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APELAÇÃO CÍVEL Nº 721.113-6, DE MARINGÁ - 5ª VARA CÍVEL APELANTE (1): VANDERLEI DE OLIVEIRA SANTINI APELANTES (2): VALDEMAR FAIS E OUTROS APELANTE (3): ESTADO DO PARANÁ APELADOS: OS MESMOS E OUTROS RELATORA CONV.: JUÍZA SUBST. 2° GRAU DENISE ANTUNES (SUBSTITUINDO O DES. SÉRGIO ROBERTO ROLANSKI) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO DE APELAÇÃO (1). ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DEVIDAMENTE COMPROVADOS. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA. ABSOLVIÇÃO PENAL POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO DA SENTENÇA CIVIL. RECURSO NÃO PROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO (2). AGRAVO RETIDO. NÃO PROVIDO. ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DEVIDAMENTE COMPROVADOS. MULTA CIVIL. MANUTENÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO (3). FUNCIONÁRIOS DO DER-PR. RESPONSABILIDADE CARACTERIZADA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NA FORMA DO ART. 11 DA LEI ESPECÍFICA. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA EFICIÊNCIA. CONDENAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO. AGRAVO RETIDO E RECURSOS 1 E 2 NÃO PROVIDOS. RECURSO 3 PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 721.113-6, de Maringá - 5ª Vara Cível, em que figura como apelantes Vanderlei de Oliveira Santini, Valdemar Fais, Benedito Fais, Irmãos Fais Ltda., e Estado do Paraná.
1. Da sentença (fls. 1.723/1.745) proferida nos autos de Ação Civil Pública (autos nº 698/2002) promovida por Ministério Público do Estado do Paraná em face de Vanderlei de Oliveira Santini e outros, a qual julgou parcialmente procedente o pedido inicial, surgiu a presente apelação.
O requerido Vanderlei de Oliveira Santini, interpôs recurso de apelação, alegando em resumo que: a) o convênio firmado teve por objetivo o repasse ao município de R$ 100.000,00 para a realização de serviços em determinadas estradas; b) o serviço foi contratado através de licitação, sendo que a empresa vencedora executou integralmente os serviços; c) paralelamente o município possuía obrigações específicas; d) sempre desempenhou sua função de prefeito municipal de acordo com os princípios da administração pública; e) o processo licitatório foi absolutamente correto. Os outros requeridos também apelaram da sentença de primeiro grau, aduzindo que: a) em sede preliminar, prequestionam os seguintes dispositivos legais: art. 93, IX, CF, artigos 10 e 12, II da Lei nº 8.429/92 e artigos 127, 333, I e 596 do CPC; b) também, em preliminar, pedem a análise do agravo retido interposto em face do despacho saneador; c) não foi avaliado a presença do elemento subjetivo (dolo/culpa) no agir dos réus para configuração de eventual ato de improbidade; d) os serviços realizados pela empresa contratada são diversos dos serviços realizados pelo município; e) não é possível a aplicação da multa civil à empresa e aos seus sócios, posto que caracteriza bis in idem. Por fim, o Estado do Paraná interpôs recurso de apelação alegando que: a) restaram caracterizado os atos de improbidade por parte dos funcionários do 10º Distrito Rodoviário; b) a função dos mesmos não era tão somente acompanhar a obra e atestar
sua integral conclusão; c) eles eram responsáveis pela supervisão e fiscalização da obra, bem como averiguar os aspectos morais e legais na execução do convênio, motivo pelo qual devem ser responsabilizados por atos de improbidade administrativa. O Ministério Público do Estado do Paraná apresentou suas contrarrazões às fls. 1.812/1.831 e as demais partes apeladas às fls. 1.833/1.837 e 1.841. A Douta Procuradoria Geral de Justiça apresentou parecer pelo conhecimento e não provimento do agravo retido, pelo não provimento do recurso de apelação do réu Vanderlei de Oliveira Santini , pelo parcial provimento do recurso de apelação dos réus Valdemar Fais e outros e pelo provimento do recurso de apelação do Estado do Paraná (fls. 1.849/1.872). É O RELATÓRIO. PASSA-SE AO VOTO. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Preliminarmente, em sede de análise dos pressupostos de admissibilidade recursal, denota-se que estão presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos dos recursos, razão pela qual todos os recursos são conhecidos.
Breve histórico: extrai-se dos autos que o Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou Ação Civil Pública para reparação de danos c/c declaração de improbidade administrativa em face de Vanderlei Oliveira Santini, Valdemar Fais, Benedito Fais, a empresa Irmãos Fais Ltda. (Comércio de Areia Transportes e Terraplanagem), João Luiz Goltz de Almeida e Pedro Luiz de Souza, a fim de apurar eventuais irregularidades no procedimento licitatório ocorrido no Município de Ivatuba-PR. Consta dos autos que em razão da execução das obras decorrentes do contrato de empreitada global firmado entre o Município de Ivatuba-PR e a empresa Irmãos Fais Ltda., os requeridos acabaram por praticar atos de improbidade administrativa, os quais resultaram enriquecimento ilícito, danos ao erário, bem como violação aos princípios da Administração Pública.
Os fatos principais ora pontuados consistem:
(a) em 26.06.1998 o Estado do Paraná firmou um convênio com o Município de Ivatuba, o qual tinha por finalidade o repasse de recursos para investimentos em infraestrutura de transportes, visando à recuperação e manutenção da malha viária municipal;
(b) contudo, a prova dos autos demonstra que a execução dos serviços se deu pela própria Prefeitura Municipal de Ivatuba e não pela empresa contratada, denotando-se atos de
improbidade administrativa envolvendo os três primeiros réus e a empresa ré; e
(c) ainda, tem-se que os dois últimos réus, João Luiz Goltz de Almeida e Espólio de Pedro Luiz de Souza, então funcionários do DER, agiram também de forma irregular, posto que, no mínimo, foram negligentes em suas atribuições funcionais.
A d. sentença acabou por: a) condenar os réus Vanderlei Oliveira Santini, Valdemar Fais, Benedito Fais e Irmãos Fais Ltda., solidariamente, ao ressarcimento ao erário público da quantia de R$ 50.000,00, cujo valor deverá ser acrescido de correção monetária e juros de mora desde 05.09.2000 (data do pagamento da última parcela do contrato); b) condenar cada réu ao pagamento de multa civil no valor de uma vez o dano causado; c) proibir os réus de contratarem com o Poder Público ou receberem benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 05 anos; d) julgar improcedente a demanda com relação aos requeridos João Luiz Goltz de Almeida e Pedro Luiz de Souza (hoje espólio).
Por questão de técnica processual, primeiro passa- se a análise do agravo retido e em seguida aos recursos de apelação (1) e (2), e a final, a do (3) Estado do Paraná.
2.2. DO AGRAVO RETIDO RECURSO DE APELAÇÃO (2) VALDEMAR FAIS E OUTROS Como preliminar do recurso de apelação (2), pleiteiam os requeridos a análise do recurso de agravo retido por si interposto, em face da decisão de saneamento proferida pelo juízo singular, que acabou por afastar as preliminares alegadas em sede de contestação. Com efeito, da leitura do agravo retido, observa-se que a parte agravante insurge-se acerca das seguintes preliminares: a) incompetência do juízo monocrático; b) nulidade do despacho que deferiu a indisponibilidade de 50% dos bens pertencentes aos réus; c) nulidade de citação; d) inconstitucionalidade da Lei nº 8.429/92; e) ilegitimidade ativa do Ministério Público; e f) falta de interesse de agir. Alegou ainda que, a decisão saneadora não foi devidamente fundamentada, razão pela qual o agravo deveria ser provido. No que se refere às preliminares supracitadas, com exceção da preliminar de nulidade de citação, verifica-se que quando do recebimento da inicial pelo juízo singular, tais questões já foram devidamente analisadas e rechaçadas (fls. 930/954).
Note-se, inclusive, que todas as irresignações foram afastadas de forma fundamentada, conforme se observa da leitura da referida decisão. Ainda, da referida decisão houve interposição de agravo de instrumento pelo requerido Vanderlei de Oliveira Santini (fls. 1.041/1.049), o qual fora negado provimento (fls. 1.126/1.137). Dessa forma, quanto as preliminares supracitadas conclui-se que não havia necessidade de nova fundamentação na decisão saneadora, haja vista que tais questões já tinham sido devidamente analisadas, tendo precluído o direito dos réus de se insurgir em face delas. No tocante a preliminar de nulidade de citação, também não merece amparo às alegações da parte agravante, posto que compulsando os presentes autos, observa-se do mandado de citação de fls. 1.001/1.002 que as partes rés foram devidamente citadas, não havendo qualquer irregularidade a ser sanada. Veja-se, inclusive, que consta no referido mandado a assinatura expressa de todos os requeridos, comprovando, assim, a efetiva citação dos mesmos (fls. 1.001/1.001-verso).
Além disso, a certidão firmada pelo oficial é dotada de fé pública, possuindo presunção de veracidade quanto as afirmações nela contidas. A propósito: "AGRAVO INSTRUMENTO (...) NULIDADE DA CITAÇÃO E DA PENHORA - INOCORRÊNCIA - CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA DOTADA DE FÉ PÚBLICA - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE (...) - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO". (TJPR 3ª Câm. Cív. Ag. 695161-7 Rel. Des. Paulo Vasconcelos DJPR 04.03.2011). De tal sorte, forçoso não acolher o inconformismo da agravante, razão pela qual se nega provimento ao recurso de agravo retido.
2.3. DO RECURSO DE APELAÇÃO (1) - VANDERLEI E DO RECURSO DE APELAÇÃO (2) VALDEMAR E OUTROS 2.3.1. Alegam os requeridos, em suas razões recursais, que não restou configurada a prática de ato de improbidade administrativa, haja vista que a empresa contratada (também requerida) realizou integralmente os serviços que lhe competiam, sendo que em paralelo o Município realizava alguns serviços de manutenção do trecho não contemplado no convênio firmado com o Estado (nº 173/1998).
Depreende-se dos autos que em 26.06.1998 o Estado do Paraná firmou um convênio com o Município de Ivatuba, o qual tinha por finalidade o repasse de recursos para investimentos em infraestrutura de transportes, visando a recuperação e manutenção da malha viária municipal (cláusula primeira fls. 62/65). Além disso, ficou expressamente consignado na cláusula segunda do referido convênio que: "Cláusula Segunda: Da execução Para a consecução do objeto do presente instrumento, o Município compromete-se a executar os serviços, ficando a seu exclusivo critério a contratação da prestação dos mesmos através de empresa especializada, mediante licitação, conforme Legislação Vigente, ou por administração direta, sem qualquer ônus adicionais para o Estado e a SETR/PR". Em razão do referido convênio, foi aberto edital de licitação, a qual teve por resultado a contratação da empresa requerida Irmãos Fais Ltda. (fls. 101/102), sendo que o contrato de empreitada entre a referida empresa e o Município foi firmado em 11.08.1998 (fls. 106/110). Note-se que no contrato de empreitada restou devidamente estabelecido que a execução dos serviços compreendia a conservação e restauração das Estradas Municipais com revestimentos primários, bem como em quais estradas o serviço seria executado.
Contudo, em que pesem as irresignações dos requeridos, ainda que a obra em questão tenha sido devidamente concluída, as provas constantes nos autos demonstram que a execução dos serviços se deu pela própria Prefeitura Municipal de Ivatuba e não pela empresa contratada. Das provas colhidas em juízo constatou-se o seguinte: 1º) O vereador Ailton Pereira Loiola declarou à Promotoria de Defesa do Patrimônio e ao Juízo de primeiro grau que as obras referentes ao Convênio com a SETR foram executadas por trabalhadores da Prefeitura Municipal de Ivatuba (fls. 146/148 e 1.572/1.579). 2º) Antônio Francisco Gimenes Rodrigues, motorista da prefeitura, relatou ter laborado nas obras de melhorias das estradas municipais e transportado o cascalho, sendo que o Município auxiliava a empresa contratada (fls. 156/157 e 1.593/1.599). 3º) Os munícipes, Anísio Silva Furluna e Miltino de Mattias, lembraram que o espalhamento do cascalho nas estradas Porto de Areia, Caixas e Balsa, foram executados com o auxílio da Prefeitura Municipal de Ivatuba (fls. 161/162, 168, 169/170 e 176/177).
4º) O Sr. José Dante, dono da pedreira, contou que o Município de Ivatuba retirava de sua propriedade cascalhos para serem utilizados nas estradas rurais;e que pelo produto recebeu cheque do Município no valor aproximado de R$ 1.200,00 (fls. 184/185). 5º) O ex-servidor municipal, José Carlos Borges esclareceu às fls. 213/215: "(...) que era operador de máquina na Prefeitura Municipal de Ivatuba; que se recorda de no ano de 1998, ter operado máquina da Prefeitura Municipal de Ivatuba (pá carregadeira) para realizar lombadas nas estradas da Valsa e na estrada Caxias; que referido serviço destinava a construir caminhos para a água da chuva poder escorrer pelas curvas (...) quem transportava as pedras era um caminhão branco da Prefeitura de Ivatuba dirigido por Antônio Gimenes e uma motoniveladora da Prefeitura de Ivatuba esparramava os cascalhos (...) que a firma Conterfais somente realizou transporte de cascalho no Município de Doutor Camargo para o Município de Ivatuba e para as estradas de Porto de Areia (...)". 6º) Em juízo o Sr. José Lucas da Silva arguiu nunca ter visto alguma empresa espalhando cascalho nas estradas municipais senão a própria Prefeitura com suas máquinas e funcionários (fls. 1.569/1.571). Notadamente, e corroborando tais alegações, (7º) tem-se que as fotografias constantes às fls. 141/147 que demonstram o caminhão da própria prefeitura no local de execução dos serviços.
E, convencida está esta relatora no sentido de que o ato de promover o revestimento primário (espalhar o cascalho) representa nítida ofensa ao dispositivo contratual no qual restou estabelecido que os serviços que seriam prestados pela empresa contratada (cláusula primeira fls. 62/65). Ora, Paulo Pereira Passou contou em juízo ter fornecido cascalho à Prefeitura Municipal de Ivatuba, quando da gestão de Vanderlei Oliveira Santini (fls. 1.580/1.582). E, por fim, Armelindo Ryzik e Mauro Valêncio, funcionários do Município, declararam perante o MM. Juiz terem contribuído com o espalhamento do cascalho nas estradas (fls. 1.586/1.592 e 1.600/1.603). Diga-se, nesse oportunidade, que não se deve levar em consideração que a denúncia acerca dos fatos teria sido feito por adversário político do apelante Vanderlei, pois elementos e indícios apontam para as irregularidades e condutas desidiosas. A partir disso tudo, resta patente que o contrato de empreitada celebrado entre a empresa requerida e o Município não foi devidamente cumprido, mormente porque restou demonstrado de forma inequívoca que boa parte dos serviços nele discriminados foram realizados pelo próprio ente municipal.
Insta salientar ainda, que o contrato de empreitada não previa qualquer divisão de tarefas entre o município e a empresa especializada, sendo que diante do fato de que esta havia inspecionado e examinado o local da prestação dos serviços previamente1, presume- se que os reparos prévios e necessários a execução das obras também era de sua responsabilidade. Veja-se que no parágrafo único da cláusula quinta do contrato de empreitada restou consignado que quaisquer outros custos diretos ou indiretos necessários para a execução da obra já estavam englobados na remuneração do contrato (fls. 107). E nem se queira dizer que a mera garantia de trafegabilidade aos usuários (referido pelo apelado Vanderlei2), ensejaria qualquer tipo de obrigação paralela do Município pela obra, mormente porque a empreitada era na modalidade `total' e `global'. Primeiro porque competia sim à empresa contratada os reparos necessários para a integral execução da obra, inclusive os atos de preparação para o serviço, admitindo-se a r. conclusão abaixo:
"Assim, resta evidente que todo o preparo das estradas para o posterior revestimento com cascalho constituía obrigação intrínseca do serviço contratado, posto que o réu tinha prévia ciência do estado em que se encontravam as estradas, bem como não consta nenhuma cláusula no contrato atribuindo ao Município de Ivatuba a obrigação de "preparar" as estradas ou qualquer outra condição que estipulasse que o serviço a ser realizado pela contratada somente se iniciaria após o Município corrigir todas as imperfeições que assolavam as estradas" (fls. 1.735). E, em segundo plano, tem-se que o seguinte: "Como se sabe, a empreitada por preço global é aquela em que se ajusta a execução através de preço certo, embora reajustável, previamente estabelecido para a totalidade da obra, compreendendo todas as etapas da execução do serviço. Pela natureza jurídica do contrato celebrado, repita- se empreitada global, comprometeu-se a empresa vencedora do certame a realizar integralmente a obra de conservação e restauração das estradas municipais" (fls. 1.728-verso).
Ainda, conforme salientado no v. parecer da Procuradoria: "A administração pública municipal deve ser organizada e operacionalizada segundo os preceitos legais, tendo em vista sua finalidade pública. Deve garantir tanto a inteireza dos contextos administrativos como os direitos dos munícipes que são seus destinatários. A administração municipal está delimitada por normas consagradas de direito, liberdades e garantias que deve respeitar e fazer respeitar. Assim, uma de suas atividades é controlar a performance administrativa local" (fls. 1.863).
2.3.2. Enfim, e ainda que perante este eg. TJPR tenha restado certa a absolvição dos apelantes na esfera penal (ação penal nº 652.019-4, absolvição por causa da fragilidade das provas e a incidência do princípio in dúbio pro reo), tem-se que tal conclusão não influencia no convencimento desta relatora. Notadamente, a doutrina ensina que uma conduta pode ser classificada ao mesmo tempo como ilícito penal, civil e administrativo. Nesse caso poderá ocorrer a condenação em todas as
esferas ou não, ou seja, na ação civil poderá ser condenado e na ação penal absolvido, pois impera a regra da independência e autonomia entre as instâncias. Mas há exceções, nas quais haverá vinculação entre as instâncias, o que significa que não poderá ser condenado na esfera civil ou administrativa quando for absolvido na esfera penal por inexistência de fato ou por negativa de autoria. Mas não quando o réu é absolvido por falta de provas como no caso em apreço.
Vejam-se as regras contidas na Lei nº 8.112/90, no CCB e no CPP, respectivamente:
Art. 125. As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si. Art. 126. A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria. CÓDIGO CIVIL: Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. (art. 1.525 do CCB/16)
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL : Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato . Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil : I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação; II - a decisão que julgar extinta a punibilidade; III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime . Nesse passo, por curial, tem-se que a absolvição no processo penal por inexistência de fato ou negativa de autoria não se confunde com a condenação por insuficiência de provas. E ainda, se o tipo penal exigir dolo na conduta e ela tiver sido praticada com culpa, poderá, haver condenação no âmbito civil.
O desembargador Tourinho Neto foi relator do seguinte julgado do TRF1-BA (Ac. 2998, 2005.33.00.002998-2; j. 29/4/2008): CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DOLO GENÉRICO COMPROVADO (CIÊNCIA DA ILICITUDE DA CONDUTA). SANÇÃO: ARTIGO 12, INCISOS I e III, DA LEI nº 8.429/92.
1. As instâncias administrativa, civil e criminal são independentes, exceto na hipótese em que, na ação penal, seja reconhecida a inexistência dos fatos ou haja a negativa de autoria, a teor do artigo 1.525 do Código Civil (CCB de 1916). 2. Prática de atos de improbidade administrativa que atentem contra os princípios da administração pública - prática de ato visando fim proibido em lei - e que importem enriquecimento ilícito - auferimento ilícito de valores integrantes de acervo patrimonial da ECT - devidamente comprovada pelo conjunto probatório contido nos autos. 3. Apelação não provida.
2.3.3. A Lei de Improbidade Administrativa nº 8.249/92 definiu os atos de improbidade administrativa nos artigos 9º à 11º3, os quais são definidos da seguinte forma:
contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem; VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público; VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade; IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza; X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado; XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei; XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei".
"Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie; IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado; V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado; VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea; VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
a) atos que importem em enriquecimento ilícito; b) atos que causam prejuízo ao erário, e c) atos que atentam contra os princípios da administração pública.
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público; XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades. XIV celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; XV celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei".
"Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo; IV - negar publicidade aos atos oficiais; V - frustrar a licitude de concurso público; VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo; VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço". Retornando aos fatos em análise, resta inconteste que a obrigação contratada consistia em conservar e restaurar, competindo à empresa contratada os reparos necessários para a integral execução da obra, inclusive os atos de preparação para o serviço, repita-se: "Assim, resta evidente que todo o preparo das estradas para o posterior revestimento com cascalho constituía obrigação intrínseca do serviço contratado, posto que o réu tinha prévia ciência do estado em que se encontravam as estradas, bem como não consta nenhuma cláusula no contrato atribuindo ao Município de Ivatuba a obrigação de "preparar" as estradas ou qualquer outra condição que estipulasse que o serviço a ser realizado pela contratada somente se iniciaria após o Município corrigir todas as imperfeições que assolavam as estradas" (fls. 1.735) Portanto, certa está a prática de ato de improbidade administrativa pelos requeridos, mormente porque ficou claro que o Município contratou uma empresa especializada para a execução da obra, a qual foi devidamente remunerada para a realização do serviço, entretanto quem na prática efetuou os atos necessários foi o próprio ente municipal, o que por si só caracteriza o prejuízo por ele sofrido.
2.3.4. Assevera-se ainda, que todos os requeridos tinham pleno conhecimento das irregularidades que estavam sendo praticadas, sendo que especialmente ao requerido Vanderlei cabia promover a devida rescisão contratual, diante do cargo que exercia na época dos fatos (prefeito municipal) em constatando qualquer desvio na execução do contrato. Do mesmo modo os demais requeridos (empresa contratada e seus sócios) também devem ser responsabilizados, posto que locupletaram-se à custa do ente municipal à medida que não cumpriram fielmente aquilo que havia sido contratado. Assim, considerando que os réus restaram inertes e locupletaram-se indevidamente, restou caracterizado a responsabilidade pelos atos ocorridos, em conformidade com a Lei nº 8.429/92.
2.3.5. Por fim, pleiteiam os requeridos irmãos Fais e empresa o afastamento da multa civil com relação aos sócios da empresa contratada, aduzindo que referida condenação implicou em bis in idem, haja vista que o mesmo responsável foi apenado em triplicata. Primeiramente, esclarece-se que a multa civil trata- se de uma penalidade que tem por finalidade impor ao agente público a
observância dos princípios concernentes à Administração Pública, evitando eventuais desperdícios e aplicando corretamente os recursos públicos. Segundo consta no brilhante parecer da Procuradoria, como o qual concorda esta relatora, o seguinte: "(...) a condenação dos sócios cumpre o papel de intimidação, ao passo que a condenação da empresa, visa punir o descumprimento do contrato, tratando- se de uma punição independente do ressarcimento do dano" (fls. 1.871). No caso em análise, os requeridos foram condenados solidariamente ao ressarcimento de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em razão do dano ocasionado ao erário público, bem como à multa civil fixada para cada um dos réus na importância de uma vez o valor correspondente a quantia devida a título de ressarcimento aos cofres públicos (fls. 1.743). Destaca-se que a Lei de Improbidade Administrativa carece de balizadoras objetivas, legais ou matemáticas na imposição das sanções, ficando ao prudente arbítrio do Juízo, com base nos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, a dosagem da penalidade.
Não obstante o fato de não haver parâmetros legais definidos para fixação das penas, cumulativas ou não, deve o magistrado sempre levar em consideração certos critérios que asseguram a busca da Justiça no caso concreto, evitando excessos, conforme orienta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"A aplicação das sanções da Lei n. 8.429/92 deve ocorrer à luz do princípio da proporcionalidade, de modo a evitar sanções desarrazoadas em relação ao ato ilícito praticado, sem, contudo, privilegiar a impunidade". (REsp. nº 300.184-SP - 2001/0005513-3, Rel. Min. Franciulli Netto, j. 04/9/2003). Nesse passo, considerando o lapso temporal transcorrido entre os fatos narrados na inicial e o trâmite da presente demanda, há de ser mantida a condenação imposta pelo juízo singular em relação a todos os requeridos. Ademais, nem se cogite qualquer possibilidade de exclusão da multa civil sob eventual pensamento de que ocorrerá restituição integral dos valores ilegalmente despendidos aos cofres públicos (revelando-se daí a eventualidade da multa ser excessiva), pois, nitidamente, e como bem frisou o magistrado singular, no presente caso não é possível auferir quanto que o Município de Ivatuba-PR acabou
despendendo para a prática da obra, uma vez que não é possível mensurar de forma precisa quanto foi empregado para a concretização da obra. Esclarece-se ainda que não há qualquer irregularidade na condenação imposta à empresa contratada, bem como em face dos seus sócios, haja vista que todos praticaram atos ímprobos, devendo ser responsabilizados por tal desiderato.
2.4. DO RECURSO DE APELAÇÃO (3) ESTADO DO PARANÁ 2.4.1. Insurge-se ainda o Estado do Paraná em face da sentença singular, pleiteando a condenação dos requeridos João Luiz Goltz de Almeida e Espólio de Pedro Luiz de Souza, sob o fundamentado de terem sido negligentes em suas atribuições funcionais e coniventes com o fato delituoso. Primeiramente, esclarece-se que os requeridos supracitados eram funcionários do 10º Distrito Rodoviário, sendo, portanto, representantes do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná PR. O Sr. João Luiz era o engenheiro Chefe do 10º Distrito Rodoviário e o falecido, Sr. Pedro Luiz, era o mestre de obras (ou feitor da área) do mesmo distrito. Pois bem.
No convênio firmado entre o Estado e o Município ficou estabelecido que competia ao Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná a supervisão e fiscalização dos serviços realizados pelo Município no caso, os serviços realizados pela empresa contratada (fls. 64). Por curial, aqui no presente feito, não está em pauta qualquer conduta criminosa, e sim averiguar atos que configurem improbidade administrativa4. A propósito, nunca é demais lembrar que a Lei de Improbidade Administrativa é de natureza civil, e não penal . Por isso, não se cogitará falsificação de documentos; e ainda que o Ministério Público de primeiro grau não tenha recorrido da sentença, a Procuradoria da Justiça opinou no sentido de dar conhecimento e provimento ao recurso do Estado do Paraná (fls. 1.872) que, por sua vez, entende que os funcionários em apreço agiram com desídia. Por sua vez, o DER deste Estado, através da Superintendência Regional Noroeste e da Comissão então formada, concluiu em opinar5 pelo arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar instaurado contra os funcionários, posto que não se
encontrou prova capaz de demonstrar o ato ilícito com fulcro na Lei nº 6.174/70; e ainda a única base para tal conclusão foi feita através de informações colhidas dos próprios envolvidos e de demais moradores da região onde se encontravam as obras em questão. Não obstante, consta que própria Comissão menciona que os fatos relatados foram os que poderiam ser apurados depois de 5 anos da execução dos serviços, e que "como as obras foram concluídas, aceitas pelos funcionários do DER e liberado o Atestado de Conclusão de obras (...) , nada podemos imputá-los" Ora, a conclusão da referida Comissão no que tange aos funcionários do DER, não atingem a o interesse de apelar do Estado do Paraná, mormente quando incontroverso resta nos autos6 que as obrigações do DER/SETR era a de `supervisionar e fiscalizar os serviços realizados pelo Município (aqui executado mediante contratação), emitindo relatório mensal de acompanhamento da obra"; e ainda "realizar as medições dos serviços executados nos termos do plano de aplicação7". Com efeito, desnecessário seria que houvesse um ente público apenas com a função de verificar a conclusão de uma obra.
Diz o convênio nº 173/1998 firmado entre o Município e Estado do Paraná, no que tange às obrigações: "(...) III Do DER/PR: a) Supervisionar e fiscalizar os serviços realizados pelo Município, emitindo relatório mensal de acompanhamento da Obra; b) Realizar as medições dos serviços executados nos termos do plano de aplicação, encaminhando-as, de imediato, à Secretaria de Estado dos Transportes, Coordenação Planos Programas Transportes, para os devidos fins". Aliás, questão levantada pela Comissão foi a referente a não entrega dos relatórios mensais. Consta do parecer da Comissão que "a previsão do relatório mensal ficou sob dúvida, mas foi informado pelo engenheiro João Luiz... que foi solicitado pelo Diretor Gilberto Pereira Loyola... que os relatórios deveriam ser encaminhados no máximo até o dia 20/08/98". A mera justificativa do envolvido (do engenheiro chefe), não poderia autorizar a conduta omissiva; e aqui já se percebe a primeira desídia e falta de eficiência por parte dos referidos funcionários.
Notadamente, o Estado do Paraná, muito bem indica que o DER, por seus representantes, deveria zelar pelo fiel cumprimento do convênio em consonância com a legalidade e moralidade administrativa, e diga-se ainda com o princípio da eficiência. Ainda, sabe-se que o DER-PR possui uma coordenadoria própria para acompanhamento de obras e manutenção das rodovias, a qual tem por um dos objetivos o monitoramento e a fiscalização dos contratos, convênio e outras formas de despesa e avaliações dos resultados, até mesmo com levantamento dos custos efetivos dos serviços e obras 8. Ora, e para tanto, deveriam os funcionários do DER fornecer todos os elementos devidos (em paralelo com os termos do convênio e diante da contratação da empresa, através dos ditos relatórios mensais para avaliações devidas. Assim, merece reforma a sentença recorrida neste aspecto, haja vista que não era mera função dos referidos funcionários somente acompanhar a obra e atestar sua integral conclusão. Diga-se mais. Ao contrário, cabia ao referido órgão (através dos funcionários em
questão) fiscalizar adequadamente se o contrato de empreitada estava sendo cumprido, encaminhar relatórios mensais, e ainda, averiguar se o cumprimento do contrato atendia o tal plano de aplicação de recursos, ou seja, especialmente deveria ser averiguado se os recursos provenientes do Município estavam sendo empregados na forma devida. Nada existe no feito acerca dessas tomadas de atitudes por parte dos réus em apreço. Referidos funcionários, além de atestaram a correta execução da obra, também deveriam averiguar quem estava realizando os serviços (empresa contratada ou o próprio ente municipal), em razão do constante no artigo 2º do Decreto nº 2.458/2000, o qual dispõe a competência do DER: "Art. 2º - Ao Departamento compete: (...) II programar, executar e controlar todos os serviços técnicos e administrativos concernentes a estudos, projetos, obras, conservação, operação e administração das estradas e obras de arte rodoviárias compreendias no Plano Rodoviário Estadual, planos complementares e programas anuais especiais definidos pela Secretaria de Estado dos Transportes".
Repita-se também o que dispõe o convênio nº 173/1998 firmado entre o Município e Estado do Paraná que: "(...) III Do DER/PR: a) Supervisionar e fiscalizar os serviços realizados pelo Município, emitindo relatório mensal de acompanhamento da Obra; b) Realizar as medições dos serviços executados nos termos do plano de aplicação, encaminhando-as, de imediato, à Secretaria de Estado dos Transportes, Coordenação Planos Programas Transportes, para os devidos fins".
Ora, além de atenderem o princípio da legalidade, os agentes públicos devem agir com rapidez, presteza, perfeição, rendimento. Eficiência é o que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. Eficiência apresenta como princípio dois aspectos: o primeiro diz respeito ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores
resultados; o segundo ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público9.
Nesse passo, e ainda que não se possa reconhecer a ocorrência de conivência dos agentes públicos com os demais réus, houve a prática de desídia por eles, em certa afronta aos princípios da legalidade e eficiência. Assim, também resta comprovada a prática de ato de improbidade administrativa, mas agora considerando a afronta aos princípios da Administração Pública pelos requeridos João Luiz Goltz de Almeida e Pedro Luiz de Souza, pois agiram com culpa, os quais devem ser ora condenados. Notadamente, o autor do ato de improbidade deve ser sempre o agente público, compreendido como toda aquele cidadão que preste pessoalmente serviços à Administração Pública. E no tópico em análise, deve-se se ater ao contido no art. 11 da LIA, caracterizados atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública, sendo que a tipificação das condutas aqui percebidas correspondem aos seguintes requisitos:
9
a) conduta comissiva ou omissiva que não gere enriquecimento ilícito nem prejuízo ao erário, pois o tipo do art. 11 é subsidiário; b) atentado contra os princípios da Administração Pública: inclui os princípios constitucionais expressos no art. 37, caput, da CF (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) e também todos os outros princípios da Administração Pública (como os previstos na Lei 9.784/99 finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica e interesse público); e c) nexo causal entre o exercício funcional e o desrespeito aos princípios da Administração Pública. Portanto, condena-se o réu João Luiz Goltz de Almeida ao pagamento de multa civil na importância de cinco (05) vezes o valor da remuneração bruta mensal. Dita remuneração se trata daquela percebida pelo agente à época dos fatos, a teor do contido no inciso III do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa. A correção monetária e os juros de mora deverão incidir em conformidade com o disposto na decisão singular (fls. 1.744/1.744-verso). Não se olvide que se deve aplicar o inciso III do art. 12, que prevê as penas cominadas às hipóteses do art. 11 atos de
improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública , que são: o ressarcimento integral do dano, se houver; a perda da função pública; a suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos; o pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar, pelo prazo de três anos, com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário. Outrossim, cabe consignar, que em que pese o artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa contemple outras modalidades de sanção hábeis a serem aplicáveis, devem-se levar em consideração os princípios da proporcionalidade e razoabilidade na dosagem da pena10, motivo pelo qual ao ora requerido, aplica-se tão somente a pena de multa civil, no valor arbitrado. Veja-se que o próprio dispositivo legal supracitado dispõe que: "Independentemente das sanções penais, civis e
administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato". Nesse sentido: "IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - LEI Nº 8429/1992 - PREFEITO-MUNICIPAL - REPASSE DE VERBAS PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE SANEAMENTO BÁSICO - EXECUÇÃO PARCIAL - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA DESTINAÇÃO DE PARCELA DOS RECURSOS FINANCEIROS - ATO ÍMPROBO CARACTERIZADO - FIXAÇÃO DA PENA - PROPORCIONALIDADE. Caracteriza ato ímprobo a atuação desidiosa do Prefeito-Municipal, que, ao gerir recurso destinado à Municipalidade para consecução de obras de saneamento básico, não logra êxito em comprovar a destinação de parcela da quantia repassada. De acordo com art. 12 da Lei nº 8429/1992, a pena imputada ao réu-ímprobo deve ter como mensuração o princípio da proporcionalidade". (TJMG, Processo n.º 1.0686.06.174528-3/001, Rel. Des. Manuel Saramago, julgado em 10/02/2011, publicado em 28/02/2011).
Ou seja, resta certa a possibilidade de aplicação de somente uma das penalidades previstas no artigo 12 da LIA.
2.4.2. No que tange ao requerido Pedro Luiz, tem-se que o mesmo faleceu, e pois seria devida a aplicação de multa ao Espólio de Pedro Luiz de Souza se a condenação por improbidade administrativa fosse calcada em atos que importassem em enriquecimento ilícito e/ou atos que causam prejuízo ao erário. No caso em que a condenação do falecido se deu por causa de atos que atentam contra os princípios da administração pública, e assim, o espólio não responderá. E isso se conclui, pois, segundo prescreve o art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa: "O sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança."
Em comentário a regra supra referida, Rogério Pacheco Alves11 ensina que:
"No art. 8º, prevê a Lei de Improbidade a responsabilidade do sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicitamente, sujeitando-se à reparação do dano causado ou à perda do acréscimo patrimonial ilegal, isto é até o limite do valor da herança."
Portanto, não se aplicará multa ao requerido falecido. 3. Concluindo, vota-se no sentido de: a) negar provimento ao recurso de apelação (1) Valderlei de Oliveira Santini; b) negar provimento ao agravo retido e ao recurso de apelação (2) Valdemar Fais; c) dar provimento ao recurso de apelação (3) Estado do Paraná, para o fim de reconhecer os atos de improbidade administrativa praticados pelos funcionários do DER, e condenar o requerido João Luiz Goltz de Almeida ao pagamento de multa civil, nos termos da fundamentação.
ACORDAM OS DESEMBARGADORES E JUÍZES DA QUINTA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E AOS
RECURSOS DE APELAÇÃO (1) E (2), E DAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO (3), NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
O JULGAMENTO FOI PRESIDIDO PELO SENHOR DESEMBARGADOR LUIZ MATEUS DE LIMA, COM VOTO, E DELE PARTICIPOU O SENHOR DESEMBARGADOR LEONEL CUNHA. Curitiba, 31 de julho de 2012.
DENISE ANTUNES, RELATORA Juíza de Direito Subst. 2º Grau
-- 1Cláusula primeira: "(...) cujas localidades foram inspecionadas previamente pela Contratada, que examinou detalhadamente o Plano de Aplicação aprovado pela Secretaria de Estado dos Transportes, e que se declara em condições de executar os serviços de estreita observância com indicado no Plano de Aplicação, nas especificações e na documentação levada a efeito pela Licitação Carta-Convite nº 014/98, devidamente homologada e adjudicada pela CONTRATANTE" (fls. 106). -- 2 Cláusula 7ª, II, alínea `g'.
-- 3 Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento
ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público; II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1° por preço superior ao valor de mercado; III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado; IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades; V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de
-- 4 O ato de improbidade administrativa pode ser sancionado em três instâncias: a)
penal, se houver tipificação legal (ex.: crimes contra a Administração Pública); b) administrativa, se desobedecer a algum dever ou se praticar algum ato proibido por lei (na Administração Pública Federal, os deveres e as proibições estão previstos nos art. 116 e 117 da Lei 8.112/90); c) civil, se houver algum dano moral ou material a ser ressarcido. -- 5 Comissão apresentou parecer final em 22 de julho de 2003.
-- 6 E inclusive consta do parecer da Comissão aqui mencionada. -- 7 Plano de Aplicação é a programação da distribuição dos recursos financeiros.
-- 8 "Art. 30 À Coordenadoria de Programação e Acompanhamento de Obras e Serviços compete: (...) III a descentralização e o monitoramento do gerenciamento e da fiscalização dos contratos, convênios e de outras formas de despesas; IV a avaliação dos resultados obtidos em relação às metas estabelecidas, sugerindo alternativas para minimizar as dificuldades apontadas; V a avaliação dos resultados através do levantamento de custos efetivos da realização dos serviços e obras rodoviárias (...)".
-- 9Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/o-principio-da-eficiencia-na- gestao-publica/14519/#ixzz227hcjgaI
-- 10 Em atendimento aos mandamentos constitucionais, o art. 12 da LIA estabeleceu um rol diversificado de sanções para os atos configuradores de improbidade administrativa. Agentes públicos, particulares e pessoas jurídicas estão sujeitos às penas de suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, ressarcimento ao erário, multa, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.(...) Após grandes divergências doutrinárias e jurisprudenciais, a Lei nº 12.1201, de 15 de dezembro de 2009, sepultou este problema, ao adotar a corrente defensora da não-obrigatoriedade (as penas podem ser aplicadas de forma isolada), capitaneada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Vide em http://jus.com.br/revista/texto/20014/a-aplicacao-do-principio-da- proporcionalidade-na-fixacao-das-sancoes-previstas-na-lei-de-improbidade- administrativa#ixzz1zW1aWBEu
-- 11 In: Improbidade Administrativa, RJ: Lumen Juris, 2008, pág. 641:
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