Íntegra
do Acórdão
Ocultar
Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.Recomenda-se acessar o PDF assinado.
Apelação Cível nº 612737-5 3ª Vara Cível da Comarca de Cascavel. Apelante: Unimed Foz do Iguaçu Cooperativa de Trabalho Médico. Recorrente Adesiva: Ieda Maria Priamo Tosso. Apelados: os mesmos. Relator: Desembargador Francisco Luiz Macedo Júnior APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DO CDC. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (ERBILUX), SOB ALEGAÇÃO DE QUE O PROCEDIMENTO SERIA EXPERIMENTAL E, POR ISTO, EXCLUÍDO DA COBERTURA, ALÉM DE SER "OFF LABEL" (FORA DE PRESCRIÇÃO E DA RECOMENDAÇÃO DO FABRICANTE DO PRODUTO). MEDICAMENTO INDICADO POR MÉDICO RESPONSÁVEL. DEVER DA SEGURADORA CUSTEAR O TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A relação das partes é de consumo, porque se enquadra nos conceitos de consumidor/fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º e parágrafos do CDC, portanto, a interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita de maneira mais favorável ao consumidor. 2. As despesas com o tratamento de saúde, dispensados a requerente, devem ser suportadas integralmente pelo plano de saúde, porque a cláusula de exclusão de cobertura de procedimento apresenta-se abusiva, colocando o consumidor em desvantagem exagerada. RECURSO ADESIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS QUE DEVEM SER SUPORTADOS INTEGRALMENTE PELA REQUERIDA. RECURSO PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 612737-5, da 3ª Vara Cível da Comarca de Cascavel em que é Apelante Unimed Foz do Iguaçu Cooperativa de Trabalho Médico, Recorrente Adesivo Ieda Maria Priamo Tosso e Apelados os mesmos.
Ieda Maria Priamo Tosso propôs ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, sustentando, em síntese: a) que é portadora de neoplasia maligna de cólon do reto e do fígado, sendo que seu médico oncologista, Dr. Reno Paulo Kunz, prescreveu quimioterapia a base do medicamento ERBITUX; b) que já foi submetida a tratamentos e esquemas quimioterápicos custeados pela requerida, mas que, recentemente, esta teria se recusado a custear o tratamento quimioterápico prescrito pelo seu médico oncologista, interferindo indevidamente no seu tratamento; c) que como o seu plano de saúde possui cobertura para quimioterapia, a requerida não poderia decidir, no lugar do médico, qual seria o tratamento mais apropriado; d) que tendo em vista o agravamento de seu estado de saúde, seu médico optou pelo tratamento quimioterápico, a base de ERBITUX, o qual é mais agressivo e necessário ao seu tratamento, mesmo que em caráter paliativo, porque a doença já alcançou o estágio IV, e; e) que a negativa de cobertura do tratamento se deu sob a alegação de que o medicamento ERBITUX não
tem aprovação para prescrição em câncer de cólon e reto.
Requereu a antecipação dos efeitos da tutela, para que a requerida fosse compelida a liberar o tratamento quimioterápico solicitado pelo médico da paciente a base do medicamento ERBITUX, por tantos ciclos quantos forem necessários sob pena de multa diária, para caso de descumprimento.
Por fim, postulou a condenação da requerida ao pagamento de indenização pelos danos morais suportados em virtude da injustificada recusa em autorizar o tratamento solicitado. Juntou documentos às fls. 22/31.
À fl. 32/32-vº o benefício da assistência judiciária foi concedido, ocasião em que foi designada audiência de justificação prévia.
Na audiência foi ouvido o médico oncologista da autora, apresentada emenda a inicial (fls. 41/42), com juntada de novos documentos (fls. 43/78), bem como concedida, em parte, a antecipação da tutela pretendida, a fim de obrigar a requerida a custear o primeiro ciclo de tratamento da autora, à base do medicamento ERBITUX, com a seguinte ressalva: "transcorridas três semanas do início do tratamento, o médico deverá reportar ao juízo se convém prosseguir com a linha de tratamento, isto é, deverá descrever exatamente os resultados apresentados pela paciente e as perspectivas obtidas a partir da reação dela à medicação." (fl. 39)
Contestação da requerida às fls. 86/154, pugnando, preliminarmente, pela revogação da decisão que concedeu a antecipação de tutela. Com relação ao mérito, pleiteou a improcedência dos pedidos formulados na inicial, argumentando que a negativa de cobertura encontra amparo na impropriedade do medicamento para o tratamento da doença que acomete a autora. Juntou documentos às fls. 28/154.
Sentenciando o feito, o MM juiz julgou parcialmente procedente os pedidos da autora, "ratificando as decisões de fls. 37/39 e 169 e condenando a ré a suportar os custos do tratamento da enfermidade da autora (neoplasia maligna de cólon do reto e no fígado), mediante novas sessões de quimioterapia a base de ERBITUX (cetuximabe), até quando essa terapia foi considerada útil e frutífera pelo médico-assistente e assim por ele solicitadas, sob pena de sofrer medidas que atinjam o resultado prático equivalente." (fl. 194) Rejeitou o pedido de indenização por danos morais.
Ante a sucumbência recíproca, condenou as partes a suportar, "meio a meio", o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios dos respectivos patronos, fixados em R$1.500,00 (um mil e quinhentos reais) cada, com fulcro no artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.
Inconformada com a sentença, a requerida Unimed Foz do Iguaçu Cooperativa de Trabalho Médico, interpôs o presente recurso
de apelação (fls. 199/204), sustentando, em síntese, que: a) a negativa de custeio de tratamento a base de ERBITUX ocorreu com fulcro em argumentos científicos e na própria bula do medicamento; b) o referido medicamento não seria indicado para o quadro clínico da paciente; c) a ANVISA teria aprovado o uso do medicamento ERBITUX apenas para o tratamento de câncer de cabeça e pescoço; d) o tratamento requerido seria experimental, porque não possuiria resultado cientificamente comprovado; e) que o tratamento requerido seria paliativo, consoante se verifica pelo relatório de perícia médica; f) que o efeito produzido pelo ERBITUX, poderia ser alcançado por outros medicamentos, e; g) que a Cooperativa não poderia assumir os riscos de um tratamento considerado "off label" (fora de prescrição e da recomendação do próprio fabricante do produto.
Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso, para o fim de julgar totalmente improcedente a pretensão da autora e, de conseqüência, reformada parcialmente a sentença, argumentando que o tratamento a base de ERBITUX, buscado pela requerente, não geraria o efeito descrito na decisão impugnada, assim como não seria recomendado pelo próprio fabricante do medicamento.
Irresignada com a prestação jurisdicional a autora interpôs recurso adesivo (fls. 224/234), requerendo a condenação da requerida Unimed ao pagamento de indenização por danos morais, assim como a condenação desta ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios.
Contra razões, tanto de uma como de outra parte, pugnando pelo desprovimento do recurso alheio.
Relatados, VOTO:
Presentes os requisitos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, de se conhecer os presentes recursos.
RECURSO DE APELAÇÃO DA UNIMED
Defende a requerida/apelante, a legalidade da negativa de liberação de procedimento, argumentando que esta restou amparada em argumentos científicos e na própria bula do medicamento
Argumenta, ainda, que o tratamento requerido seria experimental, porque não possuiria resultado cientificamente comprovado e, que, por isto, não poderia assumir os riscos decorrentes de um tratamento considerado "off label" (fora de prescrição e da recomendação do próprio fabricante do produto).
Em que pesem as argumentações da apelante, não há como lhe dar razão.
Primeiramente, importante destacar, que o medicamento solicitado (ERBITUX) foi prescrito por médico especialista em oncologia clínica, Dr. Reno Paulo Kunz, que determinou sua utilização para
viabilizar o tratamento quimioterápico da autora/apelada, tendo em vista que o emprego de outros medicamentos não mostrou resultado eficaz.
Ademais, como a doença da autora/apelada encontra-se em estágio avançado (estágio IV), o tratamento com ERBITUX, por ser mais agressivo, foi o método encontrado pelo médico, para atenuar os efeitos da doença, tendo em vista que o referido medicamento vem obtendo resultados satisfatórios nos tratamentos contra câncer.
Confira-se:
"Em relação a paciente Ieda Maria Priamo Tosso, portadora de neoplasia maligna CID C 18.9 EcIV já tratada em outro serviços e com diversos esquemas e com falha de tratamento. Indicado ERBITUX por ser a única droga que apresenta melhor benefícios a paciente neste momento. Diversos pacientes usando ERBITUX com excelentes resultados e com mais qualidade de vida. (fl. 43)
Conclui-se, desse modo, que a utilização do medicamento ERBITUX é essencial ao tratamento da segurada, sendo que a negativa de fornecimento restringiria direito fundamental, inerente à natureza do contrato de seguro, capaz de ameaçar o objetivo das cláusulas de cobertura integral do referido tratamento (Câncer).
De se dizer, também, que não tem importância o fato do tratamento ser experimental ou feito à base de medicamento indicado para
outra forma de câncer (cabeça e pescoço), porque o contrato não exclui a cobertura para tratamento de câncer em si (cláusula 7.3.3, alínea "j" fls. 68/69)
Segundo o Superior Tribunal de Justiça os planos de saúde podem estabelecer quais doenças serão cobertas, mas não podem limitar o tipo de tratamento a ser ministrado ao paciente.
Confira-se:
Seguro saúde. Cobertura. Câncer de pulmão. Tratamento com quimioterapia. Cláusula abusiva. 1. O plano de saúde pode estabelecer quais doenças estão sendo cobertas, mas não que tipo de tratamento está alcançado para a respectiva cura. Se a patologia está coberta, no caso, o câncer, é inviável vedar a quimioterapia pelo simples fato de ser esta uma das alternativas possíveis para a cura da doença. A abusividade da cláusula reside exatamente nesse preciso aspecto, qual seja, não pode o paciente, em razão de cláusula limitativa, ser impedido de receber tratamento com o método mais moderno disponível no momento em que instalada a doença coberta. 2. Recurso especial conhecido e provido. 1 No caso em análise, a necessidade da medicação solicitada ficou comprovada pela carta enviada pelo médico oncologista, Dr. Reno Paulo Kunz, a Unimed (fl. 43), assim como pelo depoimento prestado por este, em audiência (fl. 40). Portanto, restou evidenciado que a
1 STJ, REsp 668216/SP, 3ª Turma, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 15/03/2007, DJ 02/04/2007, p. 265.
medicação solicitada e indicada pelo médico integra o próprio tratamento do câncer, doença esta coberta pelo plano de saúde.
Afora isto, de se dizer, também, que após o primeiro ciclo do tratamento a autora obteve melhora significativa, consoante se depreende da declaração firmada pelo médico, Dr. Luiz Sergio Spricido, que aplicou o medicamento na paciente.
Confira-se:
"Referente à Ieda Priamo Tosso portadora de neoplasia maligna de cólon CID C18, paciente em questão está obtendo uma melhora significativa com o uso do medicamento ERBITUX, houve desaparecimento da ASCITE. O tratamento será indefinido, ou seja, enquanto houver resposta. (fl. 160) Do mesmo modo, o médico oncologista, que indicou o tratamento a paciente, Dr. Reno Paulo Kunz, atestou a melhora após o primeiro ciclo do tratamento a base de ERBITUX.
Veja-se:
"Paciente apresentou excelente tolerância e reposta à medicação com diminuição de todos os sintomas que prejudicavam sua qualidade de vida. Ascite, ou seja, líquido livre em cavidade abdominal, diminuiu em mais de 70%. Paciente agora alimenta-se normalmente. Edema de membros inferiores, ou seja, inchaço, diminuição próxima total. Assim sendo, paciente tem sido capaz de realizar sozinha a maioria de suas atividades habituais. (fl. 167)
Assim, não se mostra razoável excluir a determinada opção terapêutica se existe cobertura para a doença no contrato.
No mesmo sentido é a jurisprudência desta Corte de Justiça:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DA COBERTURA DE MEDICAMENTO ASSOCIADO AO TRATAMENTO DE CÂNCER. EXPERIMENTAL. INTEGRA O TRATAMENTO. INDICAÇÃO MÉDICA. Demonstrado que a medicação, solicitada e indicada pelo médico, integra o próprio tratamento do câncer, doença coberta pelo termo firmado entre as partes, o fornecimento deverá ser suportado pelo Plano de Saúde. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO PROVIDO. 2
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - PLANO DE SAÚDE - DETERMINAÇÃO PARA QUE O PLANO DE SAÚDE CONCEDA COBERTURA INTEGRAL AO TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO, INCLUSIVE COM FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO "ZOLATEX", QUE SE DESTINA AO BLOQUEIO DE PRODUÇÃO HORMONAL, CONSIDERADO FUNDAMENTAL PARA CONTROLE DO CÂNCER E CONTINUIDADE DO TRATAMETNO - MEDICAMENTO PRESCRITO POR MÉDICO ESPECIALISTA COOPERADO - AGRAVO RETIDO. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO EXPRESSO. NÃO CONHECIMENTO. ART. 523, §1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO CÍVEL - ALEGAÇÃO DE QUE TRATAMENTO DOMICILIAR NÃO É COBERTO PELO PLANO - MEDICAÇÃO AUXILIAR FUNDAMENTAL PARA A CONTINUIDADE DO TRATAMENTO - RESPEITO À NATUREZA DO CONTRATO - ANÁLISE DA 2 TJPR, Ac. 17892, 10º CCv, AI n. 589750-5, Relator Des. Nilson Mizuta, julgado em 27/08/2009, DJPR 22/09/2009.
LEGALIDADE DA CLÁUSULA DE EXCLUSÃO - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CLÁUSULA LIMITATIVA, REDIGIDA SEM DESTAQUE - AFRONTA AO ARTIGO 54, § 4º, DO CDC - DIREITO BÁSICO DO CONSUMIDOR, ASSEGURADO PELO ARTIGO 6º, INCISO III, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NULIDADE DE CLAUSULA CONTRATUAL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - FIXAÇÃO EM 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO - NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. 1. As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. (artigo 54, § 4º, do CDC). 2. Evidente é a necessidade de tratamento com o medicamento "Zoladex" para a continuidade da quimioterapia a que está sendo submetida a segurada, conforme prescrição médica, sob pena de se restringir direito fundamental, inerente à natureza do contrato, capaz de ameaçar o objetivo das cláusulas de cobertura integral do tratamento quimioterápico. 3 Ressalte-se, ainda, que sendo a relação das partes de consumo (artigo 3º e parágrafos, do Código de Defesa do Consumidor), a interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita com fulcro nas disposições do CDC, especialmente daquelas que conferem proteção contratual ao consumidor, as quais, dentre outras regras, estabelecem a interpretação que lhe é mais favorável.
Assim, nos casos envolvendo contratos remunerados de prestação de serviços de seguro saúde, onde o segurado figura como 3 TJPR, Ac. 16384, 8ª CCv, Ap. Cível n. 419852-1, Relator Des. Carvílio da Silveira, julgado em 27/08/2009, DJPR 05/10/2009.
destinatário final, aplicável o Código de Defesa do Consumidor, especialmente o disposto no artigo 47:
"As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor". No caso, sendo o contrato de adesão, o qual não permite que a parte hipossuficiente possa alterar cláusulas de conteúdo abusivo para se proteger, o Código de Defesa do Consumidor permite seja reconhecida a nulidade destas, vez que a saúde é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal.
E, neste passo, quando existem dúvidas, as cláusulas do contrato de adesão devem ser interpretadas em favor do aderente.
Note-se que a cláusula 7.3.3, alínea "j", (fls. 68/69), que dispõe acerca da cobertura para os procedimentos considerados especiais, não especifica quais os medicamentos devem ser utilizados durante o tratamento quimioterápico.
Veja-se:
"7.3.3 Cobertura para os seguintes procedimentos considerados especiais cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada à nível de internação hospitalar: (...) j) Quimioterapia, radioterapia, incluindo radiomoldagem, radioimplantes e braquiterapia, mesmo quando realizados ambulatorialmente após a alta hospitalar,
como complemento de tratamento realizado em regime de hospitalização. Por outro lado, a cláusula 10.1.2 (fl. 72), que exclui da cobertura os tratamentos experimentais, trata-se de disposição abusiva, nos termos do art. 51, do Código de Defesa do Consumidor.
Confira-se:
"10.1 Serviços excluídos em todos os módulos 10.1.2 Tratamentos e cirurgias experimentais, exames e medicamentos ainda não reconhecidos pelo Serviço Nacional de Vigilância Sanitária (S.N.V.S.), cirurgias e tratamentos não éticos ou ilegais, cirurgias para mudança de sexo e inseminação artificial; Além disso, toda e qualquer cláusula excludente de responsabilidade fere o princípio da razoabilidade, porque torna o contrato excessivamente oneroso ao segurado.
Vejamos:
"Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor-pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;" Ademais, tratando-se de contrato de adesão, é
obrigatório que suas cláusulas sejam redigidas de forma a propiciar fácil compreensão de seu alcance pelo aderente.
No caso, a apelante baseou-se na cláusula 10.1.2, do contrato, a qual exclui a cobertura de "tratamento e cirurgias experimentais". Segundo alega a recorrente, o medicamento solicitado, cuja cobertura foi negada, implicaria em tratamento experimental.
Como se nota, a referida cláusula contratual estabelece, de forma genérica, a exclusão da cobertura de tratamentos e cirurgias experimentais, enquanto na cláusula 7.3.3, alínea "j", há previsão expressa para quimioterapia.
E, no caso, como se infere das provas dos autos (fls. 40/43), o médico responsável pelo tratamento da autora lhe recomendou o tratamento à base de ERBILUX, sob o fundamento de que o emprego de outros medicamentos não mostrou resultado eficaz, bem como para atenuar os efeitos da doença, tendo em vista que o referido medicamento vem obtendo resultados satisfatórios nos tratamentos contra câncer.
Assim, a interpretação dada pela seguradora à cláusula 10.1.2, do contrato, apresenta-se abusiva, colocando o consumidor em desvantagem exagerada.
Saliente-se, por fim, que a abusividade da cláusula consiste, exatamente, no impedimento do tratamento da paciente com o
método mais moderno do momento, em razão de cláusula limitativa.
Esclareça-se, ainda, que é o médico e não o plano de saúde, o responsável pela orientação terapêutica.
Desse modo, não havendo exclusão do câncer no contrato de saúde, não há como impedir a cobertura do seguro para o tratamento de quimioterapia à base do medicamento ERBITUX.
Conclui-se, desse modo, que a sentença não merece reparos, neste ponto, razão pela qual a requerida deve custear o número de ciclos quimioterápicos a base do medicamento ERBILUX -, necessários para a eficácia do tratamento médico da apelada.
RECURSO ADESIVO
Requereu a autora, em suas razões recursais, a condenação da requerida ao pagamento de danos morais, assim como da integralidade das custas processuais e honorários de sucumbência.
Incontestável a existência de dano moral a justificar a reparação, neste caso, porque a negativa de custeio de medicamento necessário ao tratamento de saúde da autora abalou, ainda mais, o seu estado de saúde, bem como seu estado emocional.
Além da preocupação constante, decorrente do seu estado de saúde precário, em vista de seu quadro clínico de neoplasia
maligna de cólon do reto e do fígado, a autora sofreu abalo psíquico, enquanto esperava a liberação do procedimento.
Portanto, ao negar à cobertura de tratamento quimioterápico, a base de ERBILUX, a requerida não só inadimpliu com suas obrigações contratuais, como também submeteu a autora a constrangimento e abalo psicológico desnecessário, que lhe causou profunda angústia.
Desta feita, inegável o dever de indenizar.
Corroboram este entendimento os seguintes julgados deste Tribunal de Justiça:
AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PLANO DE SAÚDE - HEMODIÁLISE - NEGATIVA DE COBERTURA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICABILIDADE - DESPESAS COM PROCEDIMENTO NÃO ELENCADO NO ROL DA RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº. 82 DA ANS, NEM NO ROL DOS PROCEDIMENTOS EXCLUÍDOS DA COBERTURA DOS PLANOS DE SAÚDE - COBERTURA DEVIDA - INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - PACIENTE COM MAIS DE OITENTA ANOS, NECESSITANDO COM URGÊNCIA DO PROCEDIMENTO, NEGADO PELA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM CORRETAMENTE FIXADO - RECURSO DESPROVIDO. (...) "Tratando-se de contrato de seguro-saúde sempre haverá a possibilidade de conseqüências danosas para o segurado, pois este, após a
contratação, costuma procurar o serviço já em evidente situação desfavorável de saúde, tanto a física como a psicológica. - Conforme precedentes da 3ª turma do STJ, a recusa indevida à cobertura pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a sua situação de aflição psicológica e de angústia no espírito. Recurso Especial conhecido e provido." (STJ - RESP 200400643034 - (657717 RJ) - 3ª T. - Relª Min. Nancy Andrighi - DJU 12.12.2005 - p. 00374)". 4
APELAÇÃO CONHECIDA E NÃO PROVIDA. APELAÇÃO CÍVEL (2) - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PLANO DE SAÚDE - RELAÇÃO DE CONSUMO - CONTRATO DE ADESÃO - INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - CLÁUSULA RESTRITIVA OBSCURA - NULIDADE - DEVOLUÇÃO DAS QUANTIAS DESEMBOLSADAS PELA AUTORA - DANOS MORAIS - OCORRÊNCIA - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS - SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA AUTORA - REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Os transtornos e aborrecimentos causados pela indevida negativa da cobertura do Plano de Saúde, justamente no momento em que a Recorrida encontrava-se numa situação de emergência médica, agravaram, sobremaneira, o abalo emocional da Segurada, restando inconteste a existência do dano moral a ser indenizado. 2. A indenização pelo dano moral deve corresponder ao binômio proporcionalidade e razoabilidade, a fim de se buscar o equilíbrio entre o dano e a reparação, levando-se em consideração as circunstâncias específicas do caso concreto. APELAÇÃO CONHECIDA E
4 TJPR, Ac. 14898, 10ª CCv, Ap. Cível n. 539965-1, Relator Des. Ronald Schulman, julgado em 05/02/2009, DJPR 28/04/2009.
PARCIALMENTE PROVIDA. 5
Igualmente vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"(...) Tendo a empresa-ré negado ilegalmente a cobertura das despesas médico-hospitalares, causando constrangimento e dor psicológica, consistente no receio em relação ao restabelecimento da saúde do filho, agravado pela demora no atendimento, e no temor quanto à impossibilidade de proporcionar o tratamento necessário a sua recuperação, deve-se reconhecer o direito do autor ao ressarcimento dos danos morais, os quais devem ser fixados de forma a compensar adequadamente o lesado, sem proporcionar enriquecimento sem causa. (...) 6 Desse modo, restam plenamente configurados os pressupostos necessários a condenação da requerida ao pagamento de indenização em favor da requerente, pela injusta recusa de cobertura de plano de saúde, pois tal fato agravou o sofrimento da segurada, que já se encontrava abalada física e psicologicamente.
Destarte, uma vez configurado o dever de indenizar, resta arbitrar o valor do quantum indenizatório, o qual não deve ultrapassar os limites do enriquecimento sem causa, devendo respeitar as forças econômicas daquele que deve de indenizar e o status daquele que 5 TJPR, Ac. 14531, 9ª CCv, Ap. Cível n. 524773-0, Relator Des. Rosana Amara Girardi Fachin, julgado em 12/02/2009, DJPR 11/05/2009. 6 STJ, REsp 285618/SP, 4ª Turma, Relator Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/12/2008, DJe 26/02/2009.
vai receber.
O valor da indenização, embora deva ser expressivo, não pode ser desvirtuado de seus reais objetivos, nem transformado em fonte de enriquecimento ilícito. Ou seja, a indenização deve servir, portanto, como forma de compensação pela perda irreparável e, por isto, tal verificação restringe-se aos limites do prejuízo sofrido.
Saliente-se, aqui, que a recorrente aguardou por aproximadamente 10 (dez) dias, desde a negativa da cobertura do tratamento (fl. 24) até a concessão parcial da liminar (fls. 37/38), o fornecimento do medicamento necessário ao tratamento quimioterápico. Além disso, a apelada é pessoa física de pequenas posses, enquanto a apelante é pessoa jurídica de grande porte, e tendo em vista os transtornos causados àquela, que suportou sofrimentos físicos e psicológicos desnecessário, enquanto se discutia a questão.
Valendo-me desses pressupostos e de outros julgados desta Corte, entendo como justa uma indenização equivalente a 21,05 SM (vinte e um vírgula zero cinco) salários mínimos atuais, ou seja, R$10.000,00 (dez mil reais).
No tocante aos juros de mora, segundo entendimento jurisprudencial dominante, consolidado pela Súmula 54 do STJ, os mesmos devem incidir a partir da ocorrência do evento danoso, cujo índice aplicado deve ser de 1% (um por cento) ao mês, a partir da entrada
em vigor do Novo Código Civil (Código Civil e legislação civil em vigor: Theotonio Negrão, José Roberto Ferreira Gouvêa. 26. ed. atual. até 16 de janeiro de 2007. São Paulo: Saraiva, 2007).
A correção monetária, por sua vez, deverá incidir a partir da data da sentença, nos termos da Súmula 362, do Superior Tribunal de Justiça ("A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento").
Por fim, em face do provimento do recurso de inverter a sucumbência.
Diante do exposto, VOTO por CONHECER os recursos, para NEGAR PROVIMENTO recurso da requerida Unimed Foz do Iguaçu Cooperativa de Trabalho Médico e DAR PROVIMENTO ao recurso adesivo da autora, nos termos do voto.
ACORDAM os Membros Integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por UNANIMIDADE de votos, em CONHECER os recursos, para NEGAR PROVIMENTO ao recurso da requerida Unimed Foz do Iguaçu Cooperativa de Trabalho Médico e DAR PROVIMENTO ao recurso adesivo da autora, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os excelentíssimos Senhores Desembargadores Rosana Amara Girardi Fachin (presidente com voto) e
José Augusto Gomes Aniceto.
Curitiba, 04 de março de 2010. Francisco Luiz Macedo Junior Relator
|