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Decisão monocrática
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 4ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 - E-mail: 4CC@tjpr.jus.br Autos nº. 0035990-31.2023.8.16.0000 Recurso: 0035990-31.2023.8.16.0000 AI Classe Processual: Agravo de Instrumento Agravante(s): ESTADO DO PARANÁ Agravado(s): FELOMENA ZIROLDO COSTA DA SILVA DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALEGADO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO COM A UNIÃO. MEDICAMENTO. DERMATITE ATÓPICA GRAVE. FÁRMACO NÃO CONTEMPLADO NA RENAME PARA REFERIDA DOENÇA. AUSÊNCIA DE PCDT. INCIDÊNCIA DA TESE FIRMADA NO IAC Nº 14 DO STJ E DA TUTELA PROVISÓRIA DEFERIDA NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 1.366.243. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO POLO PASSIVO. MANTIDA A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. ART. 932, IV, C, DO CPC RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. Vistos e examinados estes autos de Agravo de Instrumento nº 0035990-31.2023.8.16.0000, da Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Claro, em que é agravante o Estado do Paraná e agravada Felomena Ziroldo Costa da Silva. I – RELATÓRIO 1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto da decisão de mov. 12.1, proferida nos autos de “ação de obrigação de fazer com pedido liminar de tutela antecipada para fornecimento gratuito de medicamento” ajuizada por Felomena Ziroldo Costa da Silva em face do Estado do Paraná, que deferiu tutela urgente nos seguintes termos: “2. Ante o exposto, presentes os requisitos de lei, DEFIRO a tutela de urgência para determinar o fornecimento à autora pela ré de forma contínua até final julgamento da demanda ou até o término do tratamento, do medicamento Upadacitinibe 15mgnos moldes prescritos no documento de mov. 1.11, sob pena de multa diária que arbitro em R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada, inicialmente, em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a ser revertido em favor da parte autora. Concedo prazo de 5 (cinco) dias para cumprimento da decisão. Transcorrido o prazo fixado, a multa passará a incidir automaticamente, perdurando a sua incidência até o cumprimento da obrigação ou até que se atinja o limite estabelecido para a astreinte.” 2. Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (mov. 26.1). 3. O Estado do Paraná sustenta que “em demandas judiciais que possuem medicamentos incorporados como objeto, deve-se observar os critérios de repartição de competências no SUS”, sendo que o fármaco pleiteado se encontra contemplado no Grupo 1A do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica e, como tal, é de responsabilidade da União o seu fornecimento. Desse modo, defende a inclusão da União no polo passivo e a remessa do processo à Justiça Federal. 4. Pugna pela concessão de efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso. É a exposição. II – FUNDAMENTAÇÃO 5. De início, observa-se que embora o medicamento pleiteado esteja incluído na RENAME, não está contemplado especificamente para a doença que acomete a recorrida (Dermatite Atópica Grave, CID 10 – L20.9), moléstia que até o momento não conta com Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas (https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/protocolos-clinicos-e- diretrizes-terapeuticas-pcdt). 6. Ou seja, a controvérsia diz respeito a medicamento não padronizado no SUS para a doença que acomete a ora recorrida. 7. Nessas circunstâncias, acerca da aventada necessidade de intervenção da União no feito, cumpre observar recente entendimento firmado pelo STJ no Incidente de Assunção de Competência nº 14: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. DIREITO À SAÚDE. DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO AO SUS. REGISTRO NA ANVISA. TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL. SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO. OCORRÊNCIA. INTERESSE JURÍDICO DA UNIÃO. EXAME. JUSTIÇA FEDERAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL. COMPETÊNCIA. (...) 7. Embora seja possível aos entes federais organizarem-se de maneira descentralizada com relação às políticas públicas na área da saúde, essa organização administrativa não afasta o dever legal de o Estado (latu sensu) assegurar o acesso à medicação ou ao tratamento médico a pessoas desprovidas de recursos financeiros, em face da responsabilidade solidária entre eles. Em outras palavras, a possibilidade de o usuário do SUS escolher quaisquer das esferas de poder para obter a medicação e/ou os insumos desejados, de forma isolada e indistintamente - conforme ratificado pelo próprio STF no julgamento do Tema 793 -, afasta a figura do litisconsórcio compulsório ou necessário, por notória antinomia ontológica. 8. A dispensação de medicamentos é uma das formas de atender ao direito à saúde, que compõe a esfera dos direitos fundamentais do indivíduo, mas não é, em si, o objeto principal da obrigação de prestar assistência à saúde de que trata o art. 196 da Constituição Federal. 9. As regras de repartição de competência administrativa do SUS não devem ser invocadas pelos magistrados para fins de alteração do polo passivodelineado pela parte no momento do ajuizamento da demanda, mas tão somente para redirecionar o cumprimento da sentença ou de determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente, nos termos do decidido no julgamento do Tema 793 do STF. 10. O julgamento do Tema 793 do STF não modificou a regra de que compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas (Súmula 150 do STJ), bem como de que não cabe à Justiça estadual reexaminar a decisão, manifestando-se contrariamente (Súmula 254 do STJ). 11. Quanto ao ônus financeiro da dispensação do medicamento, insumos e tratamentos médicos, nada impede que o ente demandado se valha do estatuído no art. 35, VII, da Lei n. 8.080/1990, que prevê a possibilidade de "ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo"caso, ao final, demonstre não ser sua a atribuição para o fornecimento do fármaco, assim como do disposto nos arts. 259, parágrafo único, 285 do Código Civil/2002 e 23 do Decreto n. 7.508/2011. 12. Ainda que haja entraves burocráticos para o ressarcimento, a solução para o problema não é transferir a demanda para a Justiça Federalem situações em que isso não é cabível, ao arrepio da legislação processual civil e da Constituição Federal, sob pena de impor diversos obstáculos ao paciente que depende de fármaco e/ou tratamento médico urgente para evitar o agravamento de sua doença ou até mesmo o risco de morte. 13. Quando o magistrado determinar que a obrigação de fornecer medicamento fora da lista do SUS seja cumprida por determinado ente público, nada impede que, posteriormente, reconheça-se a possibilidade de ressarcimento por outro , caso se entenda ser deste último o dever de custeio. Precedente do STJ. 14. A jurisprudência desta Corte, consolidada no REsp n. 1.203.244/SC, no sentido de inadmitir o chamamento ao processo dos demais devedores solidários em demandas de saúde contra o SUS, na forma do art. 130 do CPC/2015, deve ser mantida, exceto se houver posterior pronunciamento do STF em sentido contrário. 15. Solução do caso concreto: na hipótese, a parte autora escolheu litigar contra o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Vacaria. Contudo, o Juiz estadual determinou a remessa dos autos à Justiça Federal, por entender que a União deve figurar no polo passivo da demanda, sem que haja nenhuma situação de fato ou de direito que imponha a formação de litisconsórcio passivo necessário, de modo que a ação deve ser processada na Justiça estadual. 16. Tese jurídica firmada para efeito do artigo 947 do CPC/2015: a) Nas hipóteses de ações relativas à saúde intentadas com o objetivo de compelir o Poder Público ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na dispensação de medicamentos não inseridos na lista do SUS, mas registrado na ANVISA, deverá prevalecer a competência do juízo de acordo com os entes contra os quais a parte autora elegeu demandar; b) as regras de repartição de competência administrativas do SUS não devem ser invocadas pelos magistradospara fins de alteração ou ampliação do polo passivo delineado pela parte no momento da propositura da ação, mas tão somente para fins de redirecionar o cumprimento da sentença ou determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente, não sendo o conflito de competência a via adequada para discutir a legitimidade ad causam, à luz da Lei n. 8.080/1990, ou a nulidade das decisões proferidas pelo Juízo estadual ou federal, questões que devem ser analisada no bojo da ação principal. c) a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da CF/88, é determinada por critério objetivo, em regra, em razão das pessoas que figuram no polo passivo da demanda (competência ratione personae), competindo ao Juízo federal decidir sobre o interesse da União no processo (Súmula 150 do STJ), não cabendo ao Juízo estadual, ao receber os autos que lhe foram restituídos em vista da exclusão do ente federal do feito, suscitar conflito de competência (Súmula 254 do STJ). 17. Conflito de competência conhecido para declarar competente para o julgamento da causa o Juízo de Direito do Juizado Especial Cível Adjunto da Comarca de Vacaria/RS. (CC n. 187.276/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 18/4 /2023.) 8. Por sua vez, assim decidiu o STF em sede de tutela provisória incidental no Recurso Extraordinário com repercussão geral nº 1.366.243: “O Tribunal, por unanimidade, referendou a decisão proferida em 17.4.2023, no sentido de conceder parcialmente o pedido formulado em tutela provisória incidental neste recurso extraordinário, "para estabelecer que, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a atuação do Poder Judiciário seja regida pelos seguintes parâmetros: (i) nas demandas judiciais envolvendo medicamentos ou tratamentos padronizados: a composição do polo passivo deve observar a repartição de responsabilidades estruturada no Sistema Único de Saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência, cabendo ao magistrado verificar a correta formação da relação processual, sem prejuízo da concessão de provimento de natureza cautelar ainda que antes do deslocamento de competência, se o caso assim exigir; (ii) nas demandas judiciais relativas a medicamentos não incorporados: devem ser processadas e julgadas pelo Juízo, estadual ou federal, ao qual foram direcionadas pelo cidadão, sendo vedada, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a declinação da competência ou determinação de inclusão da União no polo passivo; (iii) diante da necessidade de evitar cenário de insegurança jurídica, esses parâmetros devem ser observados pelos processos sem sentença prolatada; diferentemente, os processos com sentença prolatada até a data desta decisão (17 de abril de 2023) devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução (adotei essa regra de julgamento em: RE 960429 ED-segundos Tema 992, de minha relatoria, DJe de 5.2.2021); (iv) ficam mantidas as demais determinações contidas na decisão de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário". Tudo nos termos do voto do Relator. Plenário, Sessão Virtual Extraordinária de 18.4.2023 (00h00) a 18.4.2023 (23h59).” (destacou-se) 9. Portanto, a pretensão recursal encontra-se dissonante da tese firmada pelo STJ no IAC nº 14 e da tutela deferida no RE nº 1.366.243. III – DECISÃO 10. Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento, nos termos do art. 932, IV, c, do CPC. Publique-se. Curitiba, 06 de junho de 2023. DES. CLAYTON MARANHÃO Relator
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