercado, sem qualquer documentação, de pessoa desconhecida em um grupo de mensagens virtuais.A aquisição de um bem dessa natureza (veículo automotor) requer que o adquirente tenha as cautelas necessárias, sendo a verificação de sua procedência inerente ao adquirente de boa-fé.A presunção, portanto, é a de que o apelante tinha todos os meios para saber que o carro era produto de ato ilícito, porém não tomou nenhuma providência para saber da origem do bem.Sobre o conhecimento da ilicitude do veículo, bem ponderou a ilustre Procuradora de Justiça:“Na espécie, as circunstâncias levantadas não dão margem sequer à ocorrência de dúvida razoável. Ou seja, os elementos externos aos fatos, obtidos do conjunto probatório, demonstram que o apelado possuía pleno conhecimento acerca da origem ilícita do automóvel que adquiriu.Isso porque, repisa-se, o apelado: a) comprou o veículo de uma pessoa desconhecida, que encontrou na internet, não sabendo declinar seu nome; b) não portava os documentos do carro no momento da abordagem policial; e c) tinha conhecimento que o veículo era proveniente de “piseira”.Destarte, em que pesem os fundamentos do Douto Juízo a quo e da alegada ignorância dos fatos pelo apelado, é possível verificar que Gean teria total consciência da procedência ilícita do bem.”.Consigne-se, ainda, que a alegação de que se tratava de um carro com financiamento atrasado, portanto denominado “piseira”, era ônus da defesa em comprovar a veracidade dos argumentos, a teor do disposto no artigo 156 do Código de Processo Penal.Neste sentido:AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. RECEPTAÇÃO DOLOSA. ORIGEM ILÍCITA DO BEM. ELEMENTO SUBJETIVO. APRESENTADA MOTIVAÇÃO IDÔNEA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS PARA A CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CABE À DEFESA, PARA REFUTAR AS ALEGAÇÕES DA ACUSAÇÃO, APRESENTAR PROVAS CAPAZES DE DEMONSTRAR A ORIGEM LÍCITA DO OBJETO MATERIAL DO DELITO OU A AUSÊNCIA DO DOLO DO RÉU. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, "quando há a apreensão do bem resultante de crime na posse do agente, é ônus do imputado comprovar a origem lícita do produto ou que sua conduta ocorreu de forma culposa. Isto não implica inversão do ônus da prova, ofensa ao princípio da presunção de inocência ou negativa do direito ao silêncio, mas decorre da aplicação do art. 156 do Código de Processo Penal, segundo o qual a prova da alegação compete a quem a fizer. Precedentes" (AgRg no HC n. 446.942/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 04/12/2018, DJe 18/12/2018). 2. No caso, a Defesa não se desincumbiu de apresentar provas capazes de refutar a imputação delitiva, porquanto as instâncias ordinárias, mediante fundamentação idônea, demonstraram que embora os Agravantes não tenham sido encontrados exercendo a posse dos veículos produto de crime, eis que já haviam sido descartados em uma mata, restou devidamente comprovado nos autos que foram avistados, em mais de uma oportunidade, exercendo a posse dos bens. Desse modo, uma vez apresentada motivação idônea pelos Órgãos do Poder Judiciário de origem, não é possível, na estreita via do habeas corpus, concluir em sentido diverso, em razão do óbice ao amplo revolvimento fático-probatório dos autos. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no HC n. 700.369/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 10/10/2022.) grifeiPENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS, RECEPTAÇÃO, USO DE DOCUMENTO FALSO E FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. ILEGALIDADE DA BUSCA VEICULAR (ART. 244 DO CPP). MATÉRIA NÃO DEBATIDA NA CORTE DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. PENA-BASE. QUANTIDADE DO ENTORPECENTE. FUNDAMENTO VÁLIDO. APLICAÇÃO DO REDUTOR DO ART. 33,§ 4º, DA LEI N. 11.343/2006. MERA REITERAÇÃO DE PEDIDO JÁ EXAMINADO EM HABEAS CORPUS IMPETRADO ANTERIORMENTE. REGIME FECHADO ADEQUADO. AUSÊNCIA DE MANIFESTA ILEGALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O tema relativo à irregularidade da busca veicular não foi objeto de debate na Corte de origem. Portanto, é inviável o exame da questão diretamente por este Tribunal Superior, sob pena de indevida supressão de instância. 2. A pretensão de absolvição do crime descrito no art. 33, caput, da Lei n. 11.340/2006 não pode ser apreciada por esta Corte Superior de Justiça, na via estreita do habeas corpus, por demandar o exame aprofundado do conjunto fático-probatório dos autos (Precedente). 3. É firme o entendimento desta Superior Tribunal de Justiça, especificamente quanto ao crime de receptação, que, se o bem houver sido apreendido em poder da paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova. 4. Concluído pelas instâncias ordinárias, com amparo nas provas colhidas nos autos e nas circunstâncias do flagrante, que o paciente se valeu conscientemente de CRLV autêntico, mas com inserção de dados falsos, sem conseguir comprovar minimamente a versão de que havia recebido a documentação do veículo de terceiro que o contratou para fazer transporte da caminhonete, inviável o acolhimento do pleito defensivo - a fim de absolver o réu da prática do crime descrito no art. 304 c.c 299 do Código Penal -, por demandar reexame do conteúdo fático e probatório. 5. A teor do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, a quantidade e a natureza da droga apreendida são preponderantes sobre as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal e podem justificar a fixação da pena-base acima do mínimo legal, cabendo a atuação desta Corte apenas quando demonstrada flagrante ilegalidade no quantum aplicado. 6. Hipótese em que a pena-base foi exasperada em 3 anos acima do mínimo legal com fundamento na quantidade do entorpecente apreendido (aproximadamente 300 kg de maconha), o que não se mostra desproporcional, tendo em vista as penas mínima e máxima do delito de tráfico de drogas (5 a 15 anos). 7. Constitui óbice ao conhecimento do habeas corpus a mera reiteração de pedido já formulado e examinado por esta Corte Superior. Isso porque há identidade de partes e de causa de pedir (especificamente a aplicação do redutor do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006), impugnando ambos os feitos o mesmo acórdão. 8. Mantida a sanção em patamar superior a 8 anos de reclusão, inviável a fixação do regime prisional aberto ou semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, "a", do Código Penal. 9. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no HC n. 750.261/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 4/10/2022.) grifeiDeste modo, necessário o provimento do recurso ministerial para condenar Gean Ramos Nogueira Krewei da Silva nas sanções do artigo 180, “caput”, do Código Penal, cuja pena passo a dosar:Da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que a culpabilidade, entendida como juízo de reprovabilidade da conduta do réu, apresenta-se normal ao tipo em tela; o réu não conta com maus antecedentes; não há elementos para se aferir a conduta social e personalidade do réu; o motivo do crime é obtenção de lucro fácil, normal a espécie; as circunstâncias mostram-se normais a espécie do delito; as consequências naturais ao tipo delitivo; o comportamento da vítima não influenciou a prática criminosa.Considerando a ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena no mínimo previsto ao tipo, qual seja, 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.Inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes de pena.Inexistem causas especiais de aumento e diminuição de pena. Cabível o cumprimento da pena no regime aberto, de acordo as diretrizes do artigo 33, § 2º, letra "c".Viável a substituição da pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade em entidade a ser dirimida pelo Juízo da Execução pelo tempo da pena imposta.O réu não foi preso cautelarmente no presente processo. Assim, não há que se falar em detração, nos termos do artigo 387 do Código de Processo Penal.Diante das considerações feitas, conheço do recurso interposto pelo Ministério Público e dou-lhe provimento, nos termos do voto.
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