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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
I – RELATÓRIO Trata-se de dois embargos de declaração cível, opostos por E.P.O. (0074889-35.2022.8.16.0000 ED 1 e 0074954-30.2022.8.16.0000 ED 2), em face do acórdão proferido (mov. 33.1 e 39.1 dos respectivos recursos de agravo de instrumento) deste Colegiado, que, em síntese: a) reconheceu que eventual comunicação dos bens deverá ser considerada somente após comprovado o esforço comum (direto) dos cônjuges; b) determinou que as questões que exijam instrução probatória sejam decididas em autor; c) manteve a decisão no que se refere ao pedido de investigação da origem dos valores; d) manteve a decisão quanto a ilegitimidade recursal das enteadas do de cujus, Erica e Aline; e) manteve os bloqueios dos bens móveis, imóveis e recursos financeiros. Aponta a embargante E.P.O., em resumo: a) omissão e contradição interna, uma vez que o acórdão “(1) reconhece a aplicação do regime da separação legal de bens e da regra que exige a prova do “esforço comum” para a partilha, (2) reconhece a validade de doações entre cônjuges na constância do casamento e (3) reconhece que a prova do esforço comum e da validade das doações são questões de “alta indagação”, mas não decide expressamente a questão (havendo, portanto, omissão, concessa venia);” b) contrariamente a fundamentação, proclama o resultado do julgamento negando provimento ao recurso; c) “se foi reconhecido que a comunicação de bens depende do “esforço comum”, se foi dito que são válidas as doações entre os cônjuges na constância do casamento sob o regime da separação legal de bens, e se foi observado que a matéria controvertida pelos herdeiros, ora Embargados, exige a produção de prova complexa, a conclusão do silogismo só poderia ter sido no sentido de se autorizar a partilha dos bens em nome do “de cujus”, sem incluir no inventário o patrimônio exclusivamente titularizado pela viúva.”; d) com relação aos valores que formaram os superávits pagos pelo plano de previdência CENTRUS, aduz que a decisão foi contraditória, e que a melhor solução seria determinar ao juízo de origem a investigação dos valores; e) no que tange à manutenção do bloqueio de bens e da quebra dos sigilos bancários e fiscal da inventariante, assevera que o acórdão foi omisso, pois não se decidiu com precisão sobre a delimitação do inventário e, portanto, não deveria ter sido mantida a decisão, uma vez que não restou demonstrada a probabilidade do direito e do perigo de dano. Em contrarrazões, os embargados J.H.O.N., G.S.O., H.S.O., F.S.O. e H.O.J, afirmaram que a embargante pretende rediscutir matéria já debatida. Destarte, pretendem a manutenção integral do acórdão.É a breve exposição.
II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO 1. Admissibilidade do recurso Os embargos merecem ser conhecidos, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade[1]: são tempestivos, foram direcionados ao relator do acórdão impugnado e contêm indicação[2] do vício a ser sanado (artigo 1.022 do Código de Processo Civil[3]). O preparo é dispensado por lei. 2. Mérito 2.1 Considerações iniciais Os embargos de declaração configuram espécie recursal destinada, consoante dispõe o art. 1.022 da legislação processual civil, a expungir omissão, obscuridade, contradição ou erro material que, eventualmente, se encontrem presentes na decisão. Busca-se, dessa forma, um aprimoramento do ato judicial[4], a evitar que fique comprometida sua utilidade e eficácia. Dada a sua específica finalidade, não servem à rediscussão e modificação do decisum, consoante, aliás, já assentado pela jurisprudência, inclusive do próprio e. Supremo Tribunal Federal: “Não se prestam os embargos de declaração para rediscutir a matéria, com objetivo único de obtenção de excepcional efeito infringente para fazer prevalecer tese amplamente debatida e que, no entanto, restou vencida no Plenário”[5]. 2.2 Omissão, contradição e obscuridade Como se sabe, “considera-se omissa a decisão que deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento” ou a que “incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º[6]” (art. 1.022, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Já a contradição, que justifica o manejo de embargos de declaração, atente-se, é somente aquela entre os termos da própria decisão (interna), dificultando, assim, a compreensão do comando judicial. Nesse sentido, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça: “‘a contradição remediável por embargos de declaração, é aquela interna ao julgado embargado, a exemplo da grave desarmonia entre a fundamentação e as conclusões da própria decisão, capaz de evidenciar uma ausência de logicidade no raciocínio desenvolvido pelo julgador, ou seja, o recurso integrativo não se presta a corrigir contradição externa, bem como não se revela instrumento processual vocacionado para sanar eventual error in judicando’ (EDcl no HC 290.120/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Quinta Turma, julgado em 26/8/2014, DJe 29/8/2014)” (EDcl no AgInt no REsp 1.597.299/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, J. 23/05/2017, DJe 16/06/2017 – destaquei[7]). Obscuridade, a seu turno, decorre, conforme registra Daniel Amorim Assumpção Neves[8], “da falta de clareza e precisão da decisão, suficiente a não permitir a certeza jurídica a respeito das questões resolvidas”. Trata-se, pois, de texto dúbio, sem harmonia e organização interpretativa, que não ostenta compreensibilidade e, por isso, é de difícil ou impossível intelecção. 2.3. Do caso concreto No que tange a alegação de que o acórdão “(1) reconhece a aplicação do regime da separação legal de bens e da regra que exige a prova do “esforço comum” para a partilha, (2) reconhece a validade de doações entre cônjuges na constância do casamento e (3) reconhece que a prova do esforço comum e da validade das doações são questões de “alta indagação”, mas não decide expressamente a questão (havendo, portanto, omissão, concessa venia)”, cumpre esclarecer que o acórdão reconheceu expressamente que: a) eventual comunicação dos bens deverá ser considerada somente após comprovado o esforço do comum (direto) dos cônjuges; b) a controvérsia acerca da incomunicabilidade dos bens extrapola a finalidade do inventário e exige ampla análise fática e instrução probatória própria, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Destarte, o acórdão não decide expressamente acerca da comunicação e doação dos bens, por considerar que se trata de questão de alta indagação e que enseja dilação probatória, devendo ser dirimida nas vias originárias, evitando a morosidade e o tumulto processual no estreito procedimento do inventário. Com relação a manutenção da decisão no que se refere ao pedido de investigação da origem dos valores relativos aos superávits de 2014, 2015 e 2016 do Plano Básico de Benefícios - PBB da Centrus, não há que se falar em controvérsia, uma vez que se indeferiu a expedição de ofício, nos mesmos moldes da decisão proferida pelo juízo a quo, tendo em vista que não restou comprovada a contribuição da embargante. Por fim, no que se refere ao pedido de levantamento dos bloqueios de bens móveis, imóveis e recursos financeiros, além de fazer cessar a quebra de sigilo bancário e fiscal, consignou-se que a manutenção do bloqueio permaneceria até que seja melhor apurada as questões de alta indagação que deverão ser apuradas em autos próprios. Ainda que assim não fosse, não se pode cogitar de suposta imprescindibilidade de se refutar todos os argumentos apresentados – mormente se os fundamentos utilizados se mostrarem suficientes a embasar a decisão –, muito menos de se acolher embargos de declaração com o simples objetivo de prequestionamento de matérias já adequadamente analisadas. A esse respeito, assentaram os Tribunais Superiores: STF: “O Órgão Julgador não está obrigado a rebater pormenorizadamente todos os argumentos apresentados pela parte, bastando que motive o julgado com as razões que entendeu suficientes à formação do seu convencimento” (SS 4836 AgR-ED, Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI (Presidente), Tribunal Pleno, j. 07/10/2015, DJe 04/11/2015). STF: “O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão” (AI 791292 QO-RG, Relator Min. GILMAR MENDES, j. 23/06/2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJ 13/08/2010). STJ: “Não se configura a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, como lhe foi apresentada. Não é o órgão julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução” (REsp 1666277/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 29/06/2017). STJ: “O mero inconformismo da parte não constitui hipótese de cabimento de embargos de declaração, tampouco caracteriza vício no acórdão, não havendo a necessidade de oposição de embargos de declaração para fins de prequestionamento, se o tribunal ‘a quo’ analisou e decidiu de modo claro e objetivo as questões que delimitaram a controvérsia, o que afasta a incidência da Súmula 98/STJ” (REsp 1.252.397/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, J. 28/03/2017, DJe. 11/05/2017). Resulta, pois, que a Embargante, invocando vícios inexistentes, pretende a inadequada rediscussão do quanto já deliberado por esta Câmara no aresto recorrido, o que não é possível, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal: Não se revelam cabíveis os embargos de declaração quando a parte recorrente – a pretexto de esclarecer uma inexistente situação de obscuridade, omissão, contradição ou erro material (CPC, art. 1.022) – vem a utilizá-los com o objetivo de infringir o julgado e de, assim, viabilizar um indevido reexame da causa (STF: RE n. 1.009.386 AgR-ED/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, j. 19/06/2017, p. 26/06/2017) – Grifei. Em outras palavras, a impugnação por embargos de declaração se revela adequada, tão somente, à correção de erros de atividade, e não de erros de juízo. Mostra-se cabível – nas hipóteses previstas no artigo 1.022 do Código de Processo Civil (obscuridade, contradição, omissão ou erro material) – quando houver desempenho repreensível na atividade de emitir o julgamento ou de expressá-lo por escrito. Ao contrário, não é cabível os embargos de declaração quando, v.g., ocorrer eventual equívoco na aplicação da lei ao caso ou de adoção de entendimento jurisprudencial contrário ao pretendido pelo recorrente, situações nas quais deve a parte interpor recurso à superior instância. Além disso, dispõe o artigo 1.025 do Código de Processo Civil, in verbis: Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade. Por fim, observa-se tão somente a existência de contradição no dispositivo, uma vez que na fundamentação se acolheu, em parte, do recurso interposto, porém, erroneamente, do dispositivo constou a total improcedência dos pedidos. Nesse sentido, denota-se que a agravante E.P.O., no agravo de instrumento nº 0074954-30.2022.8.16.0000, pleiteou “sucessivamente, entendendo ser a prova documental insuficiente para, neste momento, analisar o mérito e dar provimento ou não ao recurso, requer seja decidido que as questões relativas aos bens existentes em nome da Agravante ao tempo da morte do autor da herança, bem como o número e a qualidade dos herdeiros do falecido, são questões complexas e de alta indagação, que deverão ser tratadas em autos próprios pelos eventuais interessados, reformando-se parcialmente r. decisão agravada, para o fim de limitar o inventário e o monte-mor partilhável aos bens efetivamente em nome do falecido na data do seu óbito.” , bem como que no agravo de instrumento nº 0074889-35.2022.8.16.0000, os agravantes J.H.O.N., G.S.O., H.S.O., F.S.O. e H.O.J., sustentaram que o entendimento jurisprudencial mais recente interpreta a Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, afastando a presunção do esforço comum, ao contrário do que entendeu o juízo a quo. Por outro lado, verifica-se, de fato, que erroneamente se assinalou: Diante do exposto, VOTO, pelo conhecimento parcial e não provimento do recurso interposto por E.P.O. (agravo nº 0074954-30.2022.8.16.0000) e conhecimento e não provimento do recurso interposto por J.H.O.N., G.S.O., H.S.O., F.S.O. e H.O.J. (agravo nº 0074889-35.2022.8.16.0000). Assim, é imperiosa a correção da contradição, a fim de que, no citado parágrafo, passe a constar: Diante do exposto, VOTO, pelo conhecimento parcial e provimento parcial do recurso interposto por E.P.O. (agravo nº 0074954-30.2022.8.16.0000) e conhecimento e parcial provimento do recurso interposto por J.H.O.N., G.S.O., H.S.O., F.S.O. e H.O.J. (agravo nº 0074889-35.2022.8.16.0000), a fim de que reformar a decisão recorrida no que se refere à necessidade de comprovação do esforço comum (direto) dos cônjuges, bem como para determinar que a controvérsia acerca da incomunicabilidade dos bens seja feita em autos próprios. Ante o exposto, voto por conhecer e dar parcial provimento aos presentes embargos de declaração, nos termos da fundamentação acima.
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