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Número: 287
Assunto: 1.Regulamentação 2.Foro Judicial 3.Criança e Adolescente 4.Depoimento Especial 5.Procedimento Afeto
Data: 2019-02-01 00:00:00.0
Diário: 2428
Situação: VIGENTE
Ementa: Art. 1º Regulamentar os procedimentos afetos ao depoimento especial no Poder Judiciário do Estado do Paraná.
Anexos:  6075917assinado.pdf ;
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Provimento Nº 287

 

O Des. ROGÉRIO KANAYAMA, Corregedor-Geral da Justiça, no uso de suas atribuições legais e

CONSIDERANDO o dever da família, do Estado e da Sociedade de assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, os direitos fundamentais de qualquer cidadão, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, Constituição Federal);

CONSIDERANDO que o Estatuto da Criança e do Adolescente assegura à criança e ao adolescente o direito de participar e de ter sua opinião considerada nos procedimentos que lhe dizem respeito;

CONSIDERANDO que o atendimento aos casos de medidas específicas de proteção à criança e ao adolescente deve se dar de forma precoce, com intervenção mínima e visando à efetiva promoção dos direitos e proteção da população infanto-juvenil;

CONSIDERANDO a promulgação da Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que normatiza e organiza o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência;

CONSIDERANDO o prazo concedido aos Estados para a implementação dos mecanismos de escuta especializada e depoimento especial;

CONSIDERANDO a necessidade de se viabilizar a produção de provas testemunhais com maior fidedignidade e confiabilidade, sem que a busca pela verdade dos fatos e responsabilização do agressor se sobreponha ao direito da criança e do adolescente de serem preservados de qualquer forma de violência ou opressão;

CONSIDERANDO a necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos de escuta especializada e depoimento especial, a fim de que os atos sejam realizados em condições dignas e adequadas, e por meio de profissionais capacitados e conscientes do seu papel na diminuição do dano e na não revitimização do envolvido;

CONSIDERANDO que a atuação da Corregedoria-Geral da Justiça volta-se à orientação, à correção e à inspeção das atividades judiciais e extrajudiciais no Estado do Paraná;

CONSIDERANDO a necessidade de orientar e padronizar os procedimentos relativos à aplicação da Lei nº 13.431/2017, que trata do depoimento especial e escuta especializada de crianças vítimas ou testemunhas de violência, com o estabelecimento de rotinas e condutas em todas as Comarcas do Estado do Paraná; e

CONSIDERANDO a aprovação do presente Provimento pelo Conselho de Magistratura em XX.X.2018, no SEI nº 0089145-64.2018.8.16.6000;

 

 

RESOLVE:

 

 

Art. 1º Regulamentar os procedimentos afetos ao depoimento especial no Poder Judiciário do Estado do Paraná.

Art. 2º Compete ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por meio do Conselho de Supervisão dos Juízos da Infância e da Juventude do Paraná - CONSIJ/PR:
I - Orientar e capacitar os servidores do Poder Judiciário em relação às técnicas a serem aplicadas no procedimento do depoimento especial;
II - Promover cursos voltados à capacitação de todos os profissionais que realizarão o procedimento;
III - Estabelecer estratégias de orientação e supervisão das atividades afetas ao depoimento especial;
IV - Orientar sobre o estabelecimento de fluxos de trabalho adequados ao bom desenvolvimento das atividades, observada a realidade da Comarca;
V - Adotar as medidas necessárias à efetivação do procedimento de depoimento especial no Poder Judiciário do Estado do Paraná;
VI - Buscar soluções para situações específicas que incorram no prejuízo da aplicação da Lei nº 13.431/2017.

Art. 3º No caso de Comarcas que ainda não tenham instalados os equipamentos necessários ao depoimento especial, deverá o juiz diretor do Fórum realizar a identificação da sala que será utilizada para o procedimento, comunicando o Conselho de Supervisão dos Juízos da Infância e da Juventude, sua necessidade em relação a bens móveis e equipamentos, observando as peculiaridades físicas da edificação forense.

Art. 4º Compete ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por meio do Departamento de Tecnologia da Informação e Comunicação - DTIC, a instalação, o treinamento e o suporte dos servidores do Poder Judiciário do Estado do Paraná em relação aos equipamentos a serem utilizados no depoimento especial.

Art. 5º Compete ao Magistrado responsável pelo ato de depoimento especial:
I - Zelar para que a criança ou o adolescente tenham seus direitos respeitados no curso do processo criminal ou socioeducativo;
II - Buscar, nos órgãos competentes do Tribunal de Justiça, os equipamentos e demais condições técnicas, espaciais e de pessoal para realização do depoimento especial;
III - Incentivar e participar da construção de protocolos e fluxos voltados ao aperfeiçoamento dos mecanismos de escuta especializada e depoimento especial;
IV - Garantir que os profissionais responsáveis pela entrevista da criança ou do adolescente sejam devidamente capacitados e estejam conscientes do seu papel na diminuição do dano e na não revitimização do envolvido;
V - Encaminhar os procedimentos à rede de proteção, na forma do fluxo pactuado na Comarca ou no Foro Regional, garantindo a proteção integral da criança e do adolescente.

Art. 6º Compete à Corregedoria-Geral da Justiça a fiscalização e a adoção das medidas necessárias ao efetivo cumprimento do presente Provimento pelos servidores do Poder Judiciário do Estado do Paraná.

Art. 7º O depoimento especial será realizado em local apropriado e acolhedor, com infraestrutura e espaço físico que garantam a privacidade da criança ou do adolescente vítima ou testemunha de violência (Lei nº 13.431/2017).

Art. 8º. A utilização da sala de depoimento especial se dará concomitantemente à utilização da sala de audiências, onde estarão instalados os equipamentos.
Parágrafo único. Compete ao Juízo o ajuste das pautas de audiência da Unidade Judiciária.

Art. 9º. Compete à Direção do Fórum a gestão das solicitações de manutenção e conservação dos equipamentos da sala de depoimento especial.

Art. 10. Compete ao Juiz de Direito da Unidade Judiciária a gestão das solicitações de manutenção e conservação dos equipamentos da sala de audiências.

Art. 11. O controle de reserva e utilização das salas utilizadas para a realização de depoimento especial será feito pela Direção do Fórum.

Art. 12. Compete aos Juízes de Direito integrar as discussões para a implementação de protocolos de escuta especializada e depoimento especial, bem como fluxo de atendimento, observados os arts. 11, caput, 13, parágrafo único, 14, caput, 26 e 27, da Lei nº 13.431/2017.
§1º No estabelecimento dos protocolos e fluxos, observar-se-á as recomendações do CEDCA/PR em relação ao sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, abrangendo as políticas públicas no âmbito municipal e a implementação da Lei nº 13.431/2017, as quais deverão ser observadas pelos órgãos da Rede de Proteção.
§2º Os protocolos e fluxos, uma vez pactuados nas Comarcas e Foros Regionais, deverão ser imediatamente comunicados ao CONSIJ, por meio das Coordenadorias da Infância e da Juventude.

Art. 13. Compete ao Conselho de Supervisão dos Juízos da Infância e da Juventude do Paraná - CONSIJ/PR editar recomendações, modelos de Protocolo de Escuta Especializada e depoimento especial e proposta de Fluxo de Atendimento por todas as Comarcas e Foros Regionais do Estado do Paraná.

Art. 14. A escuta especializada será realizada pelos órgãos da Rede de Proteção, a fim de assegurar o melhor interesse da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência.

Art. 15. Qualquer órgão ou serviço da Rede de Proteção, ao tomar conhecimento de que uma criança ou adolescente sofreu ou testemunhou uma situação de violência deverá comunicar o fato ao Conselho Tutelar ou ao Serviço de Recebimento e Monitoramento de Denúncias, se este estiver implantado.

Art. 16. Poderão ser aplicadas as medidas protetivas para a criança e o adolescente vítima ou testemunha de violência contra o acusado, inclusive as previstas na Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), além da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), sempre que verificada a necessidade, a requerimento da própria vítima, de seu representante legal ou do Ministério Público.

Art. 17. Determinada a realização de audiência de depoimento especial, esta deverá ser realizada no prazo máximo de 30 (trinta) dias.
Parágrafo único. Caso não seja possível a realização da audiência dentro do prazo acima indicado, o Magistrado justificará fundamentadamente.

Art. 18. O Magistrado, ao receber a representação ministerial, determinará a realização de avaliação preliminar do caso pelo profissional especializado a serviço do Juízo.
I - O entrevistador responsável por executar o depoimento especial deve comprovar capacitação para realizar o procedimento, a qual deve ser reconhecida pelo Tribunal de Justiça.
II - Na inexistência de profissional especializado na equipe do Poder Judiciário, será nomeado, pelo Juízo, profissional capacitado que não realize outros atendimentos ao suposto agressor, à suposta vítima ou às respectivas famílias.
III - O profissional especializado responsável pelo acompanhamento do procedimento da vítima ou da testemunha no processo judicial, seja regular ou em ação de produção antecipada de provas, indicará o procedimento que será adotado: depoimento especial ou perícia técnica.

Art. 19. Para o procedimento de avaliação preliminar, que visa à indicação do procedimento adequado ao caso, observando-se a compatibilização entre a necessidade do meio probatório no processo e a garantia dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, devem ser considerados os seguintes aspectos:
I - A disposição e concordância da vítima ou testemunha em se manifestar;
II - As condições psicológicas e desenvolvimentais para manifestação;
III - A capacidade cognitiva para acesso mnemônico.
§1º. Deverá ser verificada, ainda, a existência de relatórios de avaliação ou laudos periciais já realizados na fase inquisitorial ou perante outros Juízos, principalmente pelas Varas de Família e Infância e Juventude, juntando-os ao processo.
§2°. Caso a avaliação preliminar leve à conclusão de que a submissão a qualquer dos procedimentos poderá gerar a violação dos direitos fundamentais da criança ou do adolescente vítima ou testemunha, deve ser emitido parecer justificando a não intervenção.

Art. 20. No caso de ser determinada a realização de perícia técnica, esta seguirá o rito próprio das perícias judiciais.
Parágrafo único. É vedado o acompanhamento das entrevistas com a criança ou com o adolescente pelos assistentes técnicos, e a atuação destes se dará após a apresentação do laudo pericial.

Art. 21. A criança ou o adolescente que optar pela prestação do depoimento diretamente ao Juiz deverá estar acompanhada de profissional especializado durante a realização da oitiva.
§1°. O Magistrado poderá determinar que o técnico especializado preste orientações acerca da forma mais adequada para a elaboração das perguntas, visando ao não constrangimento da vítima ou da testemunha e, consequentemente, evitando incorrer na prática de violência institucional;
§2º. São vedadas as perguntas indutoras, sugestivas ou com conotação de valor ou apreciação moral que possam gerar culpa ou sofrimento à vítima ou à testemunha.

Art. 22. Caso o profissional especializado identifique que a presença do acusado na sala de audiência pode gerar prejuízos ao procedimento de depoimento especial ou colocar o depoente em situação de risco, o profissional especializado comunicará ao Juiz, que determinará sua retirada nos moldes do art. 12, §3º, da Lei nº 13.431/2017.

Art. 23. A criança ou o adolescente vítima ou testemunha de violência será intimado para comparecer à sala de depoimento especial, acompanhado de seu representante legal ou responsável, com 60 (sessenta) minutos de antecedência do horário previsto para a audiência.

Art. 24. A criança e o adolescente têm direito de ser ouvido e expressar seus desejos e opiniões, assim como permanecer em silêncio (art. 5º, inciso VI, da Lei nº 13.431/2017).

Art. 25. O depoimento especial será transmitido em tempo real para a sala de audiência, preservado o sigilo (art. 12, inciso III, da Lei nº 13.431/2017).

Art. 26. Caso o profissional especializado identifique que a continuidade do procedimento poderá acarretar significativo prejuízo psicológico à vítima ou à testemunha, solicitará o imediato encerramento do ato.
Parágrafo único. O profissional avaliará a possibilidade de conversão do procedimento de depoimento especial para perícia.

Art. 27. Ao término da narrativa livre, o juiz, após consultar o Ministério Público, o defensor e os assistentes técnicos, avaliará a pertinência de perguntas complementares, organizadas em bloco (art. 12, inciso IV, da Lei nº 13.431/2017).
Parágrafo único. As perguntas complementares deferidas serão transmitidas ao profissional especializado, que poderá adaptá-las à linguagem de melhor compreensão para a criança ou adolescente.

Art. 28. Com o objetivo de prevenir a revitimização, as provas produzidas para fins socioeducativos ou penais devem ser emprestadas aos demais processos judiciais, nos moldes do art. 372 do CPC.

Art. 29. A existência de depoimento especial e escuta especializada deverá ser registrada no Projudi e sinalizada nos cadastros gerenciados pelo Conselho Nacional de Justiça.

Art. 30. Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação.

 

Publique-se.
Registre-se.
Cumpra-se.

 

Curitiba, 31 de janeiro de 2019

 

ROGÉRIO LUIS NIELSEN KANAYAMA
Corregedor-Geral da Justiça