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Decisão monocrática
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 - E-mail: camaracivel18@tjpr.jus.br Recurso: 0020829-10.2025.8.16.0000 AI Classe Processual: Agravo de Instrumento Assunto Principal: Imissão na Posse Agravante(s): POTIRA MARQUES BRITES MAYKO MARQUES BRITES Agravado(s): ROGERIO ZILIOTTO EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de justiça gratuita formulado pelos agravantes em ação de imissão de posse. Os agravantes alegam hipossuficiência econômica, apresentando documentos que demonstrariam sua incapacidade de arcar com as custas processuais, mas a decisão recorrida não reconheceu essa condição. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se os agravantes preenchem os requisitos necessários para a concessão da justiça gratuita, considerando a alegada insuficiência de recursos financeiros. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os agravantes não demonstraram a real hipossuficiência econômica necessária para a concessão da justiça gratuita, apresentando movimentações financeiras que indicam capacidade de arcar com as custas processuais. 4. A análise dos documentos apresentados pelos agravantes não comprova a alegação de pobreza na acepção jurídica do termo, conforme previsto na legislação. 5. O benefício da gratuidade judiciária deve ser concedido apenas àqueles que comprovadamente não dispuserem de recursos para custear o processo, o que não se aplica aos agravantes. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: A concessão da gratuidade da justiça depende da comprovação efetiva da hipossuficiência econômica, sendo insuficiente a mera declaração de pobreza, devendo o juiz exigir documentação que comprove a impossibilidade de arcar com as custas processuais sem comprometer o sustento próprio e de sua família. ____________ Dispositivos relevantes citados: CR/1988, art. 5º, LXXIV; CPC/2015, arts. 98, 99, § 2º e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, RESP 1148296/SP, REL. MIN. LUIZ FUX, J. 01.09.2010; STJ, AI 1654496-0, REL. ESPEDITO REIS DO AMARAL, 18ª C.C, J. 06/04/2017; SÚMULA Nº 568/STJ. VISTOS e relatados estes autos de Agravo de Instrumento nº 0020829-10.2025.8.16.0000, da 11ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que são Agravantes MAYKO MARCOS BRITES E POTIRA MARQUES BRITES MARTINS e Agravado ROGERIO ZILIOTTO. I – RELATÓRIO Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 11ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba que, nos autos de ação de imissão de posse nº. 0026408- 72.2021.8.16.0001, indeferiu o pedido de justiça gratuita formulado pelos agravantes (mov. 185.1). Inconformados, os requeridos interpuseram o presente recurso, em cujas razões sustentam, em síntese: a) que a análise da capacidade financeira dos agravantes deve ser realizada à luz do conceito de pobreza na acepção jurídica do termo, conforme previsto na Lei nº 1.060/1950. Essa legislação estabelece que a assistência judiciária gratuita deve ser concedida àqueles que não possuem recursos suficientes para arcar com as despesas processuais sem comprometer o sustento próprio e de suas famílias. No presente caso, os documentos apresentados pelos agravantes são claros ao demonstrar essa insuficiência de recursos; b) que Potira Marques Brites, (docs. movs. 182) que trabalha como auxiliar de cozinha, possui um salário bruto de R$ 2.054,76. Deste valor, uma parte significativa é destinada a despesas fixas, como aluguel de R$ 600,00, energia elétrica, internet e saneamento, totalizando um montante considerável que reduz substancialmente sua capacidade financeira. Além disso, é necessário considerar outras despesas essenciais, como alimentação, vestuário e transporte, que não foram detalhadas, mas são inevitáveis e impactam diretamente no orçamento família; c) que Mayko Marques Brites, por sua vez, trabalha informalmente como ajudante de pedreiro, com uma renda média de um salário mínimo. A informalidade de sua ocupação já indica uma instabilidade financeira, agravada pela ausência de comprovação de rendimentos fixos e pela declaração de isenção de imposto de renda (docs. movs. 182), que reforça sua condição de hipossuficiência econômica. Os extratos bancários apresentados corroboram essa situação, evidenciando a limitação de recursos disponíveis; d) que os agravantes demonstraram, por meio de documentação idônea, sua condição de hipossuficiência econômica. Potira Marques Brites, com um salário bruto de R$ 2.054,76, enfrenta despesas fixas significativas, como aluguel e contas básicas, que comprometem substancialmente sua renda mensal. Mayko Marques Brites, por sua vez, trabalha informalmente como ajudante de pedreiro, com rendimentos que não ultrapassam um salário mínimo nacional, conforme comprovado por extratos bancários e declaração de isenção de imposto de renda. Esses dados evidenciam que os agravantes são, de fato, pobres na acepção jurídica do termo, não possuindo condições de arcar com as custas processuais sem comprometer seu sustento e o de suas famílias; e) que ao desconsiderar essa realidade, a decisão judicial em questão impõe uma barreira intransponível ao acesso dos agravantes ao Judiciário. A exigência de custas processuais, sem a devida análise da real capacidade financeira das partes, inviabiliza o exercício pleno do direito de defesa, essencial para a garantia de um processo justo e equitativo. O princípio da razoabilidade, mencionado na decisão, deve ser aplicado de forma a não obstruir o acesso à justiça, mas sim a promovê-lo, assegurando que aqueles que realmente necessitam do benefício da assistência judiciária gratuita possam usufruí-lo; f) que, portanto, a decisão recorrida não apenas desconsidera a situação econômica dos agravantes, mas também viola direitos fundamentais garantidos constitucionalmente. O acesso à justiça não pode ser um privilégio de poucos, mas um direito de todos, especialmente daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade econômica. É imperativo que o Judiciário atue como garantidor desse direito, promovendo a justiça social e a igualdade de condições no acesso aos mecanismos judiciais; g) que é imperativo que o caráter social da assistência judiciária gratuita seja respeitado, garantindo que aqueles que realmente necessitam do benefício possam acessar o Judiciário sem comprometer suas condições básicas de vida. A decisão de indeferir o pedido dos agravantes, sem uma análise criteriosa de sua situação econômica, desvirtua a função inclusiva do sistema judiciário, devendo, portanto, ser revista para assegurar a justiça e a equidade no acesso aos direitos fundamentais. Por tais razões, pugnaram pelo conhecimento e provimento do recurso para o fim de conceder os benefícios da assistência judiciária gratuita (mov. 1.1). Intimados para comprovarem a alegada insuficiência de recursos, sob pena de indeferimento do benefício da justiça gratuita (mov. 11.1), acostaram documentos no mov. 15.1/15.10. É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Conforme disposto na Súmula 568 do Superior Tribunal de Justiça, o relator monocraticamente poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema. Por outro lado, no REsp 1148296/SP, de Relatoria do Ministro Luiz Fux e julgado em 01/09/2010, restou fixada a necessidade de intimação da parte contrária para responder ao agravo quando a nova decisão modificar a situação de fato causando prejuízo a parte contrária. Entretanto, a decisão que defere ou não a concessão da benesse da justiça gratuita afeta tão somente a parte que o requer, no presente caso, os agravantes, de modo que desnecessária a intimação do agravado, uma vez que tal decisão não lhe causa prejuízo algum e, consequentemente, não há ofensa ao princípio do contraditório. Pois bem, o instituto da gratuidade da justiça possui previsão constitucional, sendo também disciplinado pela Lei nº. 1.060/50. Eis o que dispõe o inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal: LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; Por sua vez, o artigo 99, § 3º do CPC prevê que se presume verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Dessa maneira e como já reiteradamente decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, em se tratando da concessão da gratuidade judiciária, o entendimento é no sentido de que basta a simples declaração do autor afirmando a sua hipossuficiência para que seja deferido o benefício, ressalvado ao juiz exigir do interessado que comprove documentalmente a sua impossibilidade de fazer frente ao pagamento das despesas. Aliás, o § 2º do artigo 99 do CPC diz que o Juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade. O Código de Processo Civil, ao seu turno, dispõe que a pessoa natural ou jurídica, com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios tem direito à gratuidade judiciária (art. 98) e que se presume verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural (art. 99, § 3º). As normas infraconstitucionais devem ser interpretadas em conformidade com a Constituição. E uma análise sistemática dos aludidos dispositivos permite a conclusão de que a concessão do benefício exige a comprovação dos seus pressupostos legais, isto é, a impossibilidade da parte em custear o processo sem prejuízo do sustento próprio e de sua família. Por outro lado, a aplicação do instituto da gratuidade judiciária não pode estar dissociada da realidade que a rodeia, exigindo do magistrado uma abordagem multifacetada, pragmática, que considere também o seu resultado prático. Nesse contexto, a exigência de comprovação da insuficiência de recursos para além da mera aceitação da declaração de pobreza, além de harmonizar- se à Constituição evita o desvirtuamento do instituto, em evidente prejuízo ao erário. Registre-se que o Novo Código de Processo Civil conferiu à parte prerrogativas menos onerosas de custeio do processo, a exemplo do parcelamento das custas processuais (art. 98, § 6º). Além disso, permitiu ao juiz conceder o benefício somente em relação a algum ato específico (art. 98, § 5º). Assim, o benefício da gratuidade judiciária integral, tal qual postulado, deverá ser concedido somente àqueles que comprovadamente não dispuserem de recursos para promover o custeio do processo. Primeiramente, salienta-se que não demonstrando a real miserabilidade, não comprovado efetivamente a sua hipossuficiência e não sendo irregular que o Magistrado, não se convencendo, de plano, sobre a sinceridade da alegação de pobreza, exija outros elementos documentais para que se comprove a afirmação. Desta feita, devem os recorrentes estarem ciente a respeito da possibilidade de o Magistrado requerer a juntada de documentos que comprovem a necessidade da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Retornando-se à espécie, verifica-se que os agravantes não preenchem os requisitos necessários para o deferimento da justiça gratuita. Verifica-se que o recorrente não possui emprego formal, todavia alegou que sua renda média é de 1 salário-mínimo. Ora, pela análise dos extratos bancários desatualizados (mov. 15.7, 15.9 e 15.10), pode-se dizer que o recorrente não percebe somente tal valor, pois existe grande movimentação financeira de valores significantes, tendo no mês entradas de quase R$ 7.000,00. Ainda, pelos seus gastos em seus extratos, tais despejas não demonstram incapacidade financeira, pois o simples pagamento de despesas mensais não tem relevância para a configuração da miserabilidade: se as possui, é porque ostenta condições financeiras de com elas arcar. A recorrente deixou de juntar extratos bancários. Poder-se-ia alegar que a renda dos agravantes está integralmente comprometida, no entanto tal alegação não pode ser acolhida como parâmetro de pobreza, na acepção jurídica do termo. Dessa forma, os documentos acostados demonstram que os recorrentes possuem condições de arcar com o pagamento das custas processuais. Nesse sentido: DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. OBRIGAÇÃO ADIMPLIDA. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. INDEFERIMENTO E RESSALVA QUANTO À POSSIBILIDADE DE PARCIAL DEFERIMENTO OU DE PARCELAMENTO. SITUAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA NÃO DEMONSTRADA EFETIVAMENTE. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM. COMPROVAÇÃO DA ALEGADA HIPOSSUFICIÊNCIA OPORTUNIZADA E NÃO ATENDIDA A CONTENTO. PERSUASÃO RACIONAL DO MAGISTRADO NA VALORAÇÃO DAS PROVAS. PRECEDENTES DO STJ. INTELIGÊNCIA DO ART. 932, III, ALÍNEA B DO CPC/2015. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (Decisão Monocrática – AI 1654496-0 – Rel. Espedito Reis do Amaral – 18ª C.C – julgado em 06/04/2017) (sublinhei). Nota-se, ainda, que deixaram de acostar demais documentos solicitados no mov. 11.1, tais como, extratos bancários pela agravante Potira, certidões, entre outros, que pudessem corroborar com as suas alegações. Logo, o benefício da gratuidade judiciária integral, tal qual postulado, deverá ser concedido somente àqueles que comprovadamente não dispuserem de recursos para promover o custeio do processo, o que não é o caso dos agravantes. Por isso, impõe-se a manutenção de seu indeferimento pelo Juízo singular. III – DECISÃO Face ao exposto, monocraticamente e com fundamento na Súmula 568 do Superior Tribunal de Justiça, nego provimento ao recurso, mantendo-se a decisão agravada, nos termos da fundamentação. Comunique-se o Juízo de origem. Publique-se. Intimem-se. Curitiba, 16 de abril de 2025. Des. MARCELO GOBBO DALLA DEA Relator
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