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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
RELATÓRIOTrata-se de apelações cíveis interpostas contra a r. sentença de mov. 35.1, proferida nos autos de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais nº 0065194-15.2022.8.16.0014, por meio da qual o MM. Juiz de Direito julgou procedentes os pedidos iniciais, para o fim de determinar que a parte ré reestabeleça o limite de crédito para R$ 7.200,00 (sete mil e duzentos reais), conforme inicialmente disponibilizado à parte autora, bem como condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), “corrigidos monetariamente pelos índices oficiais da contadoria da data da sentença, até efetivo pagamento, além de juros de mora de 1% ao mês desde a citação, por se tratar de ilícito contratual”.Em razão da sucumbência, a parte ré foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação.Inconformado, SIDINEI PAULINO TORRES DIAS sustentou, nas razões recursais (mov. 38.1), em síntese, que o valor fixado a título de danos morais deve ser majorado, observando-se os “princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do caráter pedagógico da indenização”.Requereu, ao final, o provimento do recurso, a fim de que seja majorado o quantum indenizatório.Também irresignado, o BANCO BRADESCO S/A, interpôs apelação, alegando, nas razões recursais (mov. 42.1), em suma, que: a) não houve qualquer ato ilícito praticado pelo banco, uma vez que há previsão expressa no regulamento de cartões sobre a possibilidade de alteração do limite de crédito a qualquer momento pelo credor; b) “a redução do limite de crédito pode ocorrer por restrições no CPF do autor, conta sem utilização por mais de 60 dias, reavaliação feita pelo sistema periodicamente, podendo ser alterado a qualquer tempo”; c) dos extratos juntados pelo autor é possível perceber que a conta corrente se mantém com saldo negativo por longos períodos e por diversos meses, condição que pode ter ocasionado a reavaliação do crédito pelo sistema; d) “verifica-se das faturas que houve regular utilização do serviço, não sendo constatado qualquer período em que o autor tenha ficado impossibilitado de utilizar o seu cartão”; e) o autor deixou de demonstrar qual seria o constrangimento suportado em razão da redução do limite; f) “não há como alegar que sofreu dano ao não possuir limite para determinada compra (que sequer foi detalhada nos autos, não passando de alegação genérica), pois tinha conhecimento acerca do seu limite de crédito”; g) o autor não deixou de efetuar compras, tanto é que manteve seu padrão de consumo nos dois meses em que teve seu limite reduzido; h) deve ser afastada a indenização por danos morais, pois não se trata de dano in re ipsa; i) “não há na peça inicial qualquer fato relevante, qualquer alegação concreta de dano decorrente de ato praticado pelo réu. Ora, se a situação narrada não deu causa a situação constrangedora, como no caso dos autos, não gerou qualquer prejuízo”; j) a redução do limite não configura situação vexatória, “tendo em vista que o ato é direcionado única e exclusivamente à pessoa, sem qualquer caráter de publicidade”, ainda mais por não restar demonstrada qualquer negativa de compra no período reclamado, tendo o autor mantido seu padrão de consumo. Ao final, requereu o provimento do recurso, para reformar a sentença, julgando-se improcedentes os pedidos iniciais.Com as contrarrazões (movs. 43.1 e 46.1) vieram os autos conclusos.É o relatório.
VOTOPresentes os pressupostos de admissibilidade, os recursos devem ser conhecidos.O autor ajuizou a presente ação, alegando, que, imotivadamente e sem comunicação prévia, foi surpreendido com a redução do limite do seu cartão de crédito, que de R$ 7.200,00 (sete mil e duzentos reais) passou para R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais). Afirmou que “a ação tomada pelo réu, qual seja de reduzir o limite serviço de cartão de crédito, pegou o autor de surpresa, fazendo com que este fosse constrangido junto a estabelecimentos comercias ante a recusa da liberação de compras”.Por tais razões, requereu o restabelecimento do limite de R$ 7.200,00 e a condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais.Na contestação (mov. 14.1), o banco defendeu a inocorrência de ato ilícito. Esclareceu que “a redução do limite de crédito pode ocorrer por restrições no CPF do autor, conta sem utilização por mais de 60 dias, reavaliação feita pelo sistema periodicamente, podendo ser alterado a qualquer tempo” e, que, dos extratos juntados pelo autor, é possível perceber que a sua conta corrente se mantém com saldo negativo desde agosto, “condição que pode ter ocasionado a reavaliação do crédito pelo sistema”. Afirmou, ainda, que o autor não ficou impossibilitado de utilizar o cartão, que o seu padrão de consumo não foi afetado com a alteração do limite e “que é um direito do credor que possui autonomia para reavaliar periodicamente o perfil de crédito dos seus clientes”.Na sentença, o magistrado julgou procedentes os pedidos iniciais, considerando que, diante da ausência de prévia notificação à parte autora, houve “evidente falha na prestação de serviços da instituição bancária, ensejando no dever de indenização a título de danos morais” (mov. 35.1). De fato, a ausência de prévia notificação a respeito da redução do limite de crédito configura evidente falha na prestação do serviço. É que, mesmo que seja possível à instituição financeira reduzir o limite de crédito a qualquer tempo, em virtude de alguma situação que altere negativamente o perfil de crédito do cliente, como, por exemplo, saldo negativo na conta corrente, para tanto é indispensável a notificação prévia ao consumidor, diante do princípio da boa-fé, bem como do direito de informação e transparência, previstos nos artigos 4º e 6º, III, 52, do CDC.Com efeito, a obrigação de informação, prevista no CDC, deve ser cumprida não só no início da relação contratual, mas durante toda a sua vigência. A par disso, diante da confiança, que é uma vertente do princípio da boa fé e também ligada ao princípio da transparência, que gera credibilidade quanto ao cumprimento das cláusulas contratuais, não se admite a alteração do limite crédito concedido no cartão de crédito, sem a prévia notificação do consumidor.Tanto que o próprio “Resumo do Regulamento da Utilização dos Cartões de Crédito – Aplicável à Pessoa Física” trazido pelo réu na contestação (mov. 14.3), prevê a necessidade de prévia notificação. Confira-se:Portanto, não assiste razão ao banco apelante nesse ponto, estando escorreita a sentença que reconheceu a falha na prestação do serviço pelo banco, ante a ausência de prévia notificação do consumidor acerca da redução do limite de crédito.Por outro lado, quanto à indenização por danos morais, com razão a instituição financeira, uma vez que a compensação somente é possível quando devidamente comprovada a violação dos direitos da personalidade, o que não ocorreu na espécie. Muito embora já tenha decidido no sentido de que o encerramento do contrato – bloqueio do cartão de crédito - sem a devida notificação da parte consumidora causa abalo moral presumido, a exemplo do julgado mencionado pelo autor na petição inicial e nas contrarrazões (Apelação Cível nº 0039054-12.2020.8.16.0014[1]), revejo o posicionamento para me adequar ao entendimento que atualmente prevalece nesta Corte a respeito do tema, notadamente porque o dano não decorre do próprio fato, sendo imprescindível a demonstração efetiva de algum dano à personalidade. Além disso, a hipótese em apreço diverge daquela retratada no julgado de minha relatoria, porquanto naquele julgado houve o encerramento/bloqueio abrupto do cartão de crédito, impossibilitando a parte da efetiva utilização dos serviços de crédito, enquanto que na hipótese dos autos houve apenas a redução do limite de crédito, circunstância que não configura dano in re ipsa.Nesse sentido, destacam-se os seguintes julgados desta Corte em casos semelhantes:APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. 1. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. INOCORRÊNCIA. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS CAPÍTULOS DA SENTENÇA (CPC, ART. 1.010, III). RECURSO CONHECIDO. 2. REDUÇÃO DO LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE. 1. (...) 2. A redução unilateral de limite do cartão de crédito, sem comunicação prévia a seu titular, não implica dano moral in re ipsa. “A configuração do dano moral pressupõe uma grave agressão ou atentado a direito da personalidade, capaz de provocar sofrimentos e humilhações intensos, descompondo o equilíbrio psicológico do indivíduo por um período de tempo desarrazoado”. (STJ – AgInt no REsp 1655465/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24/04/2018, DJe 02/05/2018). 3. Recurso conhecido e não provido. (TJPR - 15ª Câmara Cível - 0005436-50.2021.8.16.0173 - Umuarama - Rel.: SUBSTITUTO JOSE RICARDO ALVAREZ VIANNA - J. 19.09.2022)APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO – LIMITE ALTERADO PARA MENOR COM POSTERIOR CANCELAMENTO DO CONTRATO - SENTENÇA QUE JULGA IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL, AFASTANDO O DANO MORAL – INSURGÊNCIA DA AUTORA. PRELIMINAR EM CONTRARRAZÕES - OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – NÃO VERIFICADA – RECURSO QUE DEBATE OS PRINCIPAIS ARGUMENTOS DA SENTENÇA – RECURSO CONHECIDO. DANO MORAL NÃO EVIDENCIADO – REDUÇÃO UNILATERAL DE LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO - AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO PRÉVIA – DANO EM RE IPSA NÃO CARACTERIZADO - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO ABALO MORAL E/OU PSÍQUICO QUE JUSTIFIQUE A COMPOSIÇÃO PECUNIÁRIA DO PREJUÍZO IMATERIAL - SENTENÇA MANTIDA - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS AO PATAMAR 15% SOBRE O VALOR DA CAUSA NOS TERMOS DO ART. 85, § 11 DO CPC – EXIGIBILIDADE, CONTUDO, SUSPENSA, ANTE A GRATUIDADE DA JUSTIÇA JÁ CONCEDIDA. Recurso conhecido e desprovido.(TJPR - 14ª Câmara Cível - 0012392-36.2019.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR FERNANDO ANTONIO PRAZERES - J. 22.03.2021)No presente caso, embora o autor alegue na petição inicial que foi “constrangido junto a estabelecimentos comercias ante a recusa da liberação de compras”, deixou de comprovar essa alegação. A par disso, das faturas do cartão acostadas aos autos (mov. 14.2), é possível perceber que não houve qualquer alteração no padrão de consumo do autor, mesmo nos meses em que houve a redução do limite. Ainda, depreende-se que os gastos efetuados no cartão variaram de R$ 282,87 (vencimento em 18/04/2022) a, no máximo, R$ 1.685,11 (vencimento em 18/10/2022), valores muito aquém do limite – reduzido – de R$ 3.600,00.Ademais, a parte se limitou a alegar que “o constrangimento causado pela negativa de compras, ocorrida pela ausência de conhecimento do autor das modificações contratuais unilaterais provocadas pelo réu, também enseja a condenação em danos morais in re ipsa”, sem, contudo, demonstrar qualquer ofensa ou lesão à sua honra e personalidade.Diante desse quadro, não resta configurado o dano moral, devendo ser reformada a sentença nesse aspecto. Com isso, fica prejudicado o recurso de apelação interposto pela parte autora, o qual visava apenas a majoração do quantum indenizatório. Com o parcial provimento do recurso interposto pela instituição financeira (afastamento dos danos morais), a sucumbência deve ser redistribuída, cabendo às partes, na forma pro rata (50%) arcarem com o pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, ora fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já considerado o trabalho adicional recursal, a serem suportados na mesma proporção, observando-se, entretanto, a concessão da gratuidade da justiça ao autor (mov. 7.1).Com essas considerações, CONHEÇO E DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto pela instituição financeira, para o fim de afastar a condenação por danos morais, com a redistribuição da sucumbência; e julgo PREJUDICADO o recurso interposto pela parte autora, nos termos da fundamentação.É como voto.
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